sol começava a se pôr. Ele se lembrou do último ano de sua vida. Durante nove
meses completos, viveu na cabana de sua família, sozinho e isolado, do jeito que
quis. Sim, ele adotou uma rotina, que lhe permitiu se manter aquecido,
alimentado e limpo. Recolhia lenha, rachava-a e alimentava a lareira. Ia para a
cidade quando precisava de comida, materiais ou gás. Com a passagem dos
meses, desenvolveu uma agenda não escrita para cuidar de suas necessidades
básicas. No entanto, havia outra coisa dentro dele que precisava administrar. A
tentação de ver Becca nem sempre podia ser contida, e, quando essa vontade se
manifestava, Brad pegava a estrada.
Era bom escapar da cabana. Era terapêutico vê-la. Claro, ele sempre pretendeu
confrontá-la. Conversar com ela. Contudo, a visão de Becca sempre o refreou.
Em vez disso, ficava satisfeito simplesmente por fotografá-la, roubando a
imagem dela e mantendo-a para si. Tinha feito isso antes — de brincadeira, dizia
para si mesmo —, quando ela dormia em sua cama. Brad sempre pretendeu
compartilhar aquelas fotos com ela. Explicar como Becca parecia bonita quando
dormia. No entanto, Becca partiu seu coração antes que isso pudesse acontecer.
Becca também tinha uma rotina, Brad descobriu. Estudar na biblioteca era
uma delas. E ele sabia que, quando sua vontade se intensificava, podia se sentar
num banco do câmpus e esperar que ela pegasse o caminho que levava para a
biblioteca. As fotos obtidas nessas ocasiões eram fáceis de ser tiradas, pois ele
apenas se disfarçava como outro estudante. As imagens obtidas quando ela
entrava no prédio onde morava eram mais difíceis, pois tinha de tirá-las através
do para-brisa de sua caminhonete.
E certa noite, pouco tempo atrás, ele ficou muito perto, esperando por Becca
na esquina do prédio dela, oculto na escuridão... e quase criou coragem para sair
das sombras e abraçá-la. Talvez as coisas tivessem acabado de maneira diferente
se ele tivesse confortado Becca naquela noite fria. Brad quisera muito segurá-la
em seus braços quando ela voltou do consultório médico. Naquela ocasião, teve
certeza de que ela havia adoecido. E, nesse momento, pensar no quão
preocupado ficara por causa das frequentes visitas dela ao consultório... só para
descobrir que ela estava grávida. Pensou de novo na maneira repulsiva como
Becca jogou isso na sua cara.
Com o sol se pondo, o céu ia escurecendo, perdendo o tom azul-escuro. Era
irônico, Brad pensou, sentado na caminhonete, que um dia tão bonito terminasse
em escuridão. Contemplando o firmamento que perdia a cor, ele sabia que
ninguém o entenderia. Poderia explicar pelo que havia passado. Contar aos
policiais, aos seus pais ou aos psicólogos o que Becca lhe fizera. Revelar a
respeito da traição de Jack. As rejeições das faculdades de direito. Ele poderia
detalhar tudo, ponto por ponto, e, no entanto, ninguém o entenderia.
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
#1