O Estado de São Paulo (2020-03-20)

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B6 Economia SEXTA-FEIRA, 20 DE MARÇO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


Idiana Tomazelli
Adriana Fernandes
Amanda Pupo / BRASÍLIA


Os trabalhadores que tiverem
o salário e a jornada reduzi-
dos pelos empregadores, co-
mo medida de enfrentamento
aos impactos econômicos do
novo coronavírus, receberão
durante três meses uma com-
pensação do governo, que irá
de R$ 261,25 a R$ 381,22.

Essas cifras vão correspon-
der a 25% do seguro-desempre-
go a que o trabalhador teria di-
reito se fosse demitido. O valor
atual do seguro vai de R$ 1.045
(salário mínimo) até R$
1.524,89. O novo repasse só será
feito a trabalhadores que ga-
nham até dois salários mínimos
(R$ 2.090).
A nova medida foi anunciada
ontem pelo Ministério da Eco-
nomia, como parte do “progra-
ma antidesemprego” diante da
retração econômica esperada
com as medidas para enfrentar
a pandemia no País. A equipe
econômica também vai anteci-
par uma parcela de R$ 200 men-
sais para as pessoas com defi-
ciência que ainda esperam na fi-
la do INSS pela concessão defi-
nitiva do Benefício de Presta-
ção Continuada (BPC), voltado
à baixa renda.
No total, o pacote com inicia-
tivas para proteger os mais vul-
neráveis, preservar empregos e
combater a pandemia já soma
R$ 184,6 bilhões. Só a compensa-
ção para o trabalhador vai cus-
tar R$ 10 bilhões, com recursos
do Fundo de Amparo ao Traba-
lhador (FAT). A previsão é alcan-
çar até 11 milhões de pessoas.


Demissões. Apesar do meca-
nismo de proteção, o secretário
especial de Previdência e Traba-
lho, Bruno Bianco, disse que
não há qualquer impedimento a
demissões, caso as empresas en-
tendam que há essa necessida-
de. “Existem duas maneiras de
preservar emprego: a fórceps e
por estímulo. Não faria sentido
proibir demissões. Nós quebra-
ríamos as empresas”, disse.
Se isso ocorrer com um fun-
cionário que tenha recebido a
compensação, o valor da parce-
la do seguro-desemprego pode
sofrer algum abatimento devi-
do à antecipação do benefício.
“Vai depender do prazo de per-
manência dentro da empresa.
Se passar tempo suficiente para
reunir condições de elegibilida-
de, passa a ter parcelas nor-
mais”, afirmou.
No caso da antecipação do
BPC, a fila hoje acumula 470 mil
solicitações pendentes, a maior
parte delas de benefícios a pes-
soas com deficiência. O que o
governo vai fazer é conceder os
R$ 200 logo após a análise de ren-
da, antes mesmo da realização
das avaliações social e médica.
Depois, se o benefício for conce-
dido em definitivo, ele receberá
a diferença entre a antecipação
e o valor do benefício (R$ 1.045)
com correção. Caso o INSS inde-
fira o pedido, o segurado não pre-
cisará restituir nenhum valor
aos cofres públicos, uma vez
que ele recebeu de boa fé.
O INSS também vai bancar
os primeiros 15 dias de auxílio-
doença para trabalhadores que
precisarem se afastar de suas
funções devido à covid-19. Ge-
ralmente, esse primeiro perío-
do é bancado pela empresa. O
governo, porém, não divulgou
estimativas de quanto isso cus-
tará aos cofres públicos. O tem-
po de recebimento do auxílio-
doença dependerá do atestado
médico, que poderá ser entre-
gue por meio do aplicativo Meu
INSS e de forma online. Tudo
para evitar que os segurados
saiam de casa, o que ampliaria o
risco de contaminação em suas
regiões.

Camila Turtelli
Daniel Weterman / BRASÍLIA


Líderes do Congresso se movi-
mentam para ampliar as medi-
das de proteção ao emprego
anunciadas pela equipe econô-
mica dentro do plano anticoro-
navírus. Aumentar o vale de R$


200 para trabalhadores infor-
mais e autorizar funcionários a
anteciparem as férias são algu-
mas das demandas. O presiden-
te do Solidariedade, deputado
Paulinho da Força (SP), vai pro-
por elevar o benefício para R$


