Maeve Haran - A Dama do Retrato PT (2013)

(Carla ScalaEjcveS) #1

O monarca acabou por perdoar a Frances, sobretudo porque, um ano depois de se ter casado,
ela foi acometida por varíola e, como dizia Pepys, «todos concluem que ficará completamente
desfigurada». Na verdade, a sua beleza emergiu praticamente intacta, mas o choque foi
suficiente para que a zanga do rei abrandasse.
Depois da morte do marido, Frances continuou a viver na casa de Cobham, de que tanto
gostava, mas ter-lhe-á parecido vazia sem o duque. Questões financeiras e legais acabaram por
levá-la a vender a sua parte à cunhada e a regressar a Whitehall, embora desta feita como uma
mulher independente.
Apesar de ser cortejada por vários pretendentes, não tornou a casar. Talvez, depois de ter
conhecido um casamento feliz, tenha preferido não se arriscar a um infeliz. Ou talvez, depois de
ser perseguida durante tanto tempo, já estivesse farta dos homens!
Gozou uma vida longa e ligeiramente excêntrica, tornando-se conhecida pela sua paixão, não
por reis e cortesãos, mas por gatos e jogos de cartas. Voltou a ser dama de companhia e prestou
depoimentos no caso do «Bebé no Bacio», já no reinado de James II, quando se suspeitou que a
rainha tivesse roubado um bebé vivo para substituir o seu nado-morto.
Frances acumulou uma fortuna considerável, através de investimentos sensatos, a maioria da
qual, quando morreu, deixou ao sobrinho, Lorde Blantyre, com instruções para que construísse
uma casa na Escócia, onde nascera, e que deveria chamar-se, num gesto caracteristicamente seu,
«From Lennox Love to Blantyre [De Lennox, Amor para Blantyre], sendo «Lennox» o nome
ducal do seu amado marido.
Deixou dois enormes retratos seus com o duque, nos quais se revelavam os belos caracóis
arruivados dele, e que ainda hoje se conservam na casa. Algum tempo depois, a família encurtou
o nome extravagante para Lennoxlove. Uma extraordinária reviravolta do destino fez com que eu
me casasse em Lennoxlove quase trezentos anos depois.
Foi durante o reinado de Carlos II que a imagem de Frances como Britânia foi usada nas
moedas de cobre de Inglaterra, onde permaneceu durante mais de trezentos anos, até 2008.
Pepys considerou que se tratava de um gesto generoso do rei, mas talvez ele tivesse muito por
que pedir desculpa.
Antes de morrer, Frances requisitou uma efígie sua, em tamanho real, «tão fiel quanto for
possível em cera». Outra reviravolta do destino levou a que a efígie esteja hoje em exibição no
museu da abadia de Westminster, tendo sido recentemente resgatada de um incêndio, e se
encontre ao lado da de Carlos II, também em tamanho real.
Como um exemplo encantador da História a ganhar vida, entre as duas figuras,
orgulhosamente empoleirado, está o seu papagaio-cinzento, que viveu com Frances durante mais
de quarenta anos e morreu poucos meses depois dela. É, como nos informa o museu, o pássaro
embalsamado mais antigo de Inglaterra e, possivelmente, do mundo.


Maeve Haran, Londres.
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