O papa respondeu com um aceno evasivo e cumprimentou o resto da delegação. A
maior parte estava claramente satisfeita por se ver em sua presença, mas Yasser Abed Rabbo,
ex-líder da Frente Popular para a Libertação da Palestina, parecia muito mais intrigado com o
guarda-costas que nunca se afastava do Santo Padre.
Ao entrar na igreja, o papa passou alguns minutos em prece silenciosa no Altar da
Natividade. Em seguida, pediu que Abbas lhe mostrasse o dano que fora provocado à igreja
em 2002, quando um grupo de terroristas palestinos invadira o lugar sagrado durante uma fuga.
Ao final do confronto de 93 dias, as forças israelenses descobriram quarenta dispositivos
explosivos ocultos dentro do templo e clérigos franciscanos mantidos como reféns durante o
cerco contaram que os árabes tinham roubado ícones de ouro da igreja e usado páginas da
Bíblia como papel higiênico. Mas parecia ser a primeira vez que Mahmoud Abbas ouvia falar
nisso.
— O único dano causado à igreja — insistiu ele foi obra dos israelenses. Como o
senhor deve saber, eles são profundamente anticristãos.
— Se esse foi o caso — respondeu o papa com frieza por que a população cristã de
Belém caiu de 95 por cento para apenas um terço? E por que os cristãos estão fugindo do
território controlado pela Autoridade Palestina num ritmo alarmante?
Abbas sorriu debilmente e olhou para seu relógio de pulso.
— Talvez, Vossa Santidade, agora seja uma boa hora para visitar Dheisheh.
O campo ficava a cerca de 1,5 quilômetro ao sul de Belém, num pedaço de terra
alugado ao governo jordaniano após o término da Guerra de Independência. No início, um
grupo de mais ou menos três mil palestinos, a maior parte vinda de Jerusalém e Hebron,
residia ali em tendas. Agora, mais de sessenta anos depois, elas tinham sido substituídas por
estruturas de concreto e a população do campo beirava treze mil refugiados registrados. Com
níveis descontrolados de desemprego, muitos estavam sob tutela permanente das Nações
Unidas e o local se tornara fonte de atividades militantes. Mesmo assim, os residentes
receberam o papa com entusiasmo ao longo do percurso dele pelas ruas estreitas, com Gabriel
ao lado.
No fim do tour, na praça central empoeirada do campo, o Sumo Pontífice lamentou "o
terrível sofrimento do povo palestino". Mas, numa ruptura brusca com o discurso preparado,
criticou enfaticamente o fracasso de três gerações de líderes árabes na busca de uma solução
justa e viável para a crise dos refugiados.
— Aqueles que perpetuam o sofrimento humano a serviço da política — afirmou,
solene — devem ser condenados com o mesmo rigor daqueles que causaram o sofrimento em
primeiro lugar.
Ele abençoou a multidão fazendo uma cruz com um gesto da mão e subiu numa limusine
blindada, que o conduziu pelo breve trajeto até Jerusalém. Ao entrar no Bairro Judeu pela
Porta do Estéreo, ele colocou entre as pedras do Muro das Lamentações um papel com um
pedido de paz e caminhou pelas ruas do Bairro Muçulmano até a Porta da Corrente, uma das
entradas orientais do Haram al-Sharif. Um aviso colocado pelo rabinato de Israel alertava
que, em sua opinião, judeus estavam proibidos de entrar no monte devido a seu caráter
sagrado.
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
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