O Último Ano em Luanda

(Carla ScalaEjcveS) #1

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A moradia ficava numa rua desafogada do bairro do Restelo, zona de gente
abastada, a ajuizar por aquela e outras casas, grandes e bonitas. Nuno parou a
moto mesmo à frente do portão e retirou lentamente o capacete a pensar que
havia gente que sabia viver e ele andava iludido com alguns contos de réis no
bolso mas, no fundo, não sabia nada de nada. Já o seu playboy era outra
conversa, e eu a achar que o gajo era um idiota chapado.. . Não admirava que
se permitisse gastar uma extravagância em meio quilo de coca para a servir
aos amigos em bandejas de prata. Conquanto não duvidasse que estivesse na
morada correcta, Nuno supôs que a casa não era do tipo e que o espertinho
devia estar a aproveitar a ausência dos pais algures no estrangeiro para fazer
uma festa memorável.


Havia muitos carros estacionados à porta, na sua maioria desportivos de
boas marcas. Disso percebia ele e não precisou de dar voltas à cabeça para
fazer as contas por alto e deduzir que, só no parque automóvel, estava ali uma
fortuna.


Um muro baixo limitava o estreito jardim da frente, concebido para deixar
respirar a moradia, recuada em relação à rua. No extremo direito do muro
havia um portão de ferro, suficientemente largo para permitir o acesso dos
carros à garagem através de um caminho de duas linhas de empedrado por
cima da relva. Uma placa avisava para se ter cuidado com o cão, embora não
houvesse nenhum à vista, provavelmente por estar preso para não atacar os
convidados. Nuno juntou-se a um grupo animado que entrava, sendo recebido
à porta por um criado com tiques de mordomo britânico, de fraque escuro e
luvas brancas.


O átrio era um amplo espaço marmoreado, muito bem iluminado. tinha uma
escadaria redonda à esquerda, que conduzia ao primeiro andar, tendo uma
sacada interior com parapeito de pedra branca por cima e a toda a largura do
andar térreo. À direita estava montado um bengaleiro. Uma simpática jovem
de longos cabelos louros, olhos verdes e um decote que incentivava a
imaginação de um homem, recebia os casacos atrás de um balcão e
pendurava-os em cabides numa estrutura metálica com varão, oferecendo em
troca uma chapa numerada. Nuno dispensou o serviço, para sua grande pena,
dada a beleza estonteante da rapariga, mas nessa noite estava com os minutos
contados, não vinha para ficar.


Ainda no átrio, os convidados eram abordados por um criado de smoking
branco e uma bandeja cheia de flûtes , secundado por outro que ia atestando os

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