IDEAIS TRAÍDOS - sylvio frota - 706 Págs

(EROCHA) #1

de ser uma peça de uso particular.


Estes objetos, e muitos outros, são reivindicados pelos governos paraguaios como relíquias de
seu povo. Reconheço que realmente o são, mas, se constituem troféus de guerra, devolvê-los seria
sapatear no heroísmo de nossos antepassados. No entanto, em 10 de abril de 1980, o presidente
Figueiredo entregou a espada do marechal López ao Paraguai.


Em razão destas apreciações, julguei possível a devolução do "Livro de Ouro". Detive-me
nessas considerações sobre troféus de guerra por ser este um assunto polêmico e constantemente
analisado em ambiente emocional. As correntes de opinião divergem quanto à restituição, posto que
a maioria esmagadora seja pela negativa irrestrita de qualquer devolução. Recebi muitos telegramas
e cartões de compatriotas nossos - especialmente professores - reagindo contra a entrega de nossos
troféus de guerra, em virtude do que se propalava pela imprensa.


A eles dedico, em particular, estes esclarecimentos.

A amizade dos povos não se reafirma, robustece e consolida na condescendência política,
relegando ao desprezo suas tradições até dissolvê-las no esquecimento, mas sim no respeito
recíproco aos seus direitos e aos postulados morais que lhes são caros, na compreensão de que
cooperar para desenvolver não é ajudar para espoliar, nem apoiar para proteger significa ocupar
para dominar.


Estive no Paraguai com imensa satisfação. Servira em sua fronteira, ao tempo de capitão e, desde
cedo, habituei-me a ver, nos nossos vizinhos, um povo patriota, valente e laborioso. Após a
Revolução de 1964, voltei, como Comandante da 4á Divisão de Cavalaria, àquela região limítrofe.
Nada mudara a gente guarani na fervorosa devoção à Pátria e ao seu herói máximo, o marechal
López. O Hino Nacional, nas comemorações públicas, era entoado até pelas crianças, o pavilhão
Paraguaio reverenciado e exaltadas as virtudes dos seus grandes vultos.


Os povos só subsistem, e resistem às pressões e ameaças das nações mais poderosas, enquanto
cultuam e defendem os mesmos valores espirituais; desde que não o façam estarão fadados à
fragmentação.


Em Assunção, assisti à cerimônia, na Embaixada do Brasil, da devolução do "Livro de Ouro" ao
governo da República do Paraguai. A esposa do presidente do Brasil, sra. Lucy Geisel, entregou-o à
esposa do presidente do Paraguai, sra. Ligia Mora Stroessner.


O sigilo mantido sobre o ato concorreu para a sua integral surpresa e produziu impressionante
choque emocional nas três centenas de convidados, todos eles do mais elevado nível social daquele
país. O general Alfredo Stroessner debruçou-se sobre o álbum e as lágrimas que brotaram de seus
olhos gotejaram no documento histórico. Um idoso magistrado, presidente de alta corte da justiça,
figura austera e imponente, evadindo-se do protocolo, levantou os braços para o céu e clamou, com
voz entrecortada de soluços: "Oh! Deus meu! Que venha agora o Cristiano!"3

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