tinham sido tão impregnadas pelo vento húmido que soprava vindo do
Atlântico, que se conseguia sentir o cheiro pungente da parede bastando para
isso estender a língua. Mas também porque é que alguém faria uma coisa
dessas, perguntava-se Fred. A casa era bastante boa. Três quartos, dois
colchões, um frigorífico e um fogão. Mais um sofá e um tampo em cima de
dois blocos de cimento na divisão a que eles chamavam sala de estar, já que
tinha um buraco quase quadrado na parede que para eles era uma janela.
Verdade que podiam limpá-la com maior frequência – a cozinha estava
infestada de formigas vermelhas capazes de ferroadas terríveis –, mas, desde
que tinham mudado o frigorífico para a sala de estar, Fred raramente ia à
cozinha. Estava deitado no sofá a planear o que iria fazer a seguir quando
Roger entrou.
– Onde é que estiveste? – perguntou Fred.
– Fui à farmácia de Porto Seguro – disse Roger, com um sorriso que lhe deu
a volta à cabeça grande e manchada. – Nem imaginas o que vendem aqui sem
receita médica. Consegues coisas que na Noruega nem com receita
conseguirias. – Esvaziou o conteúdo de um saco plástico e começou a ler os
rótulos em voz alta. – Três miligramas de Benzodiazepine. Duas miligramas
de Flunitrazepam. Merda, estamos praticamente a falar de Rohypnol!
Fred não respondeu.
– Mau? – disse Roger, efervescente. – Ainda não comeste nada?
– Não. Apenas um café no Muhammed. Já agora, andava por ali um tipo
misterioso a perguntar pelo Lev.
A cabeça de Roger ergueu-se de imediato dos medicamentos.
– Pelo Lev? Como é que ele era?
– Alto. Louro. Olhos azuis. Parecia ser norueguês.
– Foda-se, Fred, não me assustes dessa maneira. – Roger continuou a ler.
– O que é que queres dizer com isso?
– Deixa-me colocá-lo de outra maneira. Se ele fosse alto, moreno e magro
teria sido o momento de partir de d’Ajuda. Na verdade, de partir do
hemisfério ocidental. Parecia ser polícia?
– Como é que os polícias se parecem?
– Eles... esquece, homem do petróleo.
– Parecia-se com um bêbado. Sei bem como esses se parecem.