O Último Ano em Luanda

(Carla ScalaEjcveS) #1

MFA acabou por prender vários dos seus próprios oficiais, metidos, por
engano, no mesmo saco dos conjurados. Agora, muitos meses depois, Nuno
deu consigo reunido com um desses dirigentes e a pensar que o MFA também
não primava pela competência, porque a FRA ainda mexia alguns cordelinhos
e até os serviços de inteligência militar apoiavam as suas golpadas.


— A sua missão é entregar dois carregamentos de armas — disse Silva
Pinho. — Aterra no local combinado, descarrega, regressa. Duas viagens,
nada mais.


— Ainda que mal pergunte — disse Nuno —, porquê?
— Porquê o quê?
— Porque é que estão a ajudar a UNITA?
— Porque o MFA tem em curso uma conspiração para entregar Angola ao
MPLA, e entregar Angola ao MPLA é oferecer esta terra a Moscovo e
espoliar os portugueses, o que, definitivamente, não podemos permitir.


— Mas o que é que mais umas quantas armas podem fazer para alterar o
destino? — insistiu Nuno.


— O MPLA está a ser abastecido por cargueiros soviéticos através de Ponta
Negra, no Congo-Brazavile, e a ser ajudado nos aspectos logísticos pelo
MFA, que também está a encaminhar os guerrilheiros catangueses e os
soldados negros desmobilizados do exército português para as fileiras do
movimento. A FNLA está a ser apoiada pela CIA e pelo Zaire. A UNITA é
quem tem mais homens, mas não tem armas. Nós vamos dar-lhes algumas
para reequilibrar as coisas.


— A UNITA e a FNLA contra o MPLA, em Luanda, é essa a vossa
estratégia? Silva Pinho abanou a cabeça, pausadamente, a dizer que sim. — E
onde é que entra o Serviço de Informação Militar nesse plano?


A pergunta ficou a pairar longos segundos num silêncio constrangedor. Os
seus olhos encontraram-se através da nuvem azulada dos cigarros que
fumavam, suspensa em cima da mesa que os separava. Nuno a sustentar a
intimidação, sem se permitir desviar os olhos, o filho da mãe está a fazer-se
de duro comigo, mas já vamos ver quem ganha.
E o outro, sem dizer nada,
sabendo que ele estava à espera de uma resposta e dali não saíam, mudou de
registo.


—   Sabe    o   que é   mais    extraordinário? —   espantou-se Silva   Pinho.
— Não — respondeu Nuno, com uma indiferença estudada, inclinando-se
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