Sabor Club - Edição 32 (2019-09)

(Antfer) #1

DAS CAÇADAS DE COGUMELOS chanterelles
com o pai nos bosques suíços às rodas de samba
cariocas na histórica Pedra do Sal – momentos de
alegria separados por três décadas, receitas de toda
sorte passaram por baixo das pontes construídas
mundo afora por Elia Schramm, antes que o chef
de 36 anos, nascido em Genebra, se tornasse um
jovem monarca no reino gastronômico de Ipanema.
Mas o trono podemos esquecer, porque a vida
atual é um caminhar intenso pelas ruas do bairro,
vestindo o dólmã despojado que mandou fazer em
corte de camisa social, e atento aos movimentos
da engrenagem que serve 50 mil clientes por mês
em sete restaurantes de culinárias distintas, sendo


quatro situados no espaço de três quarteirões
do bairro.
São três horas da tarde e lá vem ele pela rua
Redentor, virando a esquina da Garcia D’Ávila para
adentrar o salão do francês L’Atelier Mimolette, após
provar o ragu da Pici Trattoria, ajustar o bernaise
de iogurte no grego Oia, e conferir no Posì Mozza
& Mare o preparo do Carbonara di Polpo: a versão
da receita famosa feita com espaguete negro e polvo
grelhado tornou-se um dos pratos mais comentados
no inverno na cidade.
“Trabalhei em estrelados na Europa, realizei
no Laguiole o sonho da estrela Michelin, e topei
um desafio que reflete a minha história de muitas


raízes, meu estilo intuitivo, o prazer de receber
pessoas, proporcionar alegria. Cozinhar para mim
sempre foi sobre isso”, afirma Elia.
Perguntamos a razão da escolha da temática do
litoral italiano para o novo Posì, que tem varanda
‘positana’ coberta de limões sicilianos decorativos e
menu de mozzarellas frescas, localizado em frente
ao aclamado Gero, o italiano austero de Rogério
Fasano. A resposta vem com o senso de humor
carioca que lhe é peculiar:
“Piemonte é para quem é cult. Puglia, para
quem é roots. Sicilia, para quem é foda. Sardenha,
para quem é cascudo. A Costa Amalfitana é para
todo mundo. É o primeiro balneário de destino na

Itália. Trouxemos o verão europeu à Ipanema.”
O mapa da cidade de Elia, porém, se inverte na
hora da folga. E quem o encontra no Circo Voador,
na Lapa, curtindo um show da Nação Zumbi,
ou num bloco do Centro cheio de hematomas e
ataduras (fantasia de “Sistema Único de Saúde”),
não acredita que ali está um chef premiado. Vai
pensar que aquele cara gingando com estilo no
asfalto, no máximo, deve bater um açaí para comer
com banana de manhã.
“Vivo num ambiente de elite mas gosto
é de me misturar. Meu Rio é a Lapa, a Glória e
Santa Teresa, as rodas de samba, os blocos e a
democracia das ruas.”

A cozinha variada do irreverente Elia Schramm (na foto ao lado, com a mulher,
antes do bloco de Carnaval) é conceituada no clima cosmopolita dos restaurantes
de culinária estrangeira em Nova York. Nessa linha, ele pensa e faz comida para
as massas. Mas não abandonou a cozinha autoral que o colocou no mapa quando
pilotava as caçarolas do chique Laguiole, no Museu de Arte Moderna, no Rio. Em
uma única noite por mês, o chef promove um menu harmonizado em cada casa
que atua. É quando pode dar uma pirada. E servir, por exemplo, um creme de
inhame defumado com brócolis no missô, manteiga dourada e castanhas do Pará.

“Topei um desafio que reflete o meu estilo intuitivo, o prazer de receber pessoas,
proporcionar alegria. Cozinhar para mim sempre foi sobre isso”
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