O Estado de São Paulo (2020-04-01)

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O ESTADO DE S. PAULO QUARTA-FEIRA, 1 DE ABRIL DE 2020 Metrópole A


José Maria Tomazela


SOROCABA


A


maior concentração


de casos de coronaví-


rus na capital está le-


vando muitos paulistanos a


se refugiar em cidades do in-


terior e do litoral paulista pa-


ra cumprir a quarentena reco-


mendada pelas autoridades.


Em partes do litoral e regiões


distantes do interior a circu-


lação do vírus ainda é menor,


conforme números oficiais.


As famílias que estão fugindo


de São Paulo relatam mais facili-


dade para ficarem isoladas, me-


nor risco de contágio e o alívio


psicológico proporcionado pe-


lo contato com a natureza.


Atento às recomendações do


Ministério da Saúde sobre o iso-


lamento social contra o corona-


vírus, o advogado paulistano Da-


rio Orlandelli, de 81 anos, optou


por unir o necessário ao agradá-


vel. Dono de um rancho de pes-


ca em Pirassununga, cidade do


interior onde mora uma de suas


filhas, ele deixou a capital há


dez dias, na companhia da mu-


lher, e passa as horas fazendo o


que mais gosta. “Fico pescando


no Rio Mogi-Guaçu, sem ser in-


fluenciado pelo noticiário. Pe-


go uns peixinhos e solto. É uma


terapia e, ao mesmo tempo,


uma proteção, pois aqui é bem


isolado. A gente tem de se cui-


dar, mas não pode morrer de té-


dio.”


Dario e a mulher moram em


um apartamento, no bairro da


Lapa, zona oeste da capital pau-


lista, que está fechado. “Sem po-


der sair, a gente ficava a maior


parte do tempo na TV vendo no-


tícias pouco agradáveis. Agora,


estamos bem resguardados,


com o emocional mais leve e va-


mos ficar ( no interior ) o tempo


que for necessário.”


O empresário Nemer Ibra-


him Chiah, de 44 anos, e sua mu-


lher, a cirurgiã dentista Maison


Ghandour, de 40, deixaram a ca-


pital há duas semanas e foram


para a quarentena, com os fi-


lhos, Ibrahim, de 8 anos, e Hay-


fa, de 5, na casa de veraneio da


família em Ilhabela, litoral nor-


te de São Paulo. “Costumo vir


para a ilha de 15 em 15 dias para


passar o fim de semana. Desta


vez, antes de começarem os blo-


queios, já vim com a família e


pretendo voltar só quando aca-


bar essa quarentena.”


“Minha casa fica distante


do centro, na costa sul da


ilha, e saímos o mínimo possí-


vel. A gente acorda, procura


fazer alguma atividade física,


caminha um pouco onde não


tem gente e, no mais, é ficar


em família.” Em quase 15


dias, ele saiu de casa duas ve-


zes. “Estamos tranquilos, re-


zando para que dê tudo certo


e isso passe logo.”


O artista plástico André


Balbi, que mora em Moema,


buscou refúgio com a mu-


lher, a enteada e uma filha


nas montanhas de São Fran-


cisco Xavier, na Serra da Man-


tiqueira, onde há 25 anos


mantém um ateliê. “Minha


base é em São Paulo, onde


meus filhos estudam, mas


com essa história toda decidi-


mos nos isolar no interior,


tentando nos proteger.”


Renata Okumura


Roberta Jansen / RIO


A professora aposentada There-


zinha Pontes, de 84 anos, vem


perdendo o sono há duas sema-


nas. E não só pelo temor com a


epidemia de covid-19. O remé-


dio que costuma tomar todas as


noites para adormecer acabou.


Em meio às medidas de distan-


ciamento social, ela não conse-


gue uma receita azul para repor


o estoque. “Tomo esse remédio


há dois anos e estou sem poder


comprar”, explicou. “Tenho a


receita original, mas não a azul,


e as farmácias não aceitam.


Meu médico não está atenden-


do, disse que está sem receitas


em casa e não tem como sair.


Não sei o que fazer.”


Situação semelhante é en-


frentada pela aposentada Maria


Coeli Pontes, de 80 anos, que


faz tratamento com antidepres-


sivos. “Tomo esse remédio há


20 anos, não posso parar de to-


mar agora, ainda mais num mo-


mento desses”, afirmou. “Ten-


to ligar para a minha médica,


mas ninguém atende no consul-


tório; mandei WhatsApp para a


secretária, e ela também não res-


pondeu. Liguei para o plano de


saúde, e eles dizem que tenho


de procurar outro médico. Mas


não é para ficar em casa?”


O caso delas é recorrente nes-


te momento em que o avanço


do coronavírus traz uma preo-


cupação a mais aos idosos com


doenças crônicas, que preci-


sam de receitas controladas pa-


ra comprar medicamentos de


uso contínuo. Normalmente,


esse tipo de remédio somente é


vendido ao paciente, no máxi-


mo, até 30 dias após a emissão


da receita médica e uma de suas


vias fica retida nas farmácias.


No entanto, diante do confina-


mento e cancelamento tempo-


rário de consultas, entidades de-


fendem a adoção de medidas


que facilitem a compra dos re-


médios. A situação se agrava no


caso dos idosos, que devem evi-


tar sair às ruas.


Opções. Uma alternativa é en-


trar em contato com o médico.


“O paciente atualmente está so-


licitando a receita ao seu médi-


co, que tem enviado pelo cor-


reio, motoboy ou pedido a reti-


rada do documento por pessoa


próxima. Tem sido uma prática


comum”, disse Carlos André


Uehara, presidente da Socieda-


de Brasileira de Geriatria e Ge-


rontologia (SBGG).


Outra saída é procurar atendi-


mento médico a distância. “Du-


rante a pandemia, o idoso pode


fazer atendimento por teleme-


dicina. Se o médico se sentir à


vontade, pode prescrever a re-


ceita e combinar uma forma de


entrega. No entanto, em mui-


tos casos, a prescrição da recei-


ta depende de uma primeira


consulta presencial para que o


médico possa conhecer o pa-


ciente. É importante ainda bus-


car informação nos conselhos


de Medicina para verificar se o


responsável está devidamente


cadastrado”, afirmou Uehara.


O presidente do Conselho


Regional de Medicina, Sylvio


Provenzano, disse que está


ciente das dificuldades dos pa-


cientes. Segundo ele, os pró-


prios médicos têm dificuldade


para conseguir novos receituá-


rios, uma vez que as gráficas


estão fechadas. “É um contras-


senso fazer com que essas pes-


soas se desloquem para conse-


guir uma receita”, diz. “Mas a


partir desta quarta, em nosso


site, vamos ofertar a receita


branca assinada digitalmente


pelo médico. No máximo até


quinta-feira, teremos a receita


azul também.”


Julia Lindner


Mateus Vargas / BRASÍLIA


O presidente Jair Bolsonaro


afirmou ontem que houve


um acordo com a indústria


farmacêutica para a suspen-


são de reajustes nos preços


de medicamentos em todo o


País por dois meses. O anún-


cio foi feito pelo Facebook,


após reunião de Bolsonaro


com ministros, no Palácio do


Planalto.


“Em comum acordo com a in-


dústria farmacêutica decidi-


mos adiar, por 60 dias, o reajus-


te de todos os medicamentos


no Brasil”, escreveu o presiden-


te na rede social. No entanto,


não houve unanimidade entre


associações da indústria para


adiar o reajuste. O Estado apu-


rou que algumas das principais


entidades sequer foram chama-


das para a negociação.


O Sindicato da Indústria de


Produtos Farmacêuticos (Sin-


dusfarma) informou à reporta-


gem que está entre as entidades


que não foi convidada. A asso-


ciação diz aguardar mais infor-


mações sobre o acordo. Tam-


bém foram surpreendidos pelo


anúncio de Bolsonaro integran-


tes do Ministério da Saúde que


participavam das discussões


nas últimas semanas.


Na semana passada, a ideia


do governo era editar uma medi-


da provisória (MP) para adiar


apenas o reajuste dos medica-


mentos que poderiam ser usa-


dos em pacientes com o novo


coronavírus. A medida atingiria


medicamentos que contêm seis


substâncias, entre elas produ-


tos à base de cloroquina, que es-


tão sendo testados em pacien-


tes graves da covid-19. Técni-


cos da saúde chegaram a enviar


o texto da MP ao Planalto.


O Sindusfarma havia calcula-


do que o ajuste de preços de me-


dicamentos em 2020 seria de,


no máximo, 4,08%. Para esta


conta, são usados dados como o


Índice de Preços ao Consumi-


dor Aplicado (IPCA) e a produti-


vidade do setor farmacêutico.


O ajuste anual é definido pela


Câmara de Regulação de Merca-


do de Medicamentos (CMED)


e costuma passar a valer a partir


de 1.º de abril. O governo ainda


não informou de que forma fará


o adiamento do ajuste, mas a ex-


pectativa da indústria é que seja


editada uma MP.


O preço de diversos medica-


mentos no Brasil é tabelado. Há


diferenças de valores para com-


pras públicas e do setor priva-


do. Muitos medicamentos isen-


tos de prescrição, ou seja, que


não exigem receita médico, têm


os preços liberados dessa regu-


lação.


Projeto de Lei. No Senado Fe-


deral, já tramitava um projeto


para adiar o reajuste de medica-


mentos. De iniciativa do sena-


dor Randolfe Rodrigues (Rede-


AP), o PL 881/2020 prevê conge-


lar os preços pelo tempo que du-


rar a pandemia do coronavírus.


PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


lO Senado aprovou ontem proje-


to autorizando o uso da telemedi-


cina durante a pandemia de co-


vid-19 no Brasil. Com isso, médi-


cos poderão realizar consultas a


distância enquanto durar a crise.


Os profissionais poderão tam-


bém emitir receitas médicas pela


internet. O formato não é autoriza-


do para profissionais de outras


áreas da saúde, como enfermei-


ros. O projeto já passou pela Câ-


mara e agora depende apenas de


sanção de Jair Bolsonaro.


A proposta foi aprovada em


sessão remota do Senado, em-


que também se aprovou livrar


trabalhadores de apresentar um


atestado médico para comprova-


ção de doença. Esse texto tam-


bém seguirá para sanção.


O Senado aprovou ainda um


projeto que suspende por 120


dias a obrigação de hospitais e


outras entidades de cumprir me-


tas do (SUS), incluindo exames


não emergenciais e cirurgias ele-


tivas. / DANIEL WETERMAN


INTERIOR E LITORAL


VIRAM REFÚGIOS


WILLIAN MOREIRA/FUTURA PRESS–27/3/

Sem sair de casa, idosos têm dificuldade para obter remédio


Norma altera


prescrição


Indústria só supre até 70% dos respiradores necessários. Pág. A12 }


Congresso dá aval


temporário para a


telemedicina


ARQUIVO PESSOAL

Na praia. Chiah, a mulher e os filhos foram para Ilhabela


Quarentena


Paulistanos buscam unir o necessário ao agradável


Envio de receita pelos


Correios e atendimento


médico a distância


são alternativas para


evitar o problema


Mudança. Resolução da Anvisa de 24 de março altera temporariamente as regras para a prescrição e a dispensação de medicamentos controlados


1.


É possível aumentar a


quantidade de medica-


mento prescrita?


Resolução da Anvisa de 24


de março altera temporaria-


mente as regras para prescri-


ção e dispensação de medi-


camentos controlados. A


resolução inclui o aumento


da quantidade permitida em


receita de controle especial


emitida antes da data de en-


trada em vigor da norma,


mas dentro do prazo de vali-


dade, para mais 30 dias de


tratamento, além do que foi


prescrito. Se a data de emis-


são da receita for a partir de


24 de março, será permitido


comprar remédio para trata-


mento entre três e seis me-


ses, dependendo do tipo de


medicamento.


2.


E a entrega de remédio


controlado em casa?


Temporariamente também


está permitida. A pessoa pre-


cisa ligar para a farmácia e


verificar se há a possibilida-


de de fazer o cadastro e soli-


citar a retirada da receita


controlada, no momento da


entrega do medicamento


em casa.


3.


E as receitas que estão


vencidas?


Algumas redes de saúde pú-


blica já estão aceitando re-


ceitas vencidas, mas as far-


mácias particulares ainda


aguardam decisão. Vale lem-


brar que no caso da receita


ter vencido há muito tempo


ou o paciente não tê-la, deve-


rá entrar em contato com


seu médico ou outro creden-


ciado para solicitar guia


atualizada.


PERGUNTAS &


RESPOSTAS


Reajuste dos


remédios é adiado


por 60 dias


Presidente Bolsonaro disse que houve um acordo com a indústria


farmacêutica; aumento ficaria em torno de 4% e já vigoraria hoje

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