Sexta-feira,6demarçode2020|Valor| 27A
os 89 anos,MaureenBisilliatnão
dá sinaisde cansaço. Em meioao
lançamentodo filmeautobiográ-
fico “Equivalências-AprenderVi-
vendo” e da exposiçãode imagens“Agora
ou Nunca-Devolução”, em cartazno Insti-
tuto MoreiraSalles de São Paulo,ela faz pla-
nos paraprojetosfuturoserefleteapartir
do vastomaterialcriadoao longode sua
trajetória.Filmeeexposiçãofalamde seu
trabalhonas últimascincodécadase, entre
outrascoisas,o retorno da artistaa lugares
ondefotografouno passadoe suasrefle-
xõesapartirdoscaminhosquepercorreu.
Deorigeminglesa,Maureenfoidesenraiza-
dapelavida.Filhadeumdiplomataargentino
e de uma pintora inglesa, ela passou grande
parteda juventude em contatocom línguas e
culturas de paísesdiferentes. Chegouao Bra-
sil, seu país de adoção, em 1957,e por aqui se
estabeleceu.Não à toa,ironizaas muitas pes-
soas que a tratam comoestrangeira. Conquis-
tou esse direito após mais de 60 anos vivendo
por aqui.Quantos conheceramo“Brasil pro-
fundo”comoela?Quantosbrasileirostiveram
relaçãotãoamorosacomnossaliteratura?
Conversarcom Maureenéviajar por sua obra
e pelasreflexõesde uma pessoaque aprendeua
pensarpor imagens.O temposó aguçouoseu
humor. Antesque areportagemfizessequal-
quer pergunta,ela já se divertecom o nomedo
jornal:“ValorEconômico’,eu digo assim,brin-
candoenãobrincando,comosairdovermelho?
Porque não épara se lastimar, mas a verdadeé:
quandovocê faz uma coisaautonomamente,te
dá um enormeenriquecimentocomoenergia,
comovida,não?Agora,temquesabercomo,di-
gamos,‘tirar de Pedro para dar aPaulo’. Para fa-
zer uma coisacomoprodutorapequenina,leva
muitotempo.Entãovocêtemquesaberfazeres-
te jogo de estar em outrascoisaspara pagar[as
contas],querermuitofazer”.
Produzira si própria,para Maureen,“drena a
energia”.Aautonomiagera insegurança,mas
tambémumaprofundasensaçãodeliberdadee
aprendizadoconstante.Nãosóparaela,maspa-
ra os envolvidosem seus projetos.“Eu acho que
vale apena, a genteaprendeumuitofazendo
‘Equivalências- AprenderVivendo’”, diz. “O fil-
me veio por um caminhode muitosanos.Seis
anos com um jovemeditor, Felipe Lafé, em que
passamoscincodias por semanafuçandonos
muitostrabalhosdevídeo.Tinhafilmesjáfeitos,
tinhamuitospedaçosde vídeo, entrevistasco-
mo você está fazendo, viagensque eu fiz. Então,
depoisdeunsseisanos,deuparafazerumrotei-rosolto.Ofilmetem1h30.Muitodifíciléreduzir
o filme,porquegeralmentetem coisasque são
tão preciosaspara você que você diz: ‘Que pena
queeuvouterque(cortar)...”
Para Maureen,é um reencontrocom sua tra-
jetória,epara os mais novos,uma possibilidade
deseaproximarde“pessoasmuitoespeciais,co-
mo OrlandoVillas-Bôas[1914-2002],DarcyRi-
beiro[1922-1997],BurleMarx[1909-1994],ofi-
lho do Che Guevara”. Maureencontoucom
apoiodo InstitutoMoreiraSalles—que com-
proupartede seu acervoem vídeo, o que possi-
bilitouo desenvolvimentoda pesquisa—eda
editoraVento Leste,de MonicaSchalka,que
bancouamaiorpartedapós-produção.
Retornareretrabalharo passadoé, para ela,
“literalmente,uma extensãode vida”, porquea
obrigaa trabalharcom horáriosrigorosos(oito
horaspor dia) e um editorcom quemacabou
criandocertafamiliaridade.“Temacertosemui-
tos desacertos,muitasbrigas,muitosencanta-
mentos.Mas tem que ter uma continuidadee
temquesaberquenãovaiserfácilacabar.”
A dificuldadenessefilmeeraimensa,a come-
çar pelosdiferentesmateriais:alémdas fotos,
havia imagensem VHS, super-VHS,miniDv, Su-
per-8,16mm,35mm.Mas omais difícil, diz, foi
lidarcomosagradecimentos,onde“vocêesque-PERFIL
MaureenBisilliat,a fotógrafa quetraduziuo Brasil
emimagens,revêsuatrajetóriaemexposiçãoe filme.
Por ThiagoB.Mendonça, para o Valor,deSãoPaulo
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