Público - 14.10.2019

(Barry) #1
Público • Segunda-feira, 14 de Outubro de 2019 • 9

reconhecer que essa deve ser a contribuição
mínima. Tendo em conta as prioridades da
presidente, Ursula von der Leyen, a proposta
inicial da Comissão torna-se inferior à
contribuição no atual orçamento
comunitário. Nos próximos anos, os atores
políticos vão ter uma tarefa crucial: eliminar
de vez a dualidade beneÆciários líquidos,
contribuintes líquidos. Aliás, o próprio
candidato a comissário, o austríaco Johannes
Hahn, que vai assegurar o pelouro do
orçamento, apelou, na sua audição no PE, a
que se saia desta falsa dicotomia.
O orçamento Ænancia hoje políticas cujos
benefícios vão além das fronteiras de cada
EM. Migrações, defesa, inovação, educação,
investimento, digitalização são exemplos
claros. Todos os EM beneÆciam do melhor
funcionamento do mercado interno e de
economias mais robustas. O orçamento é hoje
mais europeu, mais redistributivo, inclusivo e
justo, embora também nesta matéria haja
ainda um caminho a percorrer.
O orçamento precisa de mais recursos
próprios. Precisa de novos recursos próprios
que estejam mais alinhados com as principais
prioridades políticas. Só assim poderemos
garantir um nível adequado de Ænanciamento
das despesas. O Parlamento Europeu pede ao
Conselho para ser mais ambicioso e adotar
um cabaz de recursos próprios que integre,
por exemplo, um imposto sobre os plásticos
(que só terá resultados transitórios), um
mecanismo de ajustamento das emissões de
carbono nas fronteiras, uma contribuição
comum consolidada
do imposto sobre as
sociedades, um
imposto sobre as
transações
Ænanceiras, um
imposto que
promova a justiça
Æscal nas empresas
do digital e o Æm das
correções de que
alguns EM
beneÆciam mas cuja
manutenção já não é
justiÆcada.
O Conselho
Europeu tem a
responsabilidade de
não defraudar as
expectativas dos
cidadãos, devendo
apresentar uma proposta de orçamento
ambiciosa e credível e conseguir um acordo
politico até ao Ænal do ano. Este é um desaÆo
que estará na agenda do Conselho Europeu
desta semana.

Deputada ao Parlamento Europeu;
relatora do S&D para o Quadro Financeiro
Plurianual 2021/

Margarida Marques


Um Orçamento Europeu


para os Cidadãos


O


Orçamento Plurianual da União
Europeia 2021-2027 (QFP) vai
estar na agenda do próximo
Conselho Europeu, juntamente
com o “Brexit”. Apesar de toda a
importância política do “Brexit”,
está na altura de os líderes
europeus se focarem também
naquilo que realmente vai afetar
os cidadãos da UE a 27. Não
podemos correr novamente o risco de 2014,
em que os fundos de coesão começaram a ser
implementados mais tarde do que o previsto.
Foi exatamente nesse sentido que o
Parlamento Europeu aprovou, na
quinta-feira, uma resolução política com uma
maioria clara.
O Parlamento, com legitimidade renovada,
conÆrma assim a posição adotada em
novembro de 2018 e mostra que continua
pronto para iniciar as negociações com o
Conselho. Mas o objetivo primordial desta
resolução foi responder ao voto dos cidadãos
e colocar as preocupações com o planeta, nas
dimensões ambiental, energética, económica
e social, no topo das prioridades do
orçamento. Impõe-se uma transição justa
para uma economia neutra em carbono, com
base nos mais elevados critérios de justiça
social, sem deixar ninguém nem nenhuma
região para trás.
É tempo de satisfazer as expectativas dos
cidadãos. Os meios Ænanceiros têm de estar à
altura dos compromissos políticos e das
ambições da UE. Precisamos de um
orçamento plurianual forte e credível. A
posição do Parlamento é clara: 1,3% do
rendimento nacional bruto (RNB) dos 27
Estados-membros (EM) é o montante
necessário para o orçamento. A metodologia
aplicada é transparente: i) assegurar o
Ænanciamento de políticas estruturantes
como a coesão, a agricultura e as pescas; ii)
impulsionar programas emblemáticos nos
domínios da juventude, do investimento, da
investigação e da inovação, do ambiente e da
transição climática, da digitalização, do
Erasmus ao Horizonte Europa, do InvestEU à
implementação do Pilar Europeu dos Direitos
Sociais; iii) prever meios Ænanceiros
adicionais para novas iniciativas como o
Fundo para uma Transição Justa ( Just
Transition Fund).
Alguns EM têm mostrado reservas a um
aumento da sua comparticipação. O
primeiro-ministro português, pelo contrário,
tem-se mostrado disponível para um aumento
da participação de Portugal, na condição de
outros Estados-membros também o fazerem.
A Comissão Europeia, que, na proposta inicial
de Maio 2018, propunha uma contribuição
equivalente a 1,114% do RNB a 27, já começa a

