Nossa força para lutar
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Jornal Folha de S. Paulo/Nacional - Opinião
sábado, 28 de maio de 2022
Cenário Político-Econômico - Colunistas
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Autor: Txai Suruí
Diante de tantas pressões, ataques e invasões aos
territórios indígenas, uma das perguntas mais
frequentes que me fazem é: Como continuar lutando
diante de tudo isso?
Não que a luta seja uma escolha. Estamos falando de
uma realidade diária de vida ou morte. Falamos das
nossas casas, famílias e identidades.
Na lógica desenvolvimentista capitalista, racista e
destrutiva que olha para nossas florestas e vê apenas
cifrões, quem mais sofre são os povos da floresta já
citados aqui, principalmente mulheres e crianças.
São os povos indígenas considerados os guardiões da
floresta. São as crianças desnutridas e envenenadas
pelo mercúrio. São as nossas famílias com fome,
porque os peixes desapareceram devido às
hidrelétricas. É o alimento contaminado pelos
agrotóxicos que no futuro nos causarão câncer.
Mas de onde vem a força para continuar? Dos espíritos
da floresta e dos rios, das árvores que consideramos
sagradas, do sopro dos ventos, dos animais, da força
das nossas mulheres, do entusiasmo dos nossos
jovens, da sabedoria dos nossos sábios, da nossa
ancestralidade, das nossas culturas e das nossas
espiritualidades.
Os povos da floresta são a esperança para um futuro
possível, com soluções sustentáveis e a possibilidade
de se viver em harmonia com a natureza. Cito um
trecho do livro "Teias de Luta: Narrativas Feministas em
Resistência aos Megaprojetos", de realização do
Instituto Pacs:
"Se a maldade e a injustiça adoecem, a luta é
perspectiva. É o oxigênio em meio ao pó e à fumaça, é
o silêncio de antes das máquinas, é fincar os pés no
chão, às margens do rio, pôr as mãos nas águas e se
conectar com a natureza. É enxergar esperança entre
as árvores e sentir a liberdade da floresta. É criar arte
através das vozes, sons, corpos, formas e sonhos que
se recusam a ser destruídos. É não aceitar ser só mais
uma estatística. É afirmar e preservar a identidade
enquanto ser e território, saber de onde veio e tirar de lá
a sabedoria para construir os caminhos que ainda estão
por vir".
Lutamos para que nossas crianças possam crescer
livres e saudáveis. É pela sobrevivência das nossas
florestas e das nossas tradições. É um grito para ecoar
as vozes historicamente caladas de mulheres, povos
originários, quilombolas, movimento negro, ribeirinhos,
extrativistas e todos os povos da floresta.
É para contar a verdadeira história, até hoje negada, de
um país que não foi descoberto, mas invadido,
massacrado e que até hoje coloca em curso um projeto
de genocídio.
Se pararmos de lutar, as invasões não vão parar, os
garimpeiros não irão se retirar, não irão parar de nos
matar. É uma luta pela vida. Uma luta global pela vida
dos povos tradicionais e de todo o planeta.