National Geographic - Portugal - Edição 225 (2019-12)

(Antfer) #1

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Não sabemos, ao certo, se esta mensagem mere-
ceu atenção suficiente por parte dos responsáveis
pelas políticas públicas. Em Outubro passado, o
IPCC apresentou um novo relatório sobre a mais
ambiciosa de duas metas de temperatura acorda-
das na conferência de Paris de 2015. O planeta já
aqueceu cerca de 1ºC desde o século XIX. Segundo
o relatório, um cenário com um aumento máximo
do aquecimento global em 1,5ºC em vez de 2ºC,
exporia menos 420 milhões de pessoas a vagas de
calor extremo frequentes e reduziria para metade
o número de plantas e animais que enfrentam a
ameaça da perda de habitat. Também poderia sal-
var uma área de solo permanentemente gelado de
cerca de dois milhões de quilómetros quadrados.
No entanto, para atingir a meta de 1,5ºC, segundo
o IPCC, o mundo teria de reduzir as emissões de
gases com efeito de estufa em 45% até 2030, eli-
miná-las completamente até 2050 e desenvolver
tecnologias capazes de retirar de novo da atmos-
fera enormes quantidades desses gases.
O desafio talvez seja ainda maior. O relatório so-
bre a meta de 1,5ºC foi o primeiro em que o IPCC
levou em consideração as emissões do solo per-
manentemente gelado, mas não incluía as emis-
sões causadas pelo degelo abrupto. Os modelos
climáticos ainda não são suficientemente sofisti-
cados para captar esse tipo de alteração rápida da
paisagem. A pedido da National Geographic, Ka-
tey Walter Anthony e Charles Koven, modelador
do Laboratório Nacional de Lawrence Berkeley,
fizeram cálculos que levam em consideração as
emissões causadas pelo degelo abrupto. Segundo
estimam, para travar o aumento da temperatura
em 1,5ºC, teríamos de eliminar por completo as
nossas próprias emissões de combustíveis fósseis
pelo menos 20% mais cedo – o mais tardar, em
2044, seis anos antes do agendado pelo IPCC. Isto
dá-nos apenas um quarto de século para transfor-
mar por completo o sistema da energia global.
“Estamos a enfrentar um futuro incerto, com
um conjunto incompleto de ferramentas” disse
Charles Koven. “A incerteza não é só nossa. Há
muitas variáveis incertas.” Existe mais do que
uma forma de criar novos lagos, por exemplo.


ALGUMAS SEMANAS DEPOIS de partir da Sibéria, eu
e Katie Orlinsky demos um passeio de jangada nos
Portões do Alasca do Parque Nacional do Árctico com
o ecologista Ken Tape. Um hidroavião deixou-nos, e
ao nosso guia fluvial Michael Wald, no lago Gaedeke.
Daí em diante, avançámos para sul pelo rio Alatna.
Dois quilómetros depois, encontrámos ramos


Fragmentos de solo
permanentemente
gelado desagregados
no rio Ninglick, junto do
mar de Bering, situam-se
agora a dezenas de
metros de algumas
casas. A aldeia vai mudar-
-se para novo local,
quase 15 quilómetros a
montante, tornando-se
pioneira de um processo
ao qual muitas aldeias
do Alasca poderão ter
de submeter-se.
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