  1. O líder do DEM na Casa,
    Efraim Filho (PB), concorda em
    aumentar o valor, mas disse que
    ainda não há quantia definida.
    O senador Alessandro Vieira
    (Cidadania-SE) e os deputados
    Tábata Amaral (PDT-SP) e Feli-
    pe Rigoni (PSB-ES) encaminha-
    ram uma carta ao presidente
    Jair Bolsonaro pedindo para au-


mentar o “voucher” para R$ 300
mensais e ser pago por quatro
meses. Além disso, o trio de con-
gressistas solicitou a criação de
um benefício universal de R$
500 mensais a famílias de baixa
renda.
As medidas custariam R$ 74,7
bilhões ao governo federal, no
cálculo dos parlamentares. A
criação de uma linha de crédito
subsidiada a microempresas e
microempreendedores indivi-
duais, com no mínimo quatro
meses para pagamento da pri-
meira parcela, e a redução tem-
porária de requisitos exigidos

para autorizar a produção de ál-
cool em gel também fazem par-
te da demanda.
Outra medida defendida na
Câmara é a suspensão temporá-
ria dos contratos de trabalhos.

Empregados com salário de até
R$ 2 mil poderiam ser dispensa-
dos por três meses e ter direito a
receber o seguro-desemprego
pago pelo governo. O Centrão
também quer flexibilizar a con-
cessão do período de férias. “É
uma medida para se evitar que a
dispensa e o desemprego sejam
a primeira opção do emprega-
dor”, afirmou o líder do DEM na
Câmara.
O governo vai editar uma me-
dida provisória autorizando em-
presas a reduzir em até 50% a
jornada de trabalho e o salário
dos seus empregados. Paulinho

da Força, ligado à Força Sindi-
cal, afirmou que a negociação
precisa passar pelo sindicato.
“O que estamos percebendo é
que o governo quer jogar a crise
só em cima de trabalhadores e
empresas. Governo tem de gas-
tar dinheiro. Liberamos a meta
para isso”, disse o deputado, em
referência à aprovação do decre-
to de calamidade que permite
ao governo ampliar gastos até o
fim do ano. O pedido foi aprova-
do pela Câmara e deve ser avalia-
do hoje pelo Senado.
O líder do MDB no Senado,
Eduardo Braga (AM), opinou
que a redução de salários e jorna-
da deve ser negociada entre em-
presas e trabalhadores, e não
uma determinação automática.

Cristian Favaro


Diante da crise no setor aéreo
em meio a pandemia do corona-
vírus, as companhias aéreas bra-
sileiras iniciaram ontem uma
série de medidas para proteger
o seu caixa e evitar uma onda
maciça de demissões. Entre as
medidas estão o corte de jorna-
da – e, por consequência, de salá-
rio – de até 50% e licença não
remunerada.
A Gol anunciou que todos os
diretores, vice-presidentes e o
CEO terão uma redução sala-


rial de 40%, válida para os me-
ses de abril, maio e junho. Já a
jornada dos colaboradores in-
ternos e aeroviários será reduzi-
da em 35%, assim como as remu-
nerações e benefícios. A aérea
suspendeu todos os seus voos
internacionais de 23 de março a
30 de junho e cortou sua malha
doméstica entre 50% e 60%.
Na mesma direção, a Azul
anunciou uma série de medidas
para reduzir o custo fixo – que
representa cerca de 40% do to-
tal das despesas operacionais
da empresa. O plano de contin-
gência abre espaço para a licen-
ça não remunerada – com 600
pedidos aprovados até ontem –
e prevê a redução de salário de
25% dos membros do comitê
executivo até a normalização
da situação.
Já a Latam, em nota, afirmou

que está em negociação com os
sindicatos da classe e tem se es-
forçado para a manutenção dos
empregos. “Uma das propostas
apresentadas, por exemplo, é a
implementação da licença não
remunerada”. Confrontada, a
Latam não confirmou nem ne-
gou cortes na remuneração e

jornada dos funcionários. Docu-
mentos internos obtidos pelo
Estadão/Broadcast, entretanto,
mostram que o corte na remu-
neração total (considerando
também os benefícios) de to-
dos os colaboradores pode che-
gar a até 50% para os próximos
três meses. A proposta ainda de-

ve ser votada pelos sindicatos
das categorias.
A crise, entretanto, pode es-
tar apenas começando. Em ví-
deo interno aos funcionários, o
CEO da Latam Brasil, Jerome
Cadier, relembrou que a empre-
sa reduziu sua operação em pe-
lo menos 70% nos últimos me-

ses. “A gente tem países, como
Peru e Equador, aonde toda a
operação nossa parou, nos voos
domésticos e internacionais. A
gente também está se preparan-
do para um cenário parecido,
eventualmente, com isso aqui
no Brasil”, afirmou no vídeo.
Na outra ponta da cadeia, em-
presas prestadoras de serviço
em terra para companhias aé-
reas – chamadas de ground
handling – devem reduzir em
até 30% o efetivo total de traba-
lhadores no País. “A estimativa
é baseada na mão de obra obso-
leta que temos hoje. Nesse
meio teremos férias coletivas,
licença não remunerada e resci-
são contratual. Tenho 42 anos
de transporte aéreo. A gente
nunca passou por isso”, afir-
mou o presidente da Associa-
ção Brasileira das Empresas de
Serviços Auxiliares do Trans-
porte Aéreo (Abesata), Ricardo
Aparecido Miguel, em entrevis-
ta ao Broadcast.
O setor emprega diretamen-
te cerca de 40 mil pessoas em
todo o País.

PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


l Realidade


Pacote contra efeitos do coronavírus inclui pagamento de 25% do valor do seguro-desemprego em casos de redução de jornada e salários


l Cálculo

Parlamentares propõem mudanças a pacote do governo


ENTREVISTA

Douglas Gavras

Para o professor do Insper Sér-
gio Firpo, especialista em mer-
cado de trabalho, ficou eviden-
te que o governo subestimou
o tamanho do impacto da epi-
demia do novo coronavírus
no Brasil. A seguir, trechos da
entrevista ao Estado.

lA proposta do governo, de per-
mitir que as empresas reduzam
até 50% da jornada e dos salá-
rios sem negociação coletiva,
parece razoável?
Parece necessário, sem isso
não vai conseguir segurar o

emprego das pessoas. Em seto-
res que mais evidentemente
vão sentir a queda de deman-
da, como transporte aéreo,
hotelaria e turismo, é ainda
mais importante. Há uma
série de ocupações em que os
empregos só vão ser mantidos
se os trabalhadores tiverem
uma jornada menor. Sem isso,
muitos serão selecionados pa-
ra serem demitidos – e ainda
assim, haverá demissão.

lA alternativa de pagar seguro-
desemprego para quem tiver sa-
lário reduzido é acertada?
Sim. É como se o empregado

estivesse meio empregado e
meio desempregado. Se ele
trabalhava 40 horas por sema-
na e agora tem de trabalhar
20, não faz isso por opção. Ele
ficou desempregado por meta-
de da jornada. Receber o segu-
ro-desemprego para isso pare-
ce fazer todo o sentido, ao me-
nos como medida emergen-
cial.

lA equipe econômica reagiu
acertadamente, dado o tamanho
da crise?
No mínimo, o governo como
um todo agiu muito tardia-
mente. Ficou evidente que

eles não anteciparam o proble-
ma ou até negaram enquanto
podiam. Em diversas outras
áreas, o governo já mostrava
não estava à altura dos proble-
mas. Com o coronavírus isso
ficou evidente.

lO que foi feito até agora na eco-
nomia é suficiente?
Agora é economia de guerra.
Precisa ser evitado que o siste-
ma de preços não entre em
colapso. Se as fábricas fecha-
rem, como garantir que itens
essenciais sejam produzidos?
Esse levantamento não parece
ter sido feito. O governo deve
planificar o que precisa ser
produzido, garantir comida e
remédios para todos. E dar
subsídios a setores específi-
cos.

l Parada total

Aéreas cortam salários em até 50%


e propõem licença não remunerada


Mercado global vive dia de trégua e Bolsas fecham em alta. Pág. B7}


WERTHER SANTANA/ESTADÃO - 10/12/2015

Governo vai compensar corte de salário


“Existem duas maneiras
de preservar emprego: a
fórceps e por estímulo.
Não faria sentido proibir
demissões. Quebraríamos
as empresas.”
Bruno Bianco

SECRETÁRIO ESPECIAL DE
PREVIDÊNCIA E TRABALHO


R$ 74,7 bi
seria o custo total das
alterações que estão sendo
pensadas, segundo os
cálculos feitos pelos
líderes do Congresso

Ideia é aumentar os


benefícios, entre eles,


o aumento do ‘voucher’


para os trabalhadores


informais


Benefício. Se o trabalhador que receber a compensação for demitido, seguro-desemprego pode ter algum abatimento

Sérgio Firpo, professor do Insper

‘Agora é economia de guerra’


HÉLVIO ROMERO/ESTADÃO - 4/5/2018

Em terra. Prestadoras de serviços também são afetadas

Empresas reduziram até


60% dos voos das rotas


domésticas para tentar


enfrentar a crise causada


pelo coronavírus


“A gente tem países, como
Peru e Equador, onde toda
a operação nossa parou, nos
voos domésticos e
internacionais. A gente
também está se preparando
para um cenário parecido,
eventualmente, com isso
aqui no Brasil.”
Jerome Cadier
CEO DA LATAM BRASIL
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