Mas e o Brasil? Somos um povo solitário ou
sociável? Levantamento da Universidade de
Chicago, nos Estados Unidos, revela que lide-
ramos o ranking dos países em que as pessoas
menos vivem sozinhas. Bom, né? Nem tanto.
A Sociedade Brasileira de Geriatria e Geron-
tologia perguntou a 2 mil pessoas acima dos
55 anos qual o pior medo que sentiam. Três
em cada dez não tiveram dúvidas em respon-
der que é “acabar sozinho”. O receio de não
conseguir enxergar ou se locomover ficou em
segundo lugar, e o de ter uma doença grave
em terceiro. “Por definição, solidão corres-
ponde à diferença entre o que você espera de
um relacionamento e o que ele tem a ofere-
cer. Por esse motivo, muitos relatam se sentir
solitários mesmo vivendo em uma casa cheia
de gente”, explica a neurocientista Stephanie
Cacioppo, da Universidade de Chicago.
Por essas e outras, será que a criação de
um Ministério da Solidão, parecido com
aquele do Reino Unido, teria serventia por
aqui? Na opinião da psicóloga Cecília Car-
mona, da Universidade Federal do Triângulo
Mineiro, sim. Autora do estudo A Experiência
de Solidão e a Rede de Apoio Social de Idosos,
ela acredita que uma pasta ou uma estrutura
para tratar exclusivamente do assunto seria
essencial à implantação de políticas públicas
eficientes. “Estar só e sentir solidão são coisas
diferentes. Estar só remete à ideia de prazer,
relaxamento e satisfação. Já solidão é sinôni-
mo de abandono, tristeza e desamparo. Sem
oenfrentamento necessário, a solidão pode
evoluir para a depressão e, em casos mais se-
veros, levar ao suicídio”, alerta Cecília.
Darwin também explica
Em 1967, quando compôs os versos de Wave,
Tom Jobim (1927-1994) postulou: “É impos-
sível ser feliz sozinho!” O psicólogo John T.
Cacioppo, também de Chicago, vai além: “É
impossível sobreviver sozinho”. Se você está
lendo SAÚDE, é porque nossos ancestrais —
lá atrás, ainda na era das cavernas — se senti-
ram sós. Sem vínculo social, a espécie huma-
na já teria desaparecido há muito tempo. “A
dor física protege o indivíduo dos perigos fí-
sicos. A dor social, também conhecida como
solidão, protegia o indivíduo de permanecer
isolado”, escreve Cacioppo em Solidão — A
Natureza Humana e a Necessidade de Vínculo
Social (Editora Record). “Os primeiros huma-
nos tinham mais chance de sobreviver quan-
do se mantinham juntos.”
Com a evolução da espécie, a solidão
tornou-se um fenômeno histórico. Con-
dição incompreendida e estigmatizada, é
vista com desconfiança por uns e utilizada
como punição por outros. “Na escola, as
crianças birrentas são mandadas para a bi-
blioteca. No casamento, uma praga comum
em momentos de ódio é: ‘Você vai morrer
sozinho!’ No sistema carcerário, o pior cas-
tigo que existe é a solitária”, dá exemplos
ohistoriador Leandro Karnal, que acaba de
lançar O Dilema do Porco Espinho — Como
Encarar a Solidão (Editora Planeta).
Do ponto de vista médico, solidão não
é doença. Mas possui sintomas — choro
frequente, perda de apetite, baixa autoesti-
ma... — e pode ser classificada como crônica
ou aguda. Todos nós, em algum momento,
estamos sujeitos a “picos de solidão”. Na
infância ou na adolescência, quando muda-
mos de cidade ou de escola. Na vida adulta,
quando perdemos o emprego ou os filhos
saem de casa. Na velhice, quando nos apo-
sentamos ou ficamos viúvos.
Existem evidências, aliás, de que, quanto
mais jovem é a pessoa, mais solitária ela se
sente. A geração americana de 18 a 22 anos
apresentou, em uma pesquisa da Universida-
de da Califórnia, o maior índice de solidão,
no comparativo com as turmas de 23 a 37
e de 52 a 71 anos. Em uma investigação in-
glesa, a faixa dos 16 aos 24 também compõe
a dos mais sozinhos. “Na maioria das vezes,
episódios de solidão, quando você muda
de bairro e precisa fazer novos amigos, por
exemplo, são inevitáveis e não trazem seque-
las. O problema é quando essa sensação per-
siste”, analisa a psicóloga Pamela Qualter, da
Universidade de Manchester, na Inglaterra.
50 • SAÚDE É VITAL • JANEIRO 2019