A Viúva Negra

(Carla ScalaEjcveS) #1

— Netanya.
— Netanya? Tem certeza de que foi em Netanya?
Ayelet assentiu sombriamente. Natalie rapidamente ligou para o número do
apartamento de seus pais. Seu pai atendeu instantaneamente, como se estivesse sentado ao
lado do telefone esperando a ligação.
— Papa — disse ela, fechando os olhos com alívio.
— Sou eu, claro. O que foi, querida?
Ela podia ouvir o som de um programa televisivo matutino francês ao fundo. Estava
prestes a dizer para ele mudar para o Canal 1, mas se conteve. Seus pais não precisavam
saber que seu pequeno santuário francês à beira-mar já não era seguro.
— E a mama? — perguntou Natalie. — Está bem?
— Está aqui do lado. Quer falar com ela?
— Não precisa. Amo você, papa.
Natalie desligou o telefone. Eram exatamente nove horas. Ayelet trocara de lugar com
o próximo supervisor de plantão, o dr. Marc Geller, um escocês ruivo e sardento.
— Quero ficar — disse Natalie.
Marc Geller apontou para a porta.
— Vejo você daqui a três dias.
Natalie coletou seus pertences da sala dos funcionários e, entorpecida pela fadiga,
pegou um shuttle até o estacionamento adjacente. Um segurança armado vestindo um
colete cáqui a acompanhou até o carro. Então, isso é ser judeu no século XXI, pensou,
sentando-se atrás do volante. Expulsos da França por uma onda crescente de
antissemitismo, Natalie e seus pais tinham vindo à pátria judaica só para enfrentar uma
onda de esfaqueamentos brutais que partiam de jovens criados e doutrinados para odiar.
Naquele momento, Israel não era seguro para os judeus. E, se não Israel, onde? Somos,
pensou ela, dando partida, um povo à margem.
O apartamento dela ficava perto do hospital em Rehavia, um bairro caro em uma
cidade cada vez mais cara. Ela avançou devagar pelo trânsito da rua Ramban, virou à
esquerda na rua Ibn Ezra e parou com facilidade em uma vaga junto ao meio-fio. O
prédio ficava na esquina com a Elkharizi, uma ruela tão estreita que mal cabia um carro.
O ar estava fresco e cheio do aroma de pinho e buganvília. Natalie caminhou
rapidamente; mesmo em Rehavia, um bairro inteiramente judeu, ela não se sentia mais
segura. Passou pelo portão, entrou no saguão e subiu as escadas até seu apartamento.
Quando colocou a mão na maçaneta, seu telefone começou a tocar. Ela checou o
identificador de chamadas. Era o número dos pais dela em Netanya.
— Aconteceu alguma coisa?
— Nada — respondeu uma voz masculina confiante em francês.
Natalie checou de novo o identificador de chamadas.
— Quem é?
— Não se preocupe — disse a voz. — Seus pais estão bem.
— Você está no apartamento deles?

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