IDEAIS TRAÍDOS - sylvio frota - 706 Págs

(EROCHA) #1

Dias depois, numa entrevista concedida à imprensa, ao ser interrogado pelo jornalista por que
dera aquela resposta falsa ao general Fiuza de Castro, respondeu que o fizera numa "restrição
mental".


Na seqüência dos acontecimentos ocorre o embarque de Carlos Luz, com pequeno séquito de
ministros e autoridades, no cruzador Tamandaré, que desrespeita o acintoso sinal de "barra fechada',
aproa para as águas do Sul, sob o fogo cerrado das fortalezas "lottistas", rasgando com imponência o
oceano ao tempo que traçava, na história das nossas tristes lutas internas, uma de suas mais sublimes
páginas épicas.


Concedo-me, aqui, uma pequena digressão para aludir a um fato pouco difundido, porém de alto
teor moral. Desta ocorrência ouvi, em oportunidades diversas, algumas narrativas fragmentárias
feitas por oficiais que estiveram a bordo daquela nave de guerra. O ex-governador Carlos Lacerda,
testemunha do evento, dá dele uma versão completa em seu Depoimento.'


Navegava o cruzador em alto-mar, quando um rádio informa ao comandante que a guarnição do
porto de Santos - seu destino - aderira à nova ordem política e opor-se-ia ao desembarque do
presidente.


Carlos Luz, ciente da situação, reúne a bordo um conselho que opina favoravelmente ao
desembarque em Santos, sob qualquer risco. Neste delicado momento o coronel Mamede pede que
todos meditem sobre a gravidade da resolução que haviam tomado. Um desembarque a viva-força
ocasionaria derramamento de sangue, mortes e mui provavelmente uma irreversível cisão das Forças
Armadas, cuja coesão, já ameaçada, deveria ser preservada a todo custo.


Sua elevação de linguagem, a firmeza de seus argumentos e a serenidade com que os expôs
mudaram a decisão, e o cruzador Tamandaré regressou ao porto do Rio de janeiro.


Muitos anos depois, a mágoa do bombardeio do Tamandaré extravasava, ainda, das palestras que
meus amigos oficiais de Marinha comigo mantinham, quando juntos servíamos na Escola Superior de
Guerra. Procurava então mostrar-lhes que o ato de um artilheiro insano, acobertado pela ordem de
um ministro egoísta e ambicioso, que via na disciplina um instrumento coercivo para uso de sua
prepotência, nunca a tendo visto - eu posso assim falar porque o conheci desde capitão - como um
dever de consciência, recebera a repulsa da esmagadora maioria do Exército.


No dia 21 do mesmo mês, no seu "retorno" à legalidade, o general Lott impede que o presidente
Café Filho assuma o seu cargo, depondo-o também.


Os políticos "pelegos", sabendo-o vaidoso, incensavam-no com títulos e presentes. No auge da
bajulação apelidaram-no de "Condestável da Democracia" e pouco depois ofereceram-lhe, em praça
pública, uma espada de ouro.


Mais felizes seriam se o crismassem de "Marechal dos Paradoxos'; o que a História certamente
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