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opinião
A2 Sábado,19dEoutubrodE
UMJORNALASERVIÇO DO BRASIL
a
Publicado desde 1921–Propriedade da EmpresaFolha da Manhã S.A.
PresidenteLuizFrias
diretorderedaçãoSérgio Dávila
suPerintendentesAntonio ManuelTeixeiraMendeseJudith Brito
Conselho editorialRogério CezardeCerqueiraLeite,
Marcelo Coelho,Ana Estela de SousaPinto, Cláudia Collucci,
Hélio Schwartsman, Heloísa Helvécia, MônicaBergamo,
Patrícia Campos Mello,Suzana Singer,Vinicius Mota,
AntonioManuelTeixeiraMendes, LuizFriaseSérgio Dávila(secretário)
diretoria-exeCutivaMarcelo Benez(comercial),Marcelo Machado
Gonçalves(financeiro)eEduardo Alcaro(planejamentoenovos negócios)
[email protected]
editoriais
Aimplosão
Mundo a 3 %
Oaprofundamentodadisputatra-
vada porJairBolsonaro(PSL) com
ogrupoquecontrola seu partido
políticoofereceuao paísum es-
petáculo grotesconestasemana.
Noprimeiroato,opresidente
tentou desalojar um desafetoda
liderançadabancada na Câmara,
substituindo-o pelofilho Eduardo
Bolsonaro(SP)—omesmoqueaté
outrodia queriafazerembaixador.
OchefedoExecutivose empe-
nhou pessoalmenteembuscade
votos, telefonandopara fazerape-
losacorreligionárioseameaçar
infiéis.Amanobrafracassou,eo
deputadoDelegadoWaldir (GO)
se mantevenocargocomoapoio
demaisdametadedabancada.
Oparlamentar se disse traído pe-
lo presidenteechegouachamá-
lo devagabundonumareunião,
que um aliado do Planaltogravou
escondido.Asduasfacções rivais
passaram entãoatrocarofensas
em públicoeiniciaramretaliações.
BolsonarodestituiuJoiceHas-
selmann(SP)do posto delíder do
governo no Congresso,rompendo
comaaliada de primeirahoraetro-
cando-a por um senadordoMDB.
Nestasexta ( 18 ),aala liderada
pelo deputado Luciano Bivar (PE)
ampliou seucontrolesobreodi-
retório nacional doPSLetomou
medidascontraosbolsonaristas.
Acúpula do partido suspendeu
dasatividadespartidárias cinco
deputados alinhadoscomopre-
sidenteeafastou os filhos deBol-
sonarodocomando dos diretóri-
os estaduais que elescontrolavam.
Em meioàpoeira levantadape-
la refrega,asemanaterminou sem
sinaisconvincentes de pacificação
dasrivalidades internas.Osdanos
sofridos pelopresidente, no entan-
to,parecemevidentes.
Hátambém os riscos queBol-
sonarocorre aomergulharnuma
disputaquecolocou em jogooqui-
nhão doPSLnos fundos públicos
disponíveis paraofinanciamento
da próximacampanha eleitoral.
Ao trocarfarpascomofilho do
presidentenestasexta,JoiceHas-
selmann chegouainsinuar que
desviosocorridos no passado po-
derão viràtonaagora.
Semcontrole deum partidoca-
paz de organizar uma base de apoio
confiávelparasuas iniciativas no
Congresso,Bolsonaro torna-seca-
davezmais dependentedesiglas
tradicionaiscomooDEM, queho-
je comandaaCâmaraeoSenado.
Mesmocomespaçoreduzido
na máquina dogovernoetrata-
dascomdesprezopelo presidente
desdeacampanhaeleitoral, essas
legendasforamresponsáveis pelo
principalêxitoalcançado pelogo-
vernoatéagorano Legislativo —o
avançodareforma daPrevidência.
Comopresidentealijado do po-
der dentrodoprópriopartido,as
siglas que dão ascartas noParla-
mentotendemacobrarmais ca-
ro na próximavez em queoPalá-
ci odoPlanaltoprecisar de apoio.
Comotemsidorecorrente,oFun-
doMonetárioInternacionalrevi-
sou parabaixosuas projeções para
ocrescimentoeconômico mundi-
al.Para esteano,anovaestimati-
va édealtadeapenas 3 %,amenor
desdeacrisefinanceira de 2009.
Nãosetrata de inclinaçãoreces-
siva, umavezquetalritmo seen-
contraapenas um poucoabaixo
do queoFMIconsidera seropo-
tencialdoProduto Interno Bruto
global.Oproblemaéqueafraque-
zatornaaconjunturamais sujei-
ta achoques, inclusivepolíticos.
Um riscoconsiderável estáno
acirramentodosconfrontosco-
merciaisentreEstados Unidos e
China, que jácausa algum impac-
to na dinâmica do investimentoe
das trocas demercadorias.
Nesteano,por exemplo,asgran-
des surpresas negativas seconcen-
tram naatividade industrialenos
volumes de transações comerciais,
próximos da estagnação.
Afragilidade ficamaisevidente
quandoseobservaqueadesace-
leraçãoésincronizada—todas as
principaisregiões mostramperda
de dinamismo. Comainflação bai-
xa, as autoridades járeagem por
meiodeafrouxamentomonetário.
Quasetodos osbancoscentrais
maisimportantesvêmcortando
juros, de modoapreservarocres-
cimento. NaEuropa,ocustododi-
nheirodesceu ainda maisaoterri-
tório negativo. Mesmo nos EUA,
que ainda ostentamamenortaxa
de desempregoem 50 anos,asta-
xastêmcaído,emtendência opos-
ta àobservada no ano passado.
Preocupa que autoridades mo-
netáriastenham de usar seu já es-
vaziadoarsenal paracontrolar os
danos da agenda destrutivadeDo-
naldTrump.Quandoapróxima cri-
se vier,poderão estar sem munição.
Daíoclamor crescenteparaque
apoliticafiscal —naforma de mai-
oresgastos públicos oucortes de
impostos—tenha um papel mai-
or,aomenos nos países comosor-
çamentosemordem,caso da Ale-
manhaedealguns países asiáticos.
Por ora,contudo,nãoéimprová-
velacontinuidade do ciclo deex-
pansão,ainda que medíocre.Ali-
quidez mundialcontinua ampla e
não há sinais que sugiram uma no-
va crisefinanceira iminente.
Sem novarecessão global,oce-
nárioatual não se mostranegati-
voparaoBrasil, que pode prosse-
guir na trajetória de leveretoma-
daeconômica. Os jurosinterna-
cionaisbaixosfavorecempolítica
similaraqui.Tudo issocompraal-
gumtempo paraqueopaísprossi-
ga na agenda dereformas.Orisco,
como sempre, éode acomodação.
ação desastrada de bolsonaroacirrarivalidade no
PSLefomentanovos riscos paraseu governo
SãoPauloOirrefreáveldesejo de de-
terminarcomoos outros devemvi-
versuasvidas setornouonovo“mal
du siècle”.Éuma pragaque afetaa
todos,dosreligiosos que querem
baniropecado,ànovadireita,que
empastela exposições de arte, pas-
sando pela esquerda, em especial
umamodalidadeautoritáriadefe-
minismo que adorasuprimiraau-
tonomiadas mulheres.
Esse grupoconseguiucomque o
Congresso aprovasseumprojeto de
lei que obrigatodos os serviços de
saúde do paísacomunicaràpolícia,
num prazode 24 horas,toda suspei-
ta de violênciacontraamulher, inde-
pendentementedavontadedavíti-
ma.Anotificação jáéhojecompul-
sória, masdeforma anônimaeem
princípiosóparaasautoridades sa-
nitárias, que nãotêmopoder de ini-
ciar investigações criminais.
Amudançapropostameparece
desastrosa, sobváriosângulos. É
claroqueopoder públicoprecisa
combateraviolênciacontraamu-
lher,mas sematropelar sua auto-
nomia. Seédadoaumhomem de-
cidir se denuncia ounãouma agres-
são quetenha sofrido,nãovejo por
queamulher não deva teridêntica
prerrogativadeescolha.
Igualmentegrave,anorma erode
osigilo darelação médico-paciente,
um princípio milenar fundamental
não apenas paraqueexista confian-
ça entreasduaspartesmas também
paraque pessoas quetenham sofri-
doalgum agravoàsaúdenocurso
deatividades ilícitas não deixem de
procurar socorro.
