- Levanta-te
- Veste-te
- Sai
e ficares esticado como um carapau, sem me veres, antes de sentado na borda da
cama, de cara escondida nas mãos, repetindo um - Sai
que eu, já nas escadas, escutava ainda, que eu, já na rua, escutava ainda, que na
camarata onde durmo, come isto também porco, não te esqueças de comer isto
também, continuava a escutar, um - Sai
que se ia tornando não de homem, de criança com medo, um - Sai
igual a - Não apaguem a luz
igual a - Ao menos deixem a lâmpada do corredor acesa
e um garoto de pijama a espreitar do colchão, todo inclinado para o corredor, de
mãos espalmadas no soalho, medroso das ameaças e dos perigos do escuro, as calaches,
as granadas, as metralhadoras ligeiras, um oficial não a ouvir - Amor
a ouvir - Filho
e ao dizer - Não fales que me distrais
a dizer - Mãe
sem reparar no meu mais depressa porco, mais depressa mesmo que te engasgues,
mesmo que morras com a comida atravessada, mais depressa agora sem reparar no
contentamento da mulher dos anéis - Dormir com oficial dá sorte
isto à entrada da pensão que me pareceu mais modesta, mais pequena, ainda menos
limpa do que quando lá entrei pela primeira vez, o balcão mais acanhado, uma planta
meio morta num vaso, a pingar folhas castanhas ou verdes junto ao caule e castanhas
depois, ou castanhas junto ao caule e negras no fim, uma fotografia de Luanda, torta,
na parede, com o vidro rachado, dois brancos velhos, de calções e chinelos a con, que
vontade de dizer - Amo-te
também, amo-te, versarem em cadeiras de vime, um deles com um adesivo no
cotovelo esquerdo, calaram-se a apreciar a mulher dos anéis, ao entrarmos, com essas
pupilas, que se tornam graduadas como réguas, dos homens, a cada cinco traços um
traço mais comprido, preto, a cada dez traços um traço ainda mais comprido, vermelho,
o meu pai para a minha mãe - Deves ter dado um jeito qualquer à espinha não te preocupes
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
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