O Estado de São Paulo (2020-04-05)

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O ESTADO DE S. PAULO DOMINGO, 5 DE ABRIL DE 2020 Especial H5


PERGUNTAS & RESPOSTAS


Giovanna Wolf
Renato Vieira


Nas últimas semanas, com o
avanço do novo coronavírus, ca-
nais de YouTube infantis passa-
ram a produzir conteúdos so-
bre o tema para crianças, como
vídeos ensinando a lavar as
mãos, detalhes sobre a rotina
no confinamento e dicas de co-
mo brincar na quarentena. A re-
percussão está grande: um ví-
deo do canal Planeta das Gê-
meas, por exemplo, em que as
meninas tomam a vacina da gri-
pe e conversam com a família
sobre prevenções contra o coro-
navírus, teve 3 milhões de visua-
lizações em duas semanas.
As gêmeas cariocas Melissa
e Nicole, de 12 anos, têm quase
13 milhões de inscritos no ca-
nal. Além de mostrar a vacina,
as garotas também gravaram
um vídeo contando como está
a rotina durante o confinamen-
to, em que elas aparecem jogan-


do um pouco no computador,
vendo filmes, jogando pingue-
pongue e também comendo
fondue de queijo no jantar.
“Tem sido bem tranquilo. Te-
mos aulas online, gravamos ví-
deos, e estamos aproveitando
também para passar um tempo
com a família”, contam as gê-
meas sobre o confinamento,
em entrevista ao Estado.
Ao longo da quarentena, o ca-
nal Planeta das Gêmeas quer
continuar fazendo vídeos para
entreter e divertir seus inscri-
tos. “Achamos legal mostrar pa-
ra eles que estamos todos pas-
sando pela mesma situação”,
afirmam Melissa e Nicole.
O canal Clubinho da Laura,
que tem mais de 8 milhões de
inscritos, quer ajudar as pes-
soas nessa época de confina-
mento com dicas de brincadei-
ras. As irmãs Laura, de 7 anos, e
Helena, de 4, já gravaram um ví-
deo montando um acampamen-
to em família na sala de casa du-

rante a quarentena. “Além das
crianças, nosso público envolve
muitos pais que assistem aos ví-
deos junto com os filhos. Quere-
mos dar ideias de brincadeiras
para lidar com esse momento
de dificuldade de forma mais
suave”, afirma Jéssica Godar,
mãe das meninas.
A quarentena da Laurinha e
da Helena está cheia de ativida-
des, conta a mãe. “Fazemos bo-
lo juntas, curtimos uma sessão
de cinema à noite e até já mon-
tamos uma piscina inflável. Es-
tamos tentando manter uma
rotina, com atividades lúdi-
cas”, diz. Nesta última semana,
entretanto, Laurinha sentiu
mais falta da vida normal: foi
seu aniversário de 7 anos, e as
comemorações foram dentro
de casa com a família, e por vi-
deoconferências com amigos.
“Os avós dela vieram em casa
dar parabéns, mas a Laurinha
não pôde abraçá-los. Ela ficou
bem triste”, diz Jéssica.

Proteção para as crianças. Os
irmãos Maria Clara, de 8 anos, e
JP, de 11, têm um canal no You-
Tube com o nome deles. Um ví-
deo intitulado Regras de Condu-
ta para Adultos e Crianças Na
Quarentena já contabiliza mais
de três milhões de visualiza-
ções. “Nesse vídeo, tivemos a
intenção de alertar o público
em geral, crianças, adultos e ido-
sos. Teve uma boa aceitação, re-
cebemos muitos elogios”, afir-
mam os irmãos, que estão mo-
rando em Orlando (EUA).
Já a gaúcha Mileninha, de 13
anos, que no canal do YouTube
é seguida por mais de seis mi-
lhões de usuários, postou há
duas semanas um vídeo em
que ensina as crianças a lava-
rem as mãos para se proteger
do novo coronavírus. “As crian-
ças precisam saber como se
proteger do vírus”, afirma Ma-
ria Helena Stepanienco, de 44
anos, mãe da youtuber, que
também é cantora.

1. Como gerenciar o tempo
que crianças e adolescentes
passam online?

É importante que eles tenham
uma rotina de uso da internet,
ainda mais na quarentena, ex-
plica a professora de Psicolo-
gia da PUC Fabiola Freire. “Es-
tabeleça um limite de horas
de uso e se o acesso vai ser
de manhã, à tarde, ou à noi-
te”, diz. É preciso equilí-
brio, e metas possíveis de se-
rem cumpridas. “Deve-se
aproveitar o lado bom tam-
bém”, afirma Marlene Isepi,
diretora da Escola de Aplica-
ção da Faculdade de Educação
da USP.
2. Os pais devem fiscalizar
mais os filhos na internet?

“Essa é uma oportunidade pa-
ra estreitar laços familiares e
com isso entrar mais na rotina
deles sem ser muito invasivo”,
diz Angela Donato Oliva, pro-
fessora do Instituto de Psi-
cologia da Universidade Es-
tadual do Rio de Janeiro
(Uerj). É também um momen-
to oportuno para conhecer
melhor os filhos: “Por que não
se aproximar da criança e as-
sistir a um desenho ou jogar
um jogo?”, indaga a professo-
ra Fabiola Freire.
3. Quais tipos de controle se
pode fazer?

Os pais têm algumas opções:
conversar sempre sobre o uso
de internet com os filhos, ins-
talar programas para ter aces-
so às atividades online dos
adolescentes, bloquear alguns
tipos de conteúdo nos apare-
lhos tecnológicos e também
se aproximar para usar a inter-
net junto com os filhos. Entre-
tanto, essas medidas precisam
ser acompanhadas de diálogo.
“Os filhos precisam entender
o motivo do controle, em vez
de ser um bloqueio”, afirma
Maria Elizabeth Almeida, pro-
fessora da Faculdade de Edu-
cação da PUC-SP.
4. É razoável pedir senhas?
Esse é um ponto de divergên-
cia entre os especialistas ouvi-
dos pelo Estado. Para a pro-
fessora de Psicologia da PUC-
SP Fabiola Freire, ter as se-
nhas dos filhos pode ser um
caminho, desde que seja com-
binado com a criança ou o ado-
lescente. Por outro lado, a pro-
fessora do Instituto de Psico-
logia da UERJ Angela Donato
Oliva acredita que, quando os
pais chegam ao ponto de pe-
dir senhas, algo falhou na tra-
jetória desse relacionamento.
“Construir uma relação na


base da confiança é sempre
melhor.”

5. Como conversar com os
pré-adolescentes e adoles-
centes sobre o tema?

A principal orientação para os
pais aqui é escutar os adoles-
centes. “É preciso estabelecer
uma relação de empatia. Mui-
tas vezes os pais esquecem
que eles já foram adolescentes
também”, orienta Fabiola Frei-
re, professora da PUC-SP. Os
pais também precisam falar
para os filhos mais velhos so-
bre os riscos graves do uso ex-
cessivo da internet, como da-
nos à visão e problemas psico-
lógicos.
6. Como fugir dos golpes?
Especialistas concordam que
é fundamental que aparelhos
tecnológicos de crianças e
adolescentes tenham uma
proteção antivírus, para blo-
quear a instalação de progra-
mas maliciosos. Fabio Assoli-
ni, analista da empresa de ci-
bersegurança Kaspersky no
Brasil, recomenda que os ado-
lescentes tenham seus pró-
prios dispositivos.
7. Dá para melhorar a priva-
cidade?

Os jovens precisam ser orien-
tados a não divulgar suas vi-
das amplamente nas redes
sociais, orienta João Cesar
Netto, professor do Instituto


de Informática da UFRGS.
Para Emilio Simoni, da star-
tup PSafe, deve-se evitar
publicações na internet
que mostrem a rotina da
casa. É possível usar ainda
um recurso tecnológico
chamado autenticação de
dois fatores, que acres-
centa segurança no pro-
cesso de login da conta.