Háatéumsutilveneno filosófico
na novaregra, já que elacaminha
nacontramão dorespeitoàpriva-
cidade.Eodireitoàprivacidade, é
bomrefrescaramemória defemi-
nistas,foiabasedoargumentoju-
rídicoque, nos EUA,serviuparaa
legalizaçãodoaborto. Étambém o
direitoquepoderásustentaruma
eventual descriminalizaçãodouso
de drogas, em ação que estásob aná-
lisedo Supremo.
Jair Bolsonarovetouoprojetode
lei.Nãocreio que eletenha muita
ideiado quefez,mas agradeço.
[email protected]
BRaSÍlIaEm suaversão original, a
reforma daPrevidênciaformulada
pelaequipeeconômicadeJair Bol-
sonaronão tinhaocondãodezerar
odéficitdosetor,mesmocomapo-
tência fiscal estimadadeR$ 1 , 2 tri-
lhão em um período de dez anos. O
propósitoeraconteravelocidade
do aumentodas despesaseelevar
as receitas previdenciárias.
Pois bem.Já erabolacantada que
oCongresso desidratariaapropos-
ta.Napróxima semana,oSenado
(espera-se!) deveráconcluiravo-
taçãodas mudanças no sistema de
aposentadoriasepensões. Sem a
chamada PECparalela —um puxa-
dinho criado pelos senadores,que
terá tramitação arrastada—,otex-
to final deverá assegurar umaeco-
nomia de aproximadamenteR$ 800
bilhões emumadécada.
OTribunaldeContas da Uniãoes-
quadrinhou os dadoseconcluiu que,
entre 2020 e 2029 ,essareformaco-
brirámenos de 20 %doburacocal-
culado paraosregimes previdenciá-
rios. Pelas projeções, seriam neces-
sários R$ 5 trilhões paraequilibrar
os sistemas no período.Uma sinop-
se sobreanecessidade futura,eaté
premente, de nova revisãoderegras.
Noplano fiscal,oresultado pode-
riatersido pior.Abase legislativavo-
látileafaltadearticulação política
doPalácio doPlanaltoforamcom-
pensadaspelo parlamentarismo
brancoinstalado no país.Rodrigo
Maia, chamado de primeiro-minis-
troemcírculos brasilienses, afirma
quemuitos setoresforam“patrióti-
cos” no debate sobreasaposenta-
dorias poisnão eramatingidos pe-
las mudanças.
Onome do jogoseráoutrodiante
da agendaeconômicaque seráen-
viada pelo Executivoao Congresso
comaliquidação dafatura previden-
ciária.Temas polêmicosemenos pa-
latáveis, como normasfiscais, pac-
to federativoereformasadministra-
tivaetributária, mobilizarão políti-
cos, especialistasesetor produtivo.
Em meioàimplosão doPSL, Bol-
sonaroassistiráaoreposicionamen-
to nocampo adversário de aliados
queforamimportantesnaaprovação
da nova Previdência. Nãoseráfácil.
RIodeJaneIRoUmadas obras-primas
do escritor HenryJames éanovela
“A Fera na Selva”.Mas quem esteve
paravaler na selvafoi oirmãodele,
WilliamJames,que aos 23 anos vi-
sitouaAmazôniaeficouencantado
comaregião. Em 1865 ,ele percor-
reuoBrasil como membrodaexpe-
diçãoThayere,emcartas paraafa-
mília, discordou frontalmentedeseu
professorracista eescravista, Louis
Agassiz,revelando enorme simpatia
pelos povosdoAltoSolimões:
“Os índios que viatéagorasão óti-
maspessoas, deuma lindacor acas-
tanhada,comcabelos lindosefinos.
Suas peles são secaselimpas,eles
transpiram muitopouco. Nofim das
contas, acreditoque eles sãomais
bem-apessoados que os negroseos
brancos”,escreveuofuturofilósofo.
Adão no Éden, ele chegouaflertar
comuma nativa:“A h, Jesuína,Jesuí-
na, minharainhadafloresta, minha
flordotrópico, por que não pudefa-
zer- meavós inteligível?”.
Lembrei de WilliamJamesaosa-
ber queaAmazônia estádesban-
candooRio,asCataratasdoIguaçu
easpraias doNordeste(estas agora
tomadas por manchas de óleo) co-
mo destinopreferidodos estrangei-
ros. Um tipo de visitanteinteressado
na “porradaárvore”(copyrightJair
Messias)eque viaja estimulado pe-
lo slogan“venha, antes que acabe”.
