e banquetes nos pomares do rei para encorajar uma boa colheita de maçãs para o ano seguinte.
Em janeiro, o tempo aqueceu de repente como se fosse junho.
Tratava-se de uma situação tão estranha e inesperada que o parlamento deu ordens ao povo
para que fizesse um dia de jejum e rezasse pelo regresso do tempo próprio da estação, não fosse
seguir-se uma peste ou, no mínimo, um mau verão.
O Dia de São Valentim chegou e passou.
- Agradeçamos a Deus por este dia gélido e límpido, finalmente – sussurrou Mall quando,
por fim, o calor abrandou, no início da Quaresma.
Comprou a Frances uma pequena caixa de estanho, denominada caixa das almas, e
aconselhou-a a colocar lá uma oferenda para os indigentes e os carenciados sempre que
pensasse no duque.
Na Quarta-feira de Cinzas, na capela de Whitehall, Frances não conteve um sorriso quando o
famoso pregador escocês, Dr. Creeton, decretou, para espanto e indignação de todos, que,
durante a Quaresma, era incontinente dormir até com a própria esposa. E não foi capaz de evitar
olhar de relance para o rei, perguntando-se se aquilo significaria que ele também deveria
privar-se de frequentar a cama da amante. Contudo, o monarca prestava tão pouca atenção ao
sermão que adormecera e estava a ressonar.
Quando, finalmente, a Quaresma estava prestes a terminar, Frances verificou que a sua caixa
das almas continha bem menos oferendas do que no início e considerou que talvez estivesse a
recompor-se; nessa altura, porém, Sophia entrou no quarto dela, ansiosa por lhe dar uma grande
notícia; o pai seguia-a a poucos passos. - Frances! – exclamou ela, com a crueldade irrefletida de que só as irmãs são capazes. –
Acabei de saber. O duque de Richmond vai casar outra vez. Com uma tal Margaret Banaster de
Boarstall, que lhe dará cinco mil libras por ano... e uma enteada quase da tua idade! Vão casar-
se em Cobham, logo que a Quaresma terminar. Ouvi a nossa mãe comentar que era uma boa
notícia e que esperava que ela o tratasse com rédea curta, bem longe do palácio de Whitehall.
Achas que disse isso por tua causa?
Frances mordeu o lábio, desejando deixá-lo a sangrar, para descarregar o seu tumulto
interior. O duque de Richmond iria fazer exatamente o que o tio esperava dele. Contudo, não
conseguia evitar odiá-lo por isso. Virando-se, deparou-se com o olhar compreensivo do pai.
Assim que tornou a ficar a sós, o papagaio, que ultimamente andava calado, repercutindo a
disposição dela, observou-a também, olhou para ela com o seu olho redondo que parecia
explodir de sabedoria aviária. - Devo revelar-lhe os meus sentimentos? – perguntou ela. – Que o amor também é mais forte
do que eu? Que compreendo por que foi que os pais dele arriscaram tudo, apesar do que o
destino lhes ditava?
O papagaio estudou-a durante um momento prolongado. - Confesse e enforque-se! – acabou por anunciar.
Frances sorriu. Era a frase que o rei ensinara à noiva, antes de Catarina dominar o inglês, e