28 • Público • Sexta-feira, 1 de Novembro de 2019
ECONOMIA
Lagarde
A economia a
abrandar, o mundo
à beira de uma
guerra cambial
e um BCE mais
dividido do que
nunca. A tarefa de
Christine Lagarde
à frente do BCE
adivinha-se difícil
C
omo se não bastasse o
fardo de substituir um
presidente aclamado
pela maioria como o
salvador do euro,
Christine Lagarde
enfrenta ainda uma
conjuntura cheia de
armadilhas: economia
em abrandamento,
inÇação sem sinais de recuperação,
instrumentos de política monetária
já muito gastos, ambiente de guerra
cambial no mundo e divisões ao
rubro dentro do conselho de gover-
nadores do BCE.
A ex-directora-geral do Fundo
Monetário Internacional vai ter de
recorrer a toda a sua experiência de
deÆnição da política económica e de
negociação política para conduzir o
Banco Central Europeu durante os
próximos oito anos.
Mario Draghi, na sua última confe-
rência de imprensa como presidente
do BCE, garantiu que não deu, nem
dará, qualquer conselho à sua subs-
tituta, dizendo que Christine Lagarde
“não precisa de conselhos, ela sabe
melhor do que ninguém o que fazer
e dizer”. No entanto, mesmo não
fazendo uma recomendação explíci-
ta, o ainda presidente não resistiu a
deixar claro aquilo que acha ser a
principal característica que um pre-
sidente do BCE deve ter. Quando
questionado sobre aquilo de que mais
se orgulhava em seis anos de lideran-
ça, Draghi aÆrmou que foi o facto de
nunca ter desistido de prosseguir o
mandato do BCE.
Fazer subir a inflação
O BCE, ao contrário de outros bancos
centrais, tem um mandato único:
manter a estabilidade de preços na
zona euro. Isto é, neste momento,
colocar a inÇação “abaixo, mas próxi-
mo de 2%”. No passado, o mais fre-
quente era o banco central preocupar-
se em evitar que a inÇação se tornasse
demasiado alta. Mas, nos últimos
anos, o problema a enfrentar é o
inverso: uma inÇação demasiado bai-
xa, que mantém a economia em risco
de cair na armadilha da deÇação.
Será isso que Christine Lagarde
terá de fazer. A inÇação na zona euro
foi, em Setembro, de 0,8%, conti-
nuando a cair e a afastar-se cada vez
mais do objectivo de uma inÇação
“abaixo mas próximo de 2%”. Além
disso, com a economia dar sinais de
abrandamento — que incluem uma
zero e a de depósitos em terreno
negativo) e injectou grandes quanti-
dades de liquidez na economia atra-
vés do programa de compras de títu-
los de dívida pública, que teve agora
de reatar perante o abrandamento da
economia e o recuo da inÇação. Tudo
isto, no entanto, não foi suÆciente
para que a inÇação subisse para o
nível desejado pelo BCE.
Agora, para Christine Lagarde, não
será fácil fazer aquilo que Draghi não
conseguiu concluir. Ã nova presiden-
te, tudo indica, deverá seguir a mes-
ma linha de política monetária do seu
antecessor, o que signiÆca que deve-
rá manter, durante um período longo
de tempo, as taxas de juro nos actuais
mínimos e o programa de compra de
dívida activo.
O risco dessa opção é, a dado
momento, Æcar sem munições para
gastar na luta contra a inÇação dema-
siado baixa. Por um lado, os efeitos
negativos das taxas de juro no sistema
bancário podem acentuar-se e, por
outro, o BCE arrisca-se a enfrentar, a
prazo, uma escassez de títulos de
dívida para comprar nos mercados.
Convencer a gastar
Uma ajuda preciosa para Lagarde
na sua luta contra o abrandamento
Sérgio Aníbal
[Christine Lagarde]
não precisa
de conselhos,
ela sabe melhor
do que ninguém
o que fazer e dizer
Mario Draghi
Presidente cessante do BCE
provável entrada em recessão técnica
da Alemanha durante o terceiro tri-
mestre deste ano — a pressão ao nível
dos preços pode continuar a ser des-
cendente.
Para os bancos centrais, contrariar
uma inÇação demasiado baixa tem-se
revelado, ao longo da história, mais
difícil do que contrariar uma inÇação
demasiado alta. E os últimos anos no
BCE, com Mario Draghi ao leme, são
prova disso. O banco central colocou
as suas taxas de juro a níveis mínimos
históricos (a de reÆnanciamento a
da economia e a deÇação
poderia vir dos Governos da
zona euro. Nos últimos meses
do seu mandato, Mario Draghi
colocou no centro dos seus
discursos o apelo a que a polí-
tica orçamental passasse a
ajudar mais a política mone-
tária. O banco central foi o
único a contribuir para o
crescimento económico nos
últimos anos, disse Draghi,
e agora é tempo de os Esta-
dos gastarem e investirem
mais, caso tenham espaço
de manobra orçamental
para isso.
É uma mensagem dirigida
sobretudo à Alemanha, que
apesar de ter a dívida já
abaixo de 60% do PIB e
enfrentar um forte abranda-
mento (e mesmo contracção) na
sua economia, continua Æel à sua
regra de déÆce zero, não dando o
impulso expansionista que as eco-
nomias alemã e europeia preci-
sam.
Christine Lagarde, que antes de
liderar o FMI foi ministra das
Finanças em França e que na
liderança do fundo fez o mesmo
tipo de apelos aos Governos
europeus, deverá manter ou
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cheio de riscos