Nomais, as notícias do setor não
são boas.Éoque umareportagem
darevistaPiauí classificade“efeito
Bolsonaro”(comose abagunçain-
terna não bastasse). Osturistas, so-
bretudoestudanteseuropeus, estão
fugindo do país,incomodadoscoma
não preservaçãodomeio ambiente.
Comtantosetão prestimosos
embaixadores doturismo—ocan-
torAmadoBatista,opintorRome-
ro Britto,olutador de jiu-jitsuRen-
zoGracie(quechamou Emmanu-
el Macron,opresidente francês, de
“franga”), oapresentador Ratinho
eoex-craqueRonaldinho Gaúcho
(queteveopassaporteapreendido
por crime ambiental)—,além de um
ministrosubmergido no laranjal,co-
mo issofoiacontecer?
Omal do século
Não seráfácil
Antes que acabe
- Hélio Schwartsman
Julianna Sofia
AlvaroCostaeSilva
Por anos,oBrasilconviveu
comafalsainformaçãodeque
aOMS preconizava como parâ-
metroideal deatençãoàsaú-
dearelaçãodeummédicopa-
ra mil habitantes.
Nãosesabeaorigem des-
se número, disseminado por
quem dele se beneficiava,que
produziuenormes danos à
saúdenopaís.
Évozcorrente mundo afora
queoSUS brasileiroéumacon-
quistacivilizatória.Apósoregi-
me militar,que nos legou indi-
cadores sofríveis, os progressis-
tasinscreveram na nossaCar-
ta de 1988 oprincípio da uni-
versalidade do direitoàsaúde.
Delá paracá, semquetenha
havidoincrementosubstancial
do investimentoemsaúdeco-
mo proporçãodoPIB, os indi-
cadores da área passaram por
evolução surpreendente, so-
bretudo quantoàexpectativa
de vidaemortalidade infantil
ematerna.
Um segundo marcoimpor-
tantefoi aconsolidação da Es-
tratégiaSaúde daFamília.Não
há dúvidadeque ofoconaaten-
çãobásicaéumdos responsá-
veis pelosresultadospositivos.
Aampliaçãodoacessoàaten-
çãobásicapode ser medida
pelaexpansão doatendimen-
to dasequipes de saúdedafa-
mília que, em 1998 ,chegavaa
4 , 4 %dapopulaçãoedez anos
depoisatingiu 70 %.
Aterceirarevolução, inques-
tionavelmente,foioprograma
Mais Médicos,omaisextraor-
dinário legado social dagestão
Dilma. Dilma enfrentouamais
injustacampanhacorporati-
va contraainiciativacujas se-
quelas políticas sefazemsen-
tiratéhoje.
Nestemomentoem que o
Brasil abremão devantagens
comerciais de paísem desen-
volvimentoparapleitear uma
vaganaOCDE,convémlem-
brar que nosso paíscontacom
2 , 1 médicos por mil habitantes,
enquantoamédia dospaíses
da OCDEéde 3 , 4.
Seconsiderarmosadistri-
buiçãogeográfica,asituação
éainda pior.NorteeNordes-
te têmmenos da metade dos
médicos do Sudeste, propor-
cionalmente.
OMais Médicospermitiule-
varassistência médicaamais
de 60 milhões de brasileiros
desassistidos, em parte, gra-
çasàvinda de médicos doex-
terior,especialmentecubanos,
que preencheram asvagasdis-
pensadas pelos médicos brasi-
leiros, que tinham prioridade.
Bolsonaro,sobopretextori-
dículo de queosmédicos cuba-
nos queriam implantaraguer-
rilha no Brasil, acaboucomo
programa, deixando os pobres
até hoje ao deus-dará.
Considerando-se ainda que
oscortes orçamentários po-
demfazeroinvestimentoem
saúde por habitantecair,não
espantaria observaruma iné-
ditareversão datendência
histórica.
Pelo perfil menoscaricato
do ministro, tem-se dado pou-
ca atenção aofato de quetam-
bémnasaúdeogovernopare-
ce mal sintonizadocomosde-
safiosdosetor.
Saúde
- Fernando Haddad
Professor universitário,ex-ministroda
Educação(governos Lula edilma)eex-
prefeito de São Paulo.Escreveaos sábados
Ale xandraMoraes
Cai projeção paraocrescimentodoPIb global, mas
cenário não chegaaser desfavorável paraobrasil