Banco Central do Brasil
Revista Carta Capital/Nacional - Economia
sexta-feira, 27 de maio de 2022
Banco Central - Perfil 1 - Bank for International
Settlements
pessoas em insegurança alimentar severa, pouco
depois do anúncio de um plano do G-7 para enfrentar o
problema, expõe tanto os malefícios da globalização
quanto os extremos da condição paradoxal do Brasil,
terceiro maior produtor de alimentos do mundo e, ao
mesmo tempo, assombrado pela fome. Segundo a
ONU, os preços dos alimentos no mundo são os mais
caros em 61 anos, o total de famélicos subiu 500%
desde 2016 e o número de habitantes nessa situação
passou de 135 milhões, antes da pandemia, para 276
milhões.
Vários países estão à beira de uma crise gigante, caso
de Sri Lanka, Marrocos, Paquistão e Líbano, entre
outros, destacou em apresentação na Câmara dos
Deputados a economista Jayati Ghosh, professora da
Universidade de Massachusetts. O aumento do preço
de alguns alimentos em até 300% no Irã provocou
protestos em massa e incêndios de lojas.
Em nota técnica de janeiro, o Ipea chamou atenção
para o agravamento do estado de insegurança alimentar
no campo e na cidade. “Vista na perspectiva histórica,
com dados da Pnad e da Pesquisa de Orçamento
Familiar do IBGE, a trajetória da segurança alimentar no
País está em claro e preocupante retrocesso”, sublinhou
o Ipea. Hoje, há 84,8 milhões de brasileiros com algum
grau de insegurança alimentar, o equivalente a 36,7%
de todas as famílias. Cerca de 10,3 milhões de pessoas
no Brasil padecem de insegurança alimentar grave e
passam fome. A onda de frio intenso no País afetou
plantações, tende a exacerbar a inflação e agravar
ainda mais o problema de acesso a alimentos, alertam
especialistas. A inflação de alimentos oscilou em torno
de 12% nos últimos 12 meses.
O resultado devastador da combinação de economia
mundial instável, pandemia, problemas de transporte de
insumos e mercadorias, guerra na Ucrânia, inflação em
alta e crise climática concretiza a previsão dos
economistas Hervé Hannoun e Peter Dittus, ex-
executivos do Bank for International Settlements. Em
2018, eles disseram que a “bomba de tudo” - financeira,
militar, ecológica e social -, construída pelo G-7, estava
pronta para estourar. “Vamos admitir, os países do G-7
mostraram que não são líderes do mundo, são líderes
de países ricos e são líderes de países específicos que
buscam seus interesses nacionais e não estão
efetivamente preocupados em estabilizar ou enriquecer
o resto do mundo”, ressaltou Ghosh. Isso ficou evidente,
acrescentou, na questão da distribuição das vacinas e
de controle de direitos e propriedade intelectual.
As mudanças climáticas são uma das causas da crise
de suprimentos e de preços dos alimentos, detalhou a
revista The Economist na reportagem de capa intitulada
“A próxima catástrofe alimentar”. Na China, maior
produtora mundial de trigo, depois que as chuvas
atrasara m o plantio no ano passado, a safra pode ser a
pior de todos os tempos. Além das temperaturas
extremas na Índia, segunda maior exportadora, a falta
de chuva ameaça minar a produção de outros celeiros,
desde o cinturão de trigo dos Estados Unidos até a
região de Beauce, na França. O Chifre da África está
sendo devastado por sua pior seca em quatro décadas.
“A comoção com a guerra da Ucrânia atrai as atenções,
mas a situação da fome vinha se agravando há anos.
Com a Covid, piorou e em 2021 houve também um
aumento significativo do número de pessoas em
situação de fome e vulnerabilidade”, sublinha Walter
Belik, professor titular aposentado do Instituto de
Economia da Unicamp e diretor do Instituto Fome Zero.
Durante a pandemia, a ONU havia reconhecido que não
conseguiria atingir as metas do desenvolvimento
sustentável, inclusive o objetivo número 2, que
fala em erradicar a fome em 2030, uma ficção. “Agora,
com a guerra, houve um 2 z agravamento, é a
tempestade perfeita.”
Os abalos acentuados pela guerra mostram “o fracasso
da globalização, da ideia 5 § de que seria possível,
perfeitamente, através do mundo sem barreiras,
alimentar as populações e resolver todas as mazelas