VOO LIVRE REVISTA LITERÁRIA - Nº 26

(MARINA MARINO) #1

Leitura com Mazé


A tristeza dele

O que no seu rosto me deu a
impressão de que ele estava triste,
angustiado? AimagemdeWhatsApp
é pequena, não tem a nitidez
desejada.Ablusadefrioésimpática,
azulcéu,bonédefrionacabeça,está
comendo...Oquenãomeimpediude
sentir uma angústia, asua angústia.
Não,nãoforamosralosfiosdebarba
e bigode aparentes, fora dos seus
hábitos,que me deuessaimpressão.
Entãooque?


A imagem se aproxima. Nos
falamos.Omesmojeitodebrincar,de
não incomodar pensando que a
comunicação poderia ter um custo
para mim. As mesmas questões
“como vai você e a família?”, “Aqui
tudobem...”ejáquerpassarabatata
quentepara frente.Seique nãoestá
bem, que o coração anda fraco, que
perdeuoapetite...eporconseguintea
vontade de viver? Tem medo da
morte nos seus 92 anos? Perdeuos
pais hámuito tempo. Os irmãose a
irmã jáse foram. Essa angústia que
sentiseriaomedodamorte?Eleque
nunca acreditou ou praticou uma
religião,comoresolveosseusmedos?


Continuo a pensar nele nesta
manhã saindo para a caminhada
matinale,hoje,aindamaiscedo,afim
deevitarafortetemperatura queas
previsõesprometemparaodia.Como
é que administra seus medos? Acha
que nunca soube,nunca pôde,como
muitosdesuageraçãoquetinhaque
cuidar de família numerosa, com
poucasposses,tertempodeveroseu
interior.Oitofilhos,dosquais,doisjá
partiram. Tememtornoda mesade
domingo dois deles e dois dos
inúmerosnetos.Osoutros?Longeou
cuidandodeseusafazeres.
Oaréfresco,umquasenadade
vento, sem o sol que ainda não
apareceuatrásdasnuvensquedevem
se desfazerem dentro de pouco
tempo, como ontem. Decido por um
caminho que não tenho o hábito. À
esquerdadaminharua,pegoalonga
avenidaquepodesomarumahorade
caminhada,idaevolta.
Avenida arborizada, prédios
altosquedestoamdoestilodacidade.
Seráquetemarvoresparagarantiro
oxigêniodecadamorador?Deveria
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