19
João Pedro tocou à porta de Cristiane às nove da manhã. Ela foi abrir e deu com ele atrapalhado a
carregar o cavalete e um saco com as tintas e os pincéis. Ela tapou a boca com a palma da mão, a
pensar que aquilo ia mesmo acontecer, ele ia pintar o seu retrato! Teve um risinho nervoso.
— Bom dia — disse ele, com uma cara de satisfação.
— Bom dia — retribuiu Cristiane. Abanou a cabeça, desconcertada. Não pensara na trabalheira
que lhe ia dar. — Deixa-me ajudar-te.
Ele ainda voltou a casa para ir buscar o banco alto que costumava usar e mais algum material que
não conseguira trazer logo. Montou tudo na sala dela, três metros à frente da chaise longue.
— Queres pintar aqui ou preferes outro lugar? — perguntou Cristiane, nervosa com os
preparativos.
— Aqui está perfeito. Gosto da chaise longue e dos caixotes. Dá um cenário bestial.
Ele sentia-se empolgado com este novo projecto.
— Onde é que eu fico?
— Na chaise longue — disse ele, concentrado a preparar as tintas.
— E em que posição?
João Pedro levantou a cabeça, observou-a. Cristiane vestira um vestido branco, vaporoso, sem
sutiã, penteara-se demoradamente e maquilhara-se com o esmero das grandes ocasiões. E estava
descalça, como na véspera.
— Vais ficar assim, vestida?
Ela interpretou mal a pergunta. Baixou os olhos para o vestido, olhou para João Pedro, que se
entretinha com a paleta e as tintas.
— Este vestido não me fica bem? — perguntou-lhe, surpreendida.
Ele continuou a falar, de cabeça baixa, encarando-a só no final da resposta.
— O vestido está óptimo, estás linda. A questão é se queres um retrato tradicional com o vestido
ou uma coisa mais ousada, sem roupa.
Cristiane apoiou uma mão na cintura e apontou-lhe uns olhinhos cerrados em forma de mira.
— Uma coisa mais ousada, hem?
Ele ofereceu-lhe um sorriso inocente.
— É contigo — disse.
— Queres pintar-me nua?
João Pedro encolheu os ombros.
— Tem outro impacto, é mais espectacular, mas tu é que decides. Se não tens à-vontade para isso,
eu percebo. — Fez uma cara de alegre resignação.
— Estás a provocar-me?
Ele sorriu.