É tempo de
satisfazer as
expectativas
dos cidadãos.
Precisamos de
um orçamento
forte e credível

uma opção clara pelo diálogo e o respeito
pela dignidade do outro. Convém deixar que
os conÇitos aÇorem, não os suprimindo, mas
assumindo-os como ponto de partida no
processo educativo.
O recurso à agressividade ou à violência e a
rejeição de opiniões diferentes impossibilita
o exercício do diálogo como categoria
privilegiada para a resolução de conÇitos,
inibe a tomada de atitudes tolerantes face às
diferenças e torna conÇituante a convivência
entre indivíduos numa sociedade plural.
O novo perÆl do aluno (de base humanista)
à saída da escolaridade obrigatória espelha
bem a importância dos valores e das atitudes
que se aprendem a partir da sua prática, por
isso é muito importante um ambiente de
diálogo e liberdade na família, na sociedade
ou na escola, para que conhecimento e
competências se forjem por adjeção e não de
forma dicotómica, tal como escrevem na sua
recente obra os professores João Costa e João
Couvaneiro.
O XXII Governo Constitucional terá de
aprofundar a Estratégia Nacional de
Educação para a Cidadania atualmente em
curso e, tal como decorre das suas linhas
programáticas, deverá promover a
valorização das funções de soberania e a
qualidade da democracia, porque os
resultados eleitorais assim o exigem, quer
por força dos elevados níveis de abstenção,
que atingiram os 45,5% nestas eleições,
quer por força da expressão eleitoral da face
da intolerância humana que terá agora
assento
parlamentar!
Cabe a todos nós,
democratas e
humanistas,
encontrar o antídoto
para que esta
pequena onda
populista e
extremista não
cresça e que novos
líderes a emergir
noutros quadrantes
não sejam tentados
a enveredar pela
exploração
populista da
descrença de algum
eleitorado.
Franklin
Roosevelt, na sua
mensagem por
ocasião da Semana Americana da Educação,
em 1938, aÆrmou que “a efetiva salvaguarda
da democracia reside na educação”.
Permanece mais atual do que nunca esta
visão.

Deputada e vice-presidente do grupo
parlamentar do PS

Susana Amador


As faces da


intolerância humana


A


eleição de um representante da
extrema-direita pelo círculo
eleitoral de Lisboa para a
Assembleia da República revela
que Portugal aÆnal não estava
imune a estes ventos (que já
sopram há muito na União
Europeia) de direita populista,
xenófoba e perigosa que não
hesita em comprimir direitos
fundamentais com “cantos de sereia”
antissistema e anticorrupção, mas que
efetivamente são hinos fascizantes,
indutores do racismo, preconceito, ódio e
violência.
A defesa ignóbil de prisão perpétua (uma
hipérbole penal no mínimo desajustada num
país que é o terceiro mais seguro do mundo),
de quotas para imigrantes, da castração
química e da eliminação do cargo de
primeiro-ministro são, no mínimo, medidas
que devem merecer a nossa absoluta
rejeição porque violam a nossa Constituição
e conÆguram óbvios atrasos civilizacionais.
Nestas eleições, contudo, existe uma
evolução muito positiva e contrastante com
o programa extremista de direita. A
comunidade afrodescendente estará
representada no Parlamento, com mulheres
deputadas por parte do PS, Bloco de
Esquerda e do Livre.
O Parlamento, enquanto casa da
democracia e âncora de pluralidade, diálogo
argumentativo e tolerância, dará
seguramente ao dito representante
originariamente oriundo do PSD (foi autarca
desse partido em Loures) uma lição sobre o
nosso ideário constitucional, recordando-lhe
que nos termos do Artigo 2.º da CRP, somos
uma República soberana, baseada na
dignidade da pessoa humana e na vontade
popular e empenhada na construção de uma
sociedade livre, justa e solidária.
Saberemos, na verdade, elucidar que
“todos os seres humanos nascem livres e
iguais em dignidade e em direitos e que
dotados de razão e de consciência, devem
agir uns para os outros em espírito de
fraternidade”.
Por forma que os extremismos não
Çoresçam, temos de preparar os nossos
jovens e também os adultos para viverem
numa sociedade plural, multicultural e
complexa, submetida a profundas,
inevitáveis e rápidas mudanças.
A educação para a tolerância é uma tarefa
que parte do facto de que a nossa vida, tanto
individual como coletiva, está eivada por
conÇitos, exposta a diferenças e
condicionada por diferentes e legítimos
modos de pensar e orientar a nossa vida.
Isto exige enfrentar os conÇitos a partir de

Cabe a todos
nós encontrar
o antídoto para
que esta
pequena onda
populista
não cresça

ESPAÇO PÚBLICO

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