A Marca do Assassino

(Carla ScalaEjcveS) #1

Quando Ulbricht concluiu a narrativa, os olhos de Lizbet estavam
marejados de lágrimas. Fitou o lago e observou o vento a agitar a superfície. ─
Quem era o outro homem que foi com Himmler a casa da minha mãe? ─
perguntou. ─ Era Walter Schellenberg, um oficial de alta patente das SS. Assumiu a
Abwehr quando Canaris foi despedido. O seu pai enganou-o quanto à invasão. -─ E
a mulher que era agente dele...? ─ indagou Lizbet, com a voz fraquejando. ─ Estava
apaixonado por ela? A mãe sempre pensou que ele estava apaixonado por outra
mulher.
─ Foi há muito tempo.
─ Diga-me a verdade, Herr Ulbricht.
─ Sim, ele a amava muito.
─ Como se chamava?
─ Anna Katerina von Steiner. O pai obrigou-a a tornar-se agente. Nunca
regressou da Inglaterra.
A obsessão de Astrid pelo avô teve início nessa tarde. O seu avô, aliado de
Wilhelm Canaris, um bravo resistente da Schware Kapelle que tentou livrar a
Alemanha de Hitler! No sótão, encontrou uma arca com os pertences que a mãe
guardara: velhos livros de direito e algumas fotografias antigas, cheias de rachas
com a idade, peças de roupa. Observou-as horas a fio. Quando teve idade para isso,
chegou a imitar a aparência do avô: o cabelo espetado que parecia ter sido cortado
por ele, os óculos com lentes de cristal de rocha, os severos ternos de agente
funerário. Tentou visualizar a agente chamada Anna Katerina von Steiner, a mulher
que ele amara. Astrid não encontrou vestígios dela nos documentos do avô, por
isso compôs um retrato mental: bela, corajosa, implacável, violenta.
Com dezoito anos, Astrid regressou à Alemanha para frequentar a
universidade em Munique e envolveu-se de imediato com a política de esquerda.
Acreditava que os Nazis ainda governavam a Alemanha. Acreditava que os
Americanos eram ocupadores. Acreditava que os industriais escravizavam os
trabalhadores. Imaginava o que o avô, o grande Kurt Vogel, teria feito. Iria juntar-se
à resistência, é claro.
Em 1979, abandonou os estudos na universidade e aderiu à Fação do
Exército Vermelho. Os líderes disseram-lhe que teria de abdicar do nome
verdadeiro e assumir um nom de guerre. Escolheu Anna Steiner e desapareceu no
mundo do terrorismo.
Morava numa casa-barco no Prinsengracht. Às três da tarde saiu da livraria,
pegou na bicicleta e cruzou a praça. Delaroche pediu a conta.
Caminhou durante algum tempo, a empurrar a bicicleta, sem pressas.
Delaroche seguiu-a calmamente. Pouco mudara desde a última vez que a vira, anos

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