ratarei, agora, do que zombeteiramente se chamou "Pacote de abril". Recebeu este nome um
conjunto de atos - dos mais revoltantes da administração Geisel - assim considerados não somente
pela forma capciosa de que se revestiu a sua preparação como pela essência de muitas de suas
medidas, de caráter nitidamente perpetuador, desconhecidas da maioria dos ministros.
Os homens públicos que praticam ações político-administrativas condenáveis e têm consciência
disto, temendo a repulsa da comunidade, procuram, no limite do possível, ocultá-las. Mas, se sua
divulgação é inevitável, tentam justificá-las com alardeadoras manifestações de bons propósitos e de
defesa de interesses imediatos da coletividade.
É uma maneira ardilosa de agir, típica da conduta dos irresponsáveis, que bem define o
administrador de falsa austeridade.
Entretanto, um chefe de governo revolucionário, que se apóia em sólidos princípios morais,
exatamente por isso não pode permitir - excluída a hipótese de ter sido iludido - que um grupo de
seus assessores diretos escamoteie intenções e ludibrie os ministros, na elaboração de importantes
atos públicos cuja boa recepção pela maioria da Nação é duvidosa. E, particularmente, quando
destes atos evola-se forte cheiro de perpetuidade daquele grupo no poder.
O general Hugo Abreu, em visita que me fez após sua exoneração da Chefia da Casa Militar, ao
comentar a reunião do Conselho de Segurança Nacional que precedeu ao Pacote de abril, disse-me
que naquele dia o presidente tinha traído o Ministério. Achava, porém, que o fizera de boa-fé,
iludido pelo grupo palaciano.
Conhecendo o autoritarismo de Ernesto Geisel, coloquei em dúvida a sua condescendência.
No seu livro, reafirma Hugo Abreu essa impressão ao dizer: "Tenho quase a certeza de que o
presidente Geisel não participou da farsa inicial." E ainda: "Das idéias que aparecem no Pacote, a
única que ele pensava realmente era a eleição indireta de governadores."'
O famoso Pacote foi gerado na mente ambiciosa dos homens do palácio do Planalto e a sua
gestação teratológica só pode ser compreendida pelos patologistas, sendo negado aos seres normais
entendê-la. Não obstante esta circunstância, procurarei descrevê-la, a partir de 31 de março, dia em
que foi confirmada a intenção presidencial de fechar o Congresso.
Na véspera deste dia, o general Hugo Abreu avisara-me do propósito do presidente de pôr em
recesso o Congresso a fim de efetivar a reforma do judiciário, cujo projeto tinha sido rejeitado pelo