Eu e as Mulheres da Minha Vida

(Carla ScalaEjcveS) #1

NOVE


No sábado Zé teve de gramar o Homem Aranha pela segunda vez. Teve de comer pipocas e
divertir-se à brava sem pestanejar. Quico adorou o filme, Graça nem tanto.
O domingo foi melhor. Almoço em casa de Tó e Lili, que eram os amigos mais chegados de
Zé e de Graça, do género padrinhos de casamento, fins-de-semana juntos, etc. Viviam nos
arredores. Tó dizia que tinha emigrado para a Parede em busca da moradia dos seus sonhos,
com muito espaço e jardim. Criara uma empresa própria de mediação de seguros, também na
Parede, e Lili fazia traduções em casa. E recusavam-se a ir a Lisboa mais do que uma ou duas
vezes por mês. Tinham um filho, Antoninho, que, embora fosse da idade de Quico, era
significativamente mais baixo. Ao contrário dos pais, os miúdos não eram propriamente os
melhores amigos. Ambos filhos únicos, caprichosos e pouco dados a partilhar os seus
computadores e PlayStations , nunca se encontravam de livre vontade. Limitavam-se a tolerar-se
quando os pais os juntavam. Antoninho era um puto arrogante e provocador, de franjinha sobre
os olhos, que ele afastava regularmente com um sopro nervoso, de língua afiada, temerário, mas
que servia muito bem como saco de pancada de Quico assim que os pais de ambos se distraíam.
Graça entrou com Lili, enquanto os homens ficaram à porta de casa a discutir as virtudes do
Mercedes novo de Zé. Quico deixou-se estar por ali a pastar, sem vontade nenhuma de ir
procurar Antoninho que, por sua vez, nem se deu ao trabalho de o ir receber.
Almoçaram no jardim, febras com batatas fritas e salada.
— Que tal a tua nova secretária? — perguntou Tó, provocador.
— Não está mal, não está mal — disse Zé, com um sorriso malandro.
— Não está mal?! — protestou Graça, simulando uma expressão indignada.
— A trabalhar, querida, a trabalhar.
— Temos de combinar um almoço só de homens — sugeriu Tó — para pormos a conversa em
dia.
— Também acho — concordou Zé. — Conversas de homens.
— Conversas sobre gajas — disse Graça —, é o que é.
— Pois, pois — advertiu-os Lili —, vejam lá se nós também combinamos um almoço para
falar de gajos.
— Era só o que faltava — indignou-se Zé.
No final do almoço, as mulheres foram para a cozinha tagarelar ao som dos pratos e talheres
que iam arrumando na máquina de lavar, e os homens ficaram agarrados aos balões de uísque
com uma pedra de gelo.
— Sim senhor — observou Tó, com uma careta de aprovação — cargo novo, carro novo...
— Gaja nova — acrescentou Zé, fazendo um sorriso malandro. Afinal de contas, de que lhe
valia uma conquista tão gloriosa se não pudesse contar a ninguém? Era irresistível, dizer ao seu

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