Eva entrou, fechou a porta e se aproximou. Era evidente que ele tentava
identificá-la, lembrar-se de quem se tratava.
- Você não se lembra de mim?
Lagerkvist a olhou da mesma maneira que se contempla uma obra de arte
moderna no domingo de manhã – com desconfiança, desapaixonadamente. Talvez
fosse só pela roupa de Eva. - Eu deveria?
- Fui sua aluna na faculdade de jornalismo, já faz uns anos.
- Tive tantos alunos... – respondeu, sem tirar os olhos dela.
- Eu costumava entrar atrasada – disse Eva, e esboçou um leve sorriso.
Nenhuma reação no rosto de Lagerkvist. Eva passou os olhos pelo quarto – mesa
para a TV; estante com alguns livros; criado-mudo com uma foto de mulher,
provavelmente a esposa, com quem Eva tinha falado ao telefone. - Por que você veio aqui? – disse Lagerkvist. – Estou quase morto. O que você
quer de mim?
Eva baixou os olhos. “É, errei em ter vindo”, pensou. O coitado merecia coisa
melhor do que ter de aguentá-la. - Sinto muito – ela disse.
- Você também vai morrer um dia. As pessoas se importam demais em querer
saber a hora da morte, se vai ser hoje, amanhã ou daqui a vinte anos. - Meu noivo foi assassinado, no Afeganistão – disse Eva, sem saber muito bem
por que tinha contado isso. - Era militar?
- Era – apressou-se em responder. – Foi uma mina que explodiu.
Lagerkvist balançou negativamente a cabeça. - Muito triste – ele disse. – E inútil.
- Eu não saberia dizer.
- Você não sabe o quê?