Maeve Haran - A Dama do Retrato PT (2013)

(Carla ScalaEjcveS) #1

Como uma corrente marítima incessante que lhe puxasse os pés, a exaustão apoderou-se de
Frances, que compreendeu que tinha de se deitar.



  • Eu ficarei a vigiá-la – garantiu-lhe a ama. – Agora está na altura de dormir e ter esperança.
    Já fez muito.

  • Doenças desesperadas precisam de remédios desesperados. Algo em Mary me comove.
    Para além disso – prosseguiu, pegando na mão da velha senhora –, não tivemos uma vida assim
    tão agradável em França, nós as duas, que não possamos enfrentar um pouco de risco e
    provações.
    A ama acariciou-lhe o rosto, como se Frances voltasse de novo a ser uma criança.

  • Não é como as outras damas, nem nunca será.
    Frances esboçou um sorriso cansado.

  • Por vezes pergunto-me se, para meu próprio bem, não seria melhor se o fosse.
    A anciã suspirou.

  • Mantenha a fé, jovem. Acabará por encontrar alegria.
    Porém, este último conselho já não foi ouvido por Frances, que se deitara no catre da criada
    ao lado da cama e adormecera.
    O criado que lhe contara a vitória em Lowestoft regressou e encheu os ouvidos da ama
    contando-lhe que, durante quatro dias, Londres sustivera a respiração, escutando uma grande
    batalha de canhões ao longe, até a notícia de outra vitória ser proclamada. Contudo, isso não
    travara o fluxo dos ricos que, em número cada vez maior, deixavam a cidade abandonada aos
    pobres e à peste.


No final daquele mês tórrido, parecia que toda a corte de Whitehall se mudara para Hampton
Court, seguida por uma procissão de uma milha de comprimento de carruagens e carroças que
transportavam os pertences de todos, enquanto o rei viajava na barcaça real, aproveitando assim
para ver os seus navios em Greenwich.
A quarenta milhas de distância, Mary oscilava entre a vida e a morte, suspensa por um fio.
Quando, ao terceiro dia, ela ainda não dava sinais de recuperar, Frances começou a perder a
esperança.
Chegou um mensageiro da rainha, que requeria que Frances se lhe juntasse e retomasse os
seus deveres em Hampton Court.



  • Mas como posso deixar a Mary? – perguntou Frances.
    Viraram-se para observar a pequena figura deitada na cama ampla.

  • Veja, veja! – exclamou a ama. – Está a acordar!
    Lentamente, como se despertasse de um longo sono sem sonhos, Mary abriu os olhos e
    sentou-se.

  • Ainda estou viva ou vejo dois anjos do Senhor? – perguntou num tom debilitado.
    Frances correu para a cama.

  • O Senhor não tem anjos como nós! Está de facto viva, querida menina, e que Deus seja
    Louvado por isso.

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