Presidência da República, não entra vivalma.
Visitas marcadas são canceladas, o clima entre São Bento e Belém torna-se
algo irrespirável. Governantes do Malawi ficam sem os rolos das máquinas
fotográficas à saída e o polícia que autorizou a entrada paga em dobro o seu
ordenado pela falha. «É preciso que venha pouca gente; deixe vir pouca gente»,
sugere um ministro a Maria.
Em Portugal, nada transpira para os jornais, a censura risca como dantes.
Mas lá fora, a prestigiada Time, avançara, pelo menos, uma versão do ridículo:
«O idoso e austero ditador António de Oliveira Salazar ignora ainda que foi
substituído há 15 meses», escreve-se na edição de 19 de dezembro de 1969.
«Até à data, ninguém em Portugal teve a coragem necessária para dizer ao
octogenário que o seu reino de 36 anos terminou», prossegue a publicação,
atribuindo à governanta e ao médico Eduardo Coelho a responsabilidade pela
manutenção do segredo, «ilibando» o chefe do Estado. «Por diversas ocasiões,
o almirante Américo de Deus Rodrigues Tomás, Presidente da República
Portuguesa desde 1958, tentou dar delicadamente a notícia a Salazar que, aos
oitenta anos de idade, se encontra lúcido, mas semiparalisado. Mas, como
confidenciou recentemente D. Maria a uma amiga, sempre que Tomás se dirige
à residência do ex-primeiro-ministro em Lisboa, “com a firme intenção de lhe
dizer a verdade, não consegue encontrar as palavras”.»
A verdade é uma: poucos dias antes da jornalista Maria de Lourdes entrar
camuflada em São Bento, Salazar, mesmo afetado no seu juízo, chegara às suas
próprias conclusões: «Não tem vindo cá nenhum ministro. Não me procuram.
O que há?», pergunta à governanta, já depois de se deitar. «Admira-me porque
o Presidente da República é meu amigo, quase tanto como foi o marechal
Carmona...»
O «amigo», porém, já duvidava das suas capacidades: Salazar era «um
homem com uma força de vontade espantosa e de envergadura extraordinária e
isso ajudava a enganar, sobretudo quem estivesse fanaticamente predisposto no
sentido de que ele podia voltar, totalmente, à forma antiga», escreverá o
Presidente da República.
Com Salazar «sequestrado» e protegido da caricatura em que se tornara, as
tentativas de Maria de Lourdes para entrevistá-lo naquelas primeiras semanas
de 1970 são abafadas numa cortina de silêncio.
Nessas semanas, ela nem sequer chegara perto da entourage do antigo