perturbava-a muito. Nuno desesperava por ela, pelo seu amor, para
tranquilizar o seu receio de que o ressentimento matasse a paixão. Ainda
estava assustado com a forma como Regina o recebera. Esperava encontrá-la
preocupada, zangada, vinha preparado para uma cena, para uma repreensão,
um amuo. Mas não imaginara que Regina pudesse estar tão transtornada.
Compreendeu o mal que lhe fizera, ainda que involuntariamente, e, numa
reacção um pouco egoísta, quis apaziguar-lhe o sofrimento, resgatá-la à pressa
da nuvem negra que a envolvia, cheio de medo de que Regina tivesse chegado
ao limite das suas forças e dissesse basta. Nuno ficou sinceramente
impressionado ao vê-la naquele estado, transfigurada de preocupação,
envelhecida de nervos. É hoje , pensou, é hoje que ela me manda à vida.
Não obstante Nuno se comportar como se não houvesse um verdadeiro
compromisso de amor entre os dois, como que fazendo de conta que a relação
deles não tivesse mudado com o decorrer dos anos e pudessem separar-se a
qualquer altura sem que isso os traumatizasse, no seu íntimo sabia que estava
preso pelo coração e que, por sua livre vontade, nunca deixaria Regina. Ele
sentia-o, só não era capaz de o dizer.
Uma pessoa crescia, ganhava experiência de vida, amadurecia, mas no
essencial não mudava. No caso de Nuno, a infância abandonada que tivera
fizera dele um solitário irremediável, o que, de algum modo, continuava a
constranger a sua personalidade. Nuno tinha escrúpulos em verbalizar um
compromisso definitivo porque isso significava que pudesse ser abandonado,
como a sua mãe fizera ao seu pai e como os pais lhe tinham feito a ele. No
fundo, sabia que era um disparate, pois cinco anos de vida em comum com
Regina não podiam ter outra definição que não fosse um compromisso de
amor , mas o facto de nunca ter assinado um papel, de não ter subido a um
altar, de nem sequer alguma vez lhe ter dito que queria ficar com ela para
sempre, constituía uma defesa psicológica de que Nuno não queria abdicar.
Regina conhecia o passado de Nuno e, embora gostasse de poder livrá-lo
dos fantasmas que o perseguiam desde a infância, procurava ser compreensiva
e não se ofender com a sua incapacidade de lhe declarar o seu amor por ela.
Tinha a certeza de que sim, que Nuno a amava, e, se não o exprimia por
palavras, demonstrava-o de outras formas. Porém, de tempos a tempos Nuno
tinha tendência para se mostrar distante, indiferente, e o hábito de passar
muito tempo fora de casa, incontactável, metido em aventuras cujos
pormenores perigosos não lhe contava, tornava-se um constante desafio à
resistência de Regina, à força de vontade dela para ultrapassar as