- Pois é – repetiu Rigmor, e olhou para Eva.
- Pois é o quê?
- Essa sua ideia do que aconteceu naquela noite é possível, mas nem por isso tem
que ser verdade.
Eva voltou à mesa, sentou-se e encarou a mulher que estava à sua frente. - Não. Mas você e a sua irmã vão me ajudar a tirar a teima.
A mulher tinha deixado Eva sozinha enquanto ia dar um telefonema. Talvez para
a irmã, na tentativa de restabelecer uma antiga prática palaciana, uma coisa que
tinham quase descoberto – não importando o que significasse esse “quase”. Que
um dos empregados de mais alto posto ficara sabendo que alguns serviçais
cobravam de amigos e conhecidos para lhes mostrar os aposentos reais que a família
não estava ocupando? Puseram fim à prática, mas não informaram isso à família
real. “Não aguentamos a verdade”, pensou Eva. É preferível mudar a prática e
demitir a direção, como no caso de Torben, e confiar que tudo acabará bem desde
que não falemos mais do assunto. E desde que os pais não tenham de viver com a
terrível verdade – que o filho pequeno esteve perambulando sozinho no meio do
mato, achando que tinha sido abandonado, que ninguém o queria, que ele não
tinha mais valor do que um papel que se joga no lixo, uma coisa que se pode
descartar e esquecer no instante seguinte.
O que a rainha pensaria se lhe contassem que pessoas completamente estranhas
tinham pagado para passear na casa dela à noite? Que a monarca era um bicho de
zoológico? Que no fundo o povo não tinha mais amor nem respeito por ela do que
por um urso-branco, um pelicano ou hipopótamo na jaula? A rainha também vivia
enjaulada, e as pessoas pagavam de muito bom grado para ficar olhando para ela. Se
pudessem, pagariam um pouco mais para ficar juntinho dela; para poder deitar a
seu lado na cama e vê-la dormir de boca aberta; para zanzar pelo quarto do marido,