muito chique.
— Que engraçado — comentou. — Como o Carlos da Maia.
— Pois, era avô dele — resmungou Clara.
— Que falta de humor, filha — ralhou a mãe, divertidíssima. — Sente-se, senhor João Pedro da
Maia — convidou-o, cheia de espírito.
Ele sentou-se numa das poltronas, a coçar a barba, a passar a mão pelo cabelo, embaraçado, sem
se decidir a corrigi-la.
— Não é da Maia, é só Maia — antecipou-se, Clara.
— Whatever — disse a mãe, casualmente, a falar para o lado.
Era a primeira vez que ia a casa de Clara e o luxo da sala atapetada era suficiente para o fazer ver
que entrara noutro mundo. Mas a mãe de Clara, com a sua chacota, certificou-se de que entendia que
não pertencia àquele meio nem, se dependesse dela, àquela família. Não era bem-vindo. Estava
chocada com o aspecto de João Pedro, achou-o feio, deslavado, mal vestido. Usava calças de ganga
rotas, uma camisola grossa azul, desbotada, e ela a matutar que não eram preparos para se vir
apresentar a uma senhora. Mas o rapaz não sabia, coitado, não fazia ideia, pensou, encolhendo os
ombros para ninguém em especial. O queixo proeminente, a barba desgrenhada, o cabelo
despenteado num tumulto de caracóis soltos, tudo nele lhe sugeria uma necedade gritante.
— Mãe, eu e o João Pedro decidimos casar.
Foi um golpe. O sorriso murchou-lhe na face, abriu os olhos de espanto, empalideceu, levou a mão
ao peito enquanto tomava um pouco de uísque. E eles aguardaram calados que ela se recompusesse.
— Decidiram casar...
— Decidimos.
— Mas, filha, isso não se decide assim, é um passo muito importante, tem de ser bem ponderado.
— Eu sei. Nós pensámos muito no assunto e é o que queremos fazer.
Clara voltou-se para João Pedro com olhos melosos, um largo sorriso, estendeu-lhe o braço desde
a sua poltrona, deram as mãos. E a mãe, vendo aqueles olhos da filha humedecidos de terna emoção,
toda ela irradiando felicidade, consciencializou-se de que tinha ali um problema grave.
A mãe empenhou-se exageradamente em dissuadir Clara dos seus intentos casamenteiros, mas
foram só vãos e desesperados expedientes, pois a filha não cederia à voz da razão, mais que não
fosse para a contrariar. Quanto mais lhe dissesse que não, mais Clara teimaria que sim, brusca e
insensivelmente. João Pedro, orgulhoso da irredutibilidade imperturbável de Clara à persistência
militante da mãe, haveria de lhe ouvir demasiadas vezes o desabafo demolidor: «Se eu, ao menos,
tivesse dado ouvidos à minha mãe.»