VOO LIVRE REVISTA LITERÁRIA - Nº 26

(MARINA MARINO) #1

Poesia


Esse poema ninguém me tira,
mepertence!Eaindamovidapelasua
intensidade, conecto com uma
analogia confessadaporOctavioPaz,
em OArcoe aLira :“opoema éum
caracol onde ressoa a música do
mundo,emétricaserimassãoapenas
correspondências, ecos da harmonia
universal”. E o Meio-Fio de Ferrari
está cheiodecaracóis!Estácheiode
refúgios, ninhos, conchas, cantinhos
para permanecer e se demorar em
cada um deles. Afinal são nestes
cantinhos da alma que a poesia
passeia,sedeleita,bebenafontedas
memórias perecíveis e imperecíveis
de nossas vivências, já que “nossa
alma é uma morada. E quando nos
lembramos das “casas”, dos
“aposentos”, aprendemos a “morar”
em nós mesmos” (BACHELARD,
1978 : 197 ).


Na segunda parte do livro,
Poemas de Meio-Fio , são dezoito
poemas que se anunciam
convidando-meparaolharoexterior,
o que está fora da minha casa
aconchegante. A voz lírica me
direcionaatodososlugaresea Lugar
nenhum
,ondeaprecio“Umbarcoà


deriva”, mas com endereço, não
importase“Umoceano/Umrio/Um
nome/ Um porto”, há um destino
certo. O problema é a mente, esta
máquina com capacidade infinita de
produzir pensamentos que, quando
“àderiva/Pormaisqueestejalúcida/
Perde-se em lugares sem endereço/
Sem nome/ Sem gente/ Sem
margem/Emsilêncio”,porqueacasa
está feita de corpo e de alma. Sem
este equilíbrio, seu mundo interior
torna-secaótico.Éprecisorevisitá-la,
emsuaverticalidade,topografarseus
escaninhos, seus delírios de alcova,
sótãoseporões;
énecessáriomostrarqueacasaé
um dos maiores poderes de
integraçãoparaospensamentos,as
lembrançaseossonhosdohomem.
Nessa integração, o princípio que
faz a ligação é o devaneio. O
passado,opresenteeofuturodãoà
casa dinamismos diferentes,
dinamismos que frequentemente
intervém, às vezes se opondo, às
vezesestimulando-seumaooutro.
A casa, navidado homem, afasta
contingências, multiplica seus
conselhosdecontinuidade.Semela,
o homem seria um ser disperso
(BACHELAR, 1978 : 201 ).
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