ELLE PT 53
algo menos ousado, mais ponderado e
- aleluia! – mais honesto. A especiali-
zação é valorizada em vez da exposição,
a credibilidade em vez da celebridade,
a verdade em vez da ficção.
«Percebi que houve uma mudança nas
duas últimas temporadas», disse -me um
conceituado diretor de moda. «Chegou
ao ponto em que tudo era completamente
ridículo, e nada espontâneo. Lembro -me
de ver alguém do lado de fora de um
show em Nova Iorque a usar um sutiã
durante uma tempestade de neve, e
pessoas deitadas no meio da estrada
para serem fotografadas. Agora, exis-
tem muito menos fotógrafos de street
style, porque se os editores deixaram de
participar nesse jogo, então, de repente,
há um número bem menor de pessoas
a serem fotografadas.»
Penny Martin, diretora da The Gentle-
woman, é um exemplo de alguém cujo
conhecimento profundo sobre o assun-
to, numa era de influenciadores, é mais
valioso do que nunca. O seu estilo au-
tenticamente discreto não é feito para as
luzes dos flashes das câmaras, mas para
ela. Emmanuelle Alt, da Vogue Paris,
ironicamente sempre se destacou graças
ao uniforme simples que usa (jeans pre-
tas e uma camisa branca meio dobrada).
O estilo destas pessoas é impressionante
pela sua honestidade.
Infelizmente, mentiras e desconfian-
ças envolveram esta década. Os políti-
cos mentiram -nos, a comunicação social
mentiu -nos (“É claro que manteremos
os seus dados pessoais seguros”) e fomos
inundados por histórias sobre golpistas,
como a falsa herdeira Anna Delvey e a fun-
dadora da Theranos, Elizabeth Holmes.
Mas com a exposição de todos estes vi-
garistas surge um público cada vez mais
desconfiado e hiper vigilante, que procura
algo mais real. O que significa que hoje
a coisa mais elegante que alguém pode
fazer é, simplesmente, ser honesto.
É empoderador admitir que foi preciso
fazer um trabalho complexo para chegar
a este ponto. Repare na história de vida
da editora da revista Bricks, Tori West,
que trabalhou como empregada de lim-
peza para complementar o seu salário
enquanto tentava ser escritora de moda.
As respostas dela foram tão sinceras que
pediu aos seus milhares de seguidores
que «compartilhem com o mundo os
trabalhos diários, ou algo que tenham
feito e não se orgulhem tanto hoje», usan-
do o hashtag #instagramtransparency.
«Vão ficar surpreendidos ao descobrirem
o quanto não estão sozinhos», escreveu.
«Ser mais honesta comigo mesma
permitiu -me ser mais transparente»,
explica West ao falar da decisão de con-
tar a verdade sobre a sua vida, em vez
de fingir que é o típico caso glamoroso
comummente associado à moda. «De-
pois de finalmente aceitar e aprender a
superar muitas dificuldades pessoais,
pensei que seria estranho ser uma versão
bem organizada de mim nas redes sociais.
Sentia -me desonesta. A transparência é
tão empoderadora quanto relacionável.»
As marcas estão a reagir ao nosso amor
renovado pela autenticidade, apresentan-
do anúncios menos polidos e mensagens
visuais próprias. A pioneiras como a Pata-
gonia e a Dove juntaram -se a Gucci, cuja
campanha de beleza apresentava dentes
imperfeitos, a Glossier, que na sua campa-
nha Body Hero adotou uma variedade de
formas corporais, e a empresa de lâminas
Billie, cuja campanha Project Body Hair
atraiu elogios nas redes sociais. Como uma
mulher escreveu no Twitter: «Agora, aos
30 anos, pela primeira vez na minha vida,
vi finalmente um anúncio de uma lâmina
de barbear em que as mulheres tinham
mesmo pelos no corpo.»
De volta à primeira fila, este abraçar
da honestidade teve o mesmo efeito que
um alfinete num balão. «A pressão de-
sapareceu», diz uma editora de moda.
«Posso voltar a usar jeans. E posso con-
centrar-me no que é suposto eu fazer:
escrever.» Quando até Alexa Chung
publica fotos suas de jeans e com uma
sweater com a legenda «Eu visto isto na
maior parte dosdias.Desculpemse dei
ideia do contrário»,percebemosqueas
coisas mudaram. L.C