8. Como garantir proteção
aos perigos na inter-
net?

Rafael Santos, do curso
de Defesa Cibernética
da Faculdade de Informática
e Administração Paulista
(FIAP), diz que é preciso fa-
zer com que eles desconfiem
de e-mails e mensagens, por-
que podem ser golpes. “É im-
portante também ensinar a
não adicionar usuários estra-
nhos nas redes”, diz.
9. É hora de menos internet
e mais livros, por exemplo?

“Aproveitem o tempo de ou-
tra forma que não seja apenas
a conexão à internet”, afirma
Marlene Isepi, diretora da Es-
cola de Aplicação da USP.
Uma alternativa nesse senti-
do é a leitura. Na visão de Fa-
biola Freire, da PUC-SP, a
quarentena pode ser uma
oportunidade para fazer com
que os jovens se interessem
mais por livros.
10. Como equilibrar conteú-
dos educativos e diversão?

Marlene Isepi, diretora da Es-
cola de Aplicação da Faculda-
de de Educação da USP, refor-
ça que há muito conteúdo edu-
cativo no mundo digital, inclu-
sive em plataformas que as
crianças costumam acessar,
como o YouTube. “Se seu fi-
lho gosta de dinossauros, pes-


quise com ele so-
bre isso. Se ele gos-
ta de instrumentos
musicais, procure
alguma atividade
voltada à música”,
orienta. Uma dica
de especialistas é
sugerir horários
fixos para diver-
são na internet.

11. É apropriado
usar ferramen-
tas de controle
parental?

Esses recursos permitem o
controle do horário que a
criança ou o adolescente passa
na frente das telas, o bloqueio
de conteúdos inapropriados, o
acompanhamento do históri-
co online do filho. Cabe aos
pais filtrar os conteúdos e esta-
belecer regras que não sejam
extremas, diz João Cesar Net-
to, da UFRGS.
12. Como usar esses recur-
sos?

As ferramentas mais comuns
são um software que pode ser
instalado em diversos disposi-
tivos e roteadores de internet
que conseguem fazer a filtra-
gem. “Antes de instalar o siste-
ma de controle parental, pes-
quisem na internet o nome da


empresa, para checar se é
segura”, orienta João Cesar
Netto, da UFRGS.

13. Qual
impac-
to de
exces-
so de

jogos
online?

“Não é
recomen-
dado que
crianças
e adoles-
centes fi-
quem presos
aos jogos, comen-
do besteira e com
postura errada”, diz
André Pase, professor de
Comunicação Digital da PUC-
RS. A professora do Instituto
de Psicologia da UERJ, Angela
Donato Oliva, diz que a depen-
dência de games pode ter
vários efeitos: “Sintomas de
abstinência quando ficam
um tempo sem jogar,
perda de interesse
por atividades so-
ciais ou por ou-
tros tipos de
entreteni-
mento”,
alerta.


14.
Existem jogos que são mais
saudáveis que outros?
Para André Pase, da PUC-RS,
jogar pode ser uma oportunida-
de de gastar a energia da mole-
cada dentro de casa: “Jogos
que exigem exercícios, como o
Just Dance, são boas opções”,
afirma. Ele indica ainda clássi-
cos como Mario e Sonic, que
não têm muitos perigos.

15. E o que muda nas redes?
Para Rafael Santos, coordena-
dor do curso de Defesa Ciber-
nética da Faculdade de Infor-
mática e Administração Paulis-
ta (FIAP), “as redes sociais são
plataformas positivas que
aproximam as pessoas”. “Mas,
infelizmente, usuários ruins
vão se aproveitar do momento
para práticas maliciosas”, afir-
ma. Além disso, Fabio Assoli-
ni, analista da empresa de ci-
bersegurança Kaspersky no
Brasil, alerta que o confina-
mento deve impulsionar a dis-
seminação de fake news em
plataformas digitais.
16. É recomendado que haja
interação nas redes, com
fotos e publicações?

