National Geographic - Portugal - Edição 225 (2019-12)

(Antfer) #1
CRISE NA TUNDRA 99

Mesmo com cerca de cem animais, os prados do
parque mantêm-se substancialmente mais fres-
cos do que o solo em redor.
O fosso existente entre as ambições dos Zimov
e a realidade do parque é inquestionavelmente
grande. Numa visita durante a tarde, eu e Katie
caminhámos sobre pradarias molhadas até uma
secção pantanosa para ver os cavalos. À distân-
cia, um bisonte solitário escondeu-se. Nikita sen-
tou-nos num minitanque com oito rodas e levou-
-nos a passear, avançando sobre os salgueiros e
esmagando-os. Após uma subida íngreme, atra-
vessámos uma zona com alguns larícios finos.
É por isto que ele precisa de herbívoros gigantes,
disse Nikita: “De momento, não tenho animais
capazes de eliminar estas árvores.” O investiga-
dor passa muito tempo a angariar fundos para
manter o seu conceito a funcionar.
Alguns cientistas contestam as estimativas de
Serguei Zimov em relação ao número de animais
de grande porte que vagueava pela Sibéria no
Plistocénico ou insistem que a sua teoria de mu-
dança ecológica, passada e presente, é demasia-
do simplista. Acima de tudo, a maioria das críti-
cas parece nivelada pela audácia dos Zimov. Max
Holmes, de Woods Hole, que os conhece bem,
acha que existe uma centelha de genialidade no
seu trabalho. Os Zimov estão “no limite, mas é aí
que se costumam originar as grandes ideias e as
grandes mudanças”, disse.
Fora do Parque do Plistocénico, o mundo mo-
derno tem reagido com complacência ao aque-
cimento do Árctico. Há décadas que ignoramos
as provas das alterações climáticas e esperamos
que a situação não fique excessivamente má. Es-
tamos a contar com avanços tecnológicos que pa-
recem sempre além do nosso alcance. E fazemos
tudo isto apesar de os climatólogos dizerem que
todos os sinais apontam para a necessidade de
medidas urgentes e audazes.
Os Zimov são diferentes. Passaram a vida in-
teira a combater uma paisagem inclemente que
recompensa a obstinação. A tentativa de salvar
o permafrost restaurando a estepe árctica será
assim tão mais louco, perguntam, do que espe-
rar que os seres humanos reformulem completa-
mente o sistema de energia mundial? Talvez pre-
cisemos mesmo de uma loucura.
“A luta contra as alterações climáticas tem de
ser travada de diferentes formas e em várias fren-
tes”, disse Nikita. Só com uma combinação de
respostas é que o futuro poderá não ser “comple-
tamente miserável”. j

Um urso-polar
inspecciona um
automóvel junto de
Kaktovik, no Alasca.
A fusão do gelo marinho
está a empurrar mais
ursos para terra em busca
de alimento da mesma
forma que o degelo e a
inundação das grutas de
gelo está a obrigar os
habitantes do Alasca a
guardarem o seu peixe e
carne no exterior.

Free download pdf