Fotografe - Edição 281 (2020-02)

(Antfer) #1

50 Fotografe Melhor no 281


MATÉRIA DE CAPA


Foto do projeto
documental Baixo
Augusta, desenvolvido
por José Bassit na
região da Rua Augusta,
em São Paulo (SP)

ainda tinham grandes reportagens.
Atualmente, uma matéria no Brasil e
em algumas revistas do exterior tem no
máximo de 8 a 10 fotos”, aponta.
Nos dias de hoje, uma alternativa são
as plataformas digitais, que transformaram
o jornalismo e abriram a possibilidade para
publicação de grandes séries fotográficas
sem limitação de espaço. A edição digital
também trouxe novas ferramentas, como a
possibilidade de editar ensaios no formato
audiovisual. O problema é que, na média,
paga-se pouco pelo trabalho do fotógrafo.

IR FUNDO NO ASSUNTO
Os projetos documentais de longa
duração também se diferem das grandes
reportagens, que permitem uma cobertura
mais cuidadosa e adensada, fugindo ao
hard news, mas ainda estão no campo do
fotojornalismo, pois resultam em pautas
específicas e bem circunscritas no tempo e
no espaço. Para Juan Esteves, fotojornalismo
e fotografia documental são diferentes, mas
não excludentes. “A principal preocupação
do fotojornalista é com a notícia, ele tem
que passar para um público específico
o que está vendo e traduzir o fato em
imagens o quanto antes e, se possível, de
uma maneira isenta. O documentarista tem
um trabalho mais engajado, que representa
a vontade do autor em discutir algum tema.
Exige muito mais pesquisa e dedicação do
fotógrafo”, compara.
O documentário fotográfico funciona
por meio do acúmulo e do desdobramento
de um grande tema em várias abordagens.
Para tanto, é necessário deixar o tempo
passar e voltar ao mesmo lugar mais de
uma vez, em diferentes ocasiões. Só
assim é possível captar as transformações
daquilo que se está fotografando. Outro
tipo de abordagem pode ser realizado

Do ponto de vista histórico, a
utilização da fotografia documental
foi marcada pela subvenção estatal
ou pela viabilidade comercial do
tema tratado. Uma das primeiras
iniciativas nesse sentido foi a
Missão Heliográfica, bancada
pelo governo da França, que
escalou fotógrafos para realizar
um levantamento de 175 edifícios
considerados patrimônio histórico
nacional, no ano 1851. No Brasil,
Marc Ferrez (1843-1923) se
destacou como documentarista de
obras realizadas pelo poder público
entre o final do século 19 e o início
do século 20, como a construção
de ferrovias e as reformas
modernizadoras realizadas pelo
prefeito Pereira Passos na cidade
do Rio de Janeiro.
A fotografia documental
também serviu como instrumento
de denúncia e como indutora
de mudanças. Exemplos disso
são os trabalhos de Jacob Riis

Com dinheiro do governo


(1849-1914) e Lewis Hine (1874-1940),
cuja documentação das condições
de vida da classe trabalhadora nos
Estados Unidos levou a avanços
decisivos na legislação trabalhista.
As obras desses dois fotógrafos
influenciaram a realização do
mais ousado projeto documental
subvencionado pelo poder público
na história da fotografia, realizado
pela Farm Security Administration
(FSA) nos Estados Unidos, entre 1935
e 1942, visando fazer um diagnóstico
sobre as condições precárias da vida
na zona rural do país após a Grande
Depressão (confira o trabalho de
Dorothea na pág. 64).
A fotografia documental ganhou
enorme impulso com o surgimento
das revistas ilustradas, cujo principal
modelo foi a americana Life, a partir
da reforma no projeto editorial
realizada por Henry Luce em 1936.
As fotos ganharam então um status
equivalente ao do texto e teve
início ali a utilização sistemática

de narrativas fotográficas
pela imprensa. Poucos anos
depois, já na década de 1940, o
surgimento da Magnum, agência
de fotógrafos independentes
em busca de desenvolver suas
próprias histórias, como Henri
Cartier-Bresson e Robert Capa, foi
outro marco no setor. Desde sua
fundação em 1947, a Magnum
segue sendo a principal referência
no universo da fotografia
documental.
O documentário fotográfico
adentrou o ambiente das artes
também na década de 1940, com
a fundação do Departamento
de Fotografia do Museu de Arte
Moderna (MoMA) de Nova York,
que desde o início incorporou ao
seu acervo obras desse gênero.
Basta frequentar uma edição da
Bienal de São Paulo ou de Veneza
para verificar que os trabalhos
documentais seguem em voga na
arte contemporânea.

José Bassit
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