Exame - Edição 1180 (2019-03-06)

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RALPH ORLOWSKI/REUTERS

nas eleições para o Parlamento Europeu
em maio deste ano. E isso, por sua vez,
aumentará as incertezas que cercam o
sucessor do presidente do Banco Central
Europeu, Mario Draghi, e o futuro da po-
lítica monetária da zona do euro.
Em quinto lugar, a política disfuncio-
nal interna dos Estados Unidos poderia
aumentar as incertezas em nível global.
A recente paralisação do governo federal
sugere que todas as próximas negocia-
ções sobre o orçamento e o teto da dívi-
da se transformarão em uma guerra de
atrito entre os partidos. Um relatório
esperado do procurador especial Robert
Mueller pode ou não levar a um proces-
so de impeachment contra Trump. E, até
o fim do ano, o incentivo fiscal dos cortes
de impostos republicanos se transfor-
mará em empecilho fiscal, possivelmen-
te enfraquecendo o crescimento.
Em sexto lugar, os mercados de ações
tanto nos Estados Unidos quanto em
outros lugares ainda estão supervalori-
zados, mesmo após a recente correção.
À medida que aumentam os custos sala-
riais, podemos ter a indesejada surpresa
de ver cair as receitas e margens de lucro
das empresas americanas. Com a possi-
bilidade de as companhias, já altamente
endividadas, terem de arcar com custos
de empréstimos de curto e longo prazos
mais altos, e com muitas ações do setor
de tecnologia ainda sujeitas a novas cor-
reções de preço, não se pode descartar o
perigo de outra onda de aversão a riscos
e uma consequente correção (uma baixa
significativa) do mercado.
Em sétimo lugar, os preços do petróleo
podem ser empurrados para baixo por
um excesso de oferta, devido à produção
de xisto nos Estados Unidos, a uma po-
tencial mudança de regime na Venezue-
la (que traria expectativas de aumento de
produção ao longo do tempo) e a fracas-
sos dos países da Opep em cooperar uns
com os outros para limitar a produção.
Embora os preços baixos do petróleo se-
jam bons para os consumidores, eles ten-
dem a enfraquecer as bolsas dos Estados
Unidos e os mercados nas economias
exportadoras de petróleo, gerando preo-
cupações quanto à inadimplência das
empresas nos setores de energia e afins
(como aconteceu no início de 2016).


Finalmente, as perspectivas para mui-
tas economias dos mercados emergentes
dependerão das mencionadas incertezas
globais. Os principais riscos incluem
desaceleração nos Estados Unidos ou na
China, maior inflação nos Estados Uni-
dos e um subsequente aperto financeiro
do Fed, guerras comerciais, um dólar
mais forte e queda nos preços do petró-
leo e das commodities em geral.
Embora paire uma nuvem sobre a eco-
nomia global, o ponto positivo é que isso
tornou os principais bancos centrais mais
conciliadores, começando pelo Fed e pe-
lo Banco Popular da China, rapidamente
seguidos pelo Banco Central Europeu,
pelo Banco da Inglaterra, pelo Banco do
Japão e outros. Ainda assim, o fato de a
maioria dos bancos centrais estar numa
posição altamente acomodada significa
que há pouco espaço para flexibilização
monetária adicional. E, mesmo que a po-

lítica fiscal não estivesse constrangida na
maioria das regiões do mundo, as medi-
das de estímulo tendem a ser adotadas
somente depois que o crescimento eco-
nômico já está estancado, e normalmen-
te com um atraso significativo.
Pode haver fatores positivos suficientes
para fazer deste um ano relativamente
decente, embora medíocre, para a econo-
mia global. Mas, se alguns dos cenários
negativos delineados anteriormente se
concretizarem, a desaceleração sincroni-
zada de 2019 poderá levar a uma parali-
sação global do crescimento e a uma for-
te desaceleração do mercado em 2020. Q

Fábrica na Alemanha: uma guerra comercial movida
por Trump ameaçaria a União Europeia

Nouriel Roubini
é executivo-chefe da
Roubini Macro Associates
e professor na Escola
de Negócios Stern, da
New York University

IDEIAS | ECONOMIA

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