Extintos os assuntos administrativos, perguntou-me o general Geisel:
- Por que aquele almoço com discursos no dia 27?
Referia-se o presidente a uma homenagem que os generais haviam prestado ao Ministro do
Exército, no dia em que completara três anos de administração no cargo.
Disse ao presidente que essas manifestações de solidariedade e respeito eram integrantes do
sentimento de camaradagem dos militares. Emergiam da caserna, nas datas natalícias e naquelas que
marcavam as assunções de comando. Ele, como militar, sabia perfeitamente disso.
Nada mais quis dizer, mas poderia mencionar o fato de dois meses antes o Ministro da
Aeronáutica ter recebido dos brigadeiros idêntica homenagem, sem que eu tivesse ouvido falar em
desagrado do presidente.
A questão, como vemos, não era de caráter geral, porém específica ao Ministro do Exército, a
quem o presidente, assim penso, não gostaria de ver prestigiado.
Participei ao presidente, após aquele esclarecimento, que marcara viagem à cidade de Curitiba
para visitar a guarnição do Exército. Perguntei-lhe se, em face das agitações ocorrentes e da próxima
visita da sra. Carter, achava conveniente não ir. Eu estaria de regresso antes da chegada da ilustre
visitante, devendo partir no dia seguinte, 1° de junho.
O general Geisel, naquele dia, estava sob forte tensão, talvez em decorrência do movimento
estudantil que se agravava. Expandindo-se com revolta e amargor, recriminou "gregos e troianos"
pelos acontecimentos, como bem define o diálogo:
- Estão criando-me dificuldades... um deputado leu o manifesto comunista na Câmara...
- Mas o senhor deveria prever isso. Outros congressistas proporcionaram recursos ao Partido
Comunista. Este, na certa, comprometeu-se a ler... - E lá no Nordeste... os radicais prenderam, agora, dois pastores protestantes norte-americanos...
criando um caso... - Que radicais, presidente? Agentes de polícia que detiveram dois indivíduos malvestidos, em
local de constantes roubos e latrocínios, transportando mercadorias, podem ser chamados de
radicais?
O presidente, à proporção que falava, excitava-se e sob indignação prosseguiu:
- E os estudantes... Estão provocando desordens... Estão se excedendo... Mandei prender...
E voltando-se para mim, apontando-me o dedo, liberou o seu pensamento: