Maeve Haran - A Dama do Retrato PT (2013)

(Carla ScalaEjcveS) #1
A rainha soltou uma risada delicada.


  • Não a imagino num convento. Tem o cabelo demasiado bonito e um gosto demasiado bom
    para se vestir. Acabaria por levar as freiras a desfazerem-se do véu e a mudarem os hábitos num
    ápice.
    Frances sorriu, erguendo a mão para cobrir o rosto, e a manga subiu um pouco.
    A expressão da rainha mudou de imediato. Agarrou no braço de Frances.

  • Foi o meu marido quem lhe fez estas marcas?
    Com relutância, Frances anuiu.
    De súbito, a rainha pareceu tornar-se mais alta.

  • Está na altura de pôr fim a esta loucura. Santa Teresa e eu falaremos com o meu marido e
    intercederemos por si. Ele só me verá a mim, mas estou certa de que ela também estará
    presente. Talvez devesse também rezar e pedir-lhe auxílio.
    E foi assim que, pela primeira vez, Frances Teresa Stuart rezou à sua santa homónima,
    pedindo que lhe permitissem a liberdade de escolher o seu próprio caminho na vida e de ter
    pelo menos uma oportunidade de ser feliz.

  • Ámen – sussurrou a rainha, repetindo a prece dela em voz baixa. – Farei o melhor que
    puder por si, Frances.
    Charles, duque de Richmond, olhava pela janela da soalheira torre Tudor, observando o
    parque lá em baixo. O dia estava perfeito, com o céu de um azul otimista. Havia veados a
    passear por entre os narcisos brancos e amarelos que rodeavam Cobham Hall, a mansão de
    tijolos claros onde a rainha Isabel permanecera durante o primeiro ano do seu reinado. O
    parque, as quintas e os bosques que ele tinha herdado espraiavam-se diante dele, ocupando mais
    de dois mil acres. Enquanto fitava Cobham Mount, imaginava os famosos carvalhos com troncos
    de mais de seis metros de perímetro e o castanheiro a quem os locais chamavam Quatro Irmãs,
    pois tinha quatro ramos que se estendiam como braços.
    Tudo o que faltava a Cobham era a senhora há muito aguardada.

  • Não posso ficar aqui enquanto ela suporta a ira do rei sozinha – insistia, falando com Mary.

  • Tenho de regressar a Londres e enfrentar a fúria do rei.

  • Se tomar uma atitude tão precipitada – avisou-o a enteada –, ver-se-á na Torre antes do pôr
    do sol, e que utilidade terá isso?

  • É mais fácil invocar o diabo do que controlá-lo – vaticinou a ama num tom sombrio,
    desviando o olhar da lã que estava a dobar.

  • E se o rei a magoar? E eu aqui sem nada fazer?

  • Ele não a magoará. Tive bastantes oportunidades de testemunhar o seu caráter na corte. Não
    é Barba-Azul algum.

  • Não viu a fúria nos olhos dele ontem à noite. Julguei que me mataria ali mesmo.

  • Mas não o fez.

  • Não.

  • Deveria comer, Vossa Senhoria – aconselhou a ama. – Pedirei ao criado da cozinha que
    traga pão e queijo.

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