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A10 Metrópole QUARTA-FEIRA, 8 DE ABRIL DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO
Caio Sartori / RIO
Apesar de a terça-feira ter mar-
cado o início de novos horários
de funcionamento para indús-
tria e comércio autorizado, co-
mo supermercados, determina-
do pelo prefeito Marcelo Crivel-
la (Republicanos), as ruas do
Rio estavam visivelmente mais
movimentadas ontem – fenô-
meno que já vem sendo observa-
do a cada dia. Passageiros fo-
ram vistos viajando em pé nos
ônibus, o que viola as regras da
quarentena. Houve ainda aglo-
merações nas estações do BRT,
cujos veículos só estão autoriza-
dos a sair com os passageiros
sentados. A nova determinação
do prefeito impõe que o setor
industrial comece os turnos an-
tes das 6 horas, e o comércio, a
partir das 9 horas.
Os últimos dois dias também
foram de filas nas agências ban-
cárias, onde muita gente se
amontoou para retirar dinheiro
de salários a aposentadorias.
Elas se estendiam até as ruas e
compunham um cenário de pe-
quenas aglomerações pela cida-
de. Em Copacabana, bairro da
zona sul conhecido pela forte
presença de idosos, o Estado
viu cenas como essa em pelo me-
nos três bancos na manhã desta
terça-feira. Na calçadas junto às
agências, muita gente de cabeça
branca – e sem máscara.
As ruas do bairro também
aparentam estar mais movi-
mentadas, principalmente de
carros. O trânsito livre dos pri-
meiros dias de isolamento, que
transformava os sinais em me-
ra formalidade, já começa a ser
ocupado por grupos maiores
de veículos.
Segundo um levantamento
da CyberLabs, a semana passa-
da já tinha um aumento de circu-
lação na cidade, em compara-
ção com a semana anterior. No
fim de semana de sol, muitas
pessoas foram vistas passean-
do na orla da capital fluminen-
se, o que já criou preocupação
no gabinete de crise do governo
estadual. Ontem, o secretário
de Saúde, Edmar Santos, afir-
mou que, apesar de a curva de
casos estar perto do ideal, ainda
não é hora de voltar às ruas.
Flexibilização. O governo de
Wilson Witzel (PSC) anunciou
ontem medidas que flexibili-
zam o isolamento social no inte-
rior do Estado. Em 28 municí-
pios que não apresentaram ain-
da casos confirmados do novo
coronavírus, o comércio pode-
rá ser reaberto, se os prefeitos
optarem por fazê-lo. A ideia é
dar “fôlego econômico” a essas
pequenas cidades, segundo o
governador.
A iniciativa é controversa, da-
do que, como ainda não há testa-
gem em massa, a chance de sub-
notificação nesses locais é gran-
de. Em âmbito estadual, o gover-
nador adotou uma medida que,
segundo ele, não representa
uma flexibilização do isolamen-
to: permitiu que o comércio pas-
se a atuar por meio de delivery,
o que já estava liberado apenas
para restaurantes.
