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(Antfer) #1
Banco Central do Brasil

Revista Exame/Nacional - Brasil
terça-feira, 24 de maio de 2022
Banco Central - Perfil 1 - Reforma trabalhista

Foi em São Bernardo que um metalúrgico de carisma
instigante e credibilidade nas ruas conferida por um
dedo mindinho truncado em um acidente na linha de
montagem foi eleito presidente do sindicato em 1975.
As greves lideradas por Lula estabeleceram um modelo
de direitos trabalhistas para a América do Sul e tiveram
o efeito secundário de espalhar as empresas para
outros estados que não tinham seu Lula com um
megafone.


Sanches passou seis anos na fábrica da Ford antes de
ser chamado à sede uma tarde e informado de que a
empresa estava saindo de São Bernardo. Ele passou
um ano deprimido e desempregado antes de conseguir
um cobiçado emprego nas instalações da Mercedes-
Benz nas proximidades. Sanches trabalha no turno da
noite, mas diz não ter motivo para reclamar: “Estou feliz
com meu trabalho, mas essa questão da
desindustrialização está me fazendo pensar que preciso
de um plano B para ter outra fonte de renda”.


Se o Brasil é de fato vítima da desindustrialização
prematura ainda é algo discutível. Há quem argumente
que a retração na manufatura é em grande parte o
efeito colateral de uma valorização da moeda brasileira
que desfavoreceu as exportações, e que a tendência
vem se invertendo nos últimos anos. Özlem Ömer,
pesquisadora da Iniciativa de Governança Econômica
Global da Universidade de Boston, que tem estudado a
economia brasileira, é menos otimista. Os economistas
têm observado que, à medida que as economias
amadurecem, os recursos mudam de setores
“estagnados”, caracterizados por salários baixos e
crescimento fraco da produtividade, para setores
“dinâmicos”, em que os salários e a produtividade são
mais altos. A pesquisa de Ömer, que abrange os anos
de 2000 a 2014, mostra que, no Brasil, a manufatura,
que costuma ser rotulada como dinâmica, exibiu traços
de estagnação: o crescimento da produtividade se
estabilizou e sua participação na produção econômica
diminuiu. “Isso levanta uma bandeira vermelha”, diz ela,
profetizando um futuro de “baixo crescimento do PIB e


provavelmente de maior desigualdade”.

Embora o prefeito de São Bernardo, Orlando Morando,
tenha chamado a saída da Ford de “covarde”, hoje ele a
vê apenas como parte da transição da cidade para o
futuro. “Estamos na fase de serviços”, diz ele, e
argumenta que as indústrias saíram porque “a
sindicalização radical afastou o investimento”. O setor
automobilístico da cidade está “se modernizando e se
preparando para o 4.0.” — o próximo capítulo da
Revolução Industrial, no qual a robótica e outras
tecnologias de ponta têm um papel central. “Estamos
tão preparados para essa fase que hoje em dia a linha
de produção é toda composta de engenheiros”, diz
Morando. “Sem dúvida a história de São Bernardo é em
parte a história da Ford, mas a página foi virada.”

O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, adotou um tom
desafiador em 2019, quando a Ford anunciou que
estava deixando São Bernardo, dizendo que a
multinacional estava buscando doações do governo em
troca de permanecer no local. “A Ford precisa dizer a
verdade: eles querem subsídios”, afirmou ele a
repórteres. “Vocês todos querem continuar dando 20
bilhões de reais para eles, como eles fizeram nos anos
anteriores? É o seu dinheiro, são os seus impostos.”

Lula não resistiu à tentação de insultar o presidente do
Brasil nas redes sociais quando, em janeiro do ano
passado, a montadora anunciou que estava colocando à
venda suas três fábricas brasileiras restantes. “Ford
anuncia investimento de 4 bilhões de reais no Brasil.
Notícia boa, mas de outra década”, tuitou Lula,
postando link para um artigo de jornal de 2009.

Quando liderou o Sindicato dos Metalúrgicos, Lula
pressionou com sucesso o governo federal por reajustes
salariais que acompanhassem a inflação — o que ele
promete fazer novamente se eleito. A taxa de inflação
anual do Brasil atingiu os dois dígitos no ano passado,
pela primeira vez desde 2016. Com os custos dos
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