O uso de redes sociais neste
momento por crianças e ado-
lescentes pode ser positivo,


desde que haja acompanha-
mento e limites, explica a pro-
fessora de Psicologia da PUC-
SP Fabiola Freire. “Os jovens
precisam de tempo com a fa-
mília e com eles mesmos. É
preciso aprender a lidar com
o tédio e a solidão, e esse exer-
cício tem sido esquecido”,
afirma.

17. Devo usar minhas contas
próprias em redes sociais
para fiscalizar o que meu
filho faz?

Essa é uma prática comum de
pais e, para a professora do Ins-
tituto de Psicologia da Uerj An-
gela Donato Oliva, não é ideal,
mas compreensível. “Se eles
usarem essas informações de
maneira cuidadosa nas conver-
sas, pode ser uma estratégia de
aproximação. No entanto, se
confrontarem os filhos e a
prática tiver um tom de vigília,
o efeito pode ser o oposto, afas-
tando ainda mais os adolescen-
tes”, afirma.
18. Como conscientizá-los
sobre os perigos da desinfor-
mação?

“Os pais devem ensinar seus
filhos a sempre desconfiar de
informações recebidas e che-
car as notícias em fontes con-
fiáveis. É importante também
conversar para entender se
compartilham conteúdo fal-
so”, diz Maria Elizabeth Almei-
da, professora da PUC-SP.
19. Qual a melhor maneira
de os adolescentes aprovei-
tarem a internet de forma
positiva?

Na visão de Fabio Assolini,
analista da empresa de ciber-
segurança Kaspersky no Bra-
sil, é um momento para apren-
der coisas novas usando a tec-
nologia. “Há uma variedade
de material incrível no mun-
do digital. É hora de, por
exemplo, aprender um idio-
ma ou tocar um instrumento
musical.”


Meninos e meninas ensinam brincadeiras para passar o tempo em casa e ações de prevenção ao novo coronavírus


Gêmeas.
Melissa e
Nicole, de
12 anos,
aproveitam
dias em
família

CAMILA JAKUBOVIC/ACERVO PESSOAL

FALA, CRIANÇA


DICAS DE YOUTUBERS


Filhos em casa*


FONTES
lDA FACULDADE DE EDUCAÇÃO DA USP MARLENE ISEPI, DIRETORA DA ESCOLA DE APLICAÇÃO
l FABIOLA FREIRE, PROFESSORA DE PSICOLOGIA DA
PUC-SP
lDE PSICOLOGIA DA UERJ ÂNGELA DONATO OLIVA, PROFESSORA DO INSTITUTO
l MARIA ELIZABETH ALMEIDA, PROFESSORA DA FACULDA-
DE DE EDUCAÇÃO DA PUC-SP
lGURANÇA KASPERSKY NO BRASIL FÁBIO ASSOLINI, ANALISTA DA EMPRESA DE CIBERSE-
l RAFAEL SANTOS, COORDENADOR DO CURSO DE DEFESA
CIBERNÉTICA DA FACULDADE DE INFORMÁTICA E ADMI-NISTRAÇÃO PAULISTA (FIAP)
lINFORMÁTICA DA UFRGS JOÃO CESAR NETTO, PROFESSOR DO INSTITUTO DE
l EMILIO SIMONI, DIRETOR DO LABORATÓRIO ESPECIA-
LIZADO EM SEGURANÇA DIGITAL DA STARTUP PSAFE
lDA PUC-RS ANDRÉ PASE, PROFESSOR DE COMUNICAÇÃO DIGITAL
l FRANCISCO TUPY, PROFESSOR DE TECNOLOGIA EDUCA-
CIONAL

ILUSTRAÇÃO MARCOS MÜLLER/ESTADÃO

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