- Que tal o meu filho dona Cidália?
junto dos alunos mais pequenos a aprender as letras, está um dia de vvvvvvvento e
eu gosto de vvvvvvento, a professora com um lápis espetado no cabelo grisalho - Há de ir
comigo, muito mais velho que os outros, tão consciente de ser preto, a ocupar
sozinho uma carteira minúscula, a desenhar letras tortas num caderno, a desenhar
números, a madrinha do rapaz ao meu lado para a dona Cidália - Não o pode mudar de carteira, e eu gosto do vvvvvvento, que ele tem medo do
preto?
pronta a empurrar-me com o, está um dia de vvvvvvento, guarda-chuva enquanto o
afilhado se lhe enrolava nas pernas escondendo a cara na barriga dela, à hora do almoço
comia sozinho a um canto com a colher, incapaz de segurar a sopa, a enrolar-se-me nos
dedos, a empregada do refeitório desconfiada de mim - É melhor ferver os talheres depois sei lá as doenças que ele tem
mulheres sem dentes serrados nem o peito de fora, nenhuns homens a fumarem em
silêncio sentados no chão, vinham fulanos à noite buscar mandioca e dar instruções
junto ao milho, o porco de amanhã no chiqueiro a fungar, a fungar, os pombos do Cardal
Florido davam voltas à aldeia, às vezes, com o vento do leste, sentia-se a lagoa, quer
dizer lodo, musgo ou eram os mortos do cemitério que falavam conosco, Sua Excelência
para mim - Quando os teus pais morrerem vende-se esta casa
a pensar no dinheiro como se alguém a comprasse, daqui a uns anos só tijolos e
fantasmas aqui, o do meu avô a caçar perdizes, o da cadela enterrado não sei onde, as
pedras da minha mãe amontoadas no jazigo com a frase - Não me dói nada
a respirar-lhe em cima, com a sua palavra - Amor
de que nos esquecemos, o médico a despedir-se de nós - Sinto muito
não de bata, igual à gente, um homenzinho qualquer, se morasse no nosso prédio
não reparávamos nele, encontrávamo-lo a tirar o correio da caixa, inclinado para diante
a separar papéis, um cumprimento vago e esquecia-nos, talvez a demorar-se um
bocadinho em mim por ser preto - Um preto
em certas alturas até a impressão que o meu pai - Um preto
e África toda de regresso nele, o alferes paraquedista, o outro sob a camioneta a
chorar, o inspetor da polícia política para o meu pai - Vai mesmo levá-lo?
e o meu pai sem as palavras porque ocupado a cortar mãos, cortar orelhas, deixando-
me sozinho embora haja momentos em que uma pessoa necessita de companhia
mesmo de um preto qualquer, alguém com quem se rale e de quem tente gostar, podia
tomar conta de si através de mim, há quantos anos a minha mãe não - Amor
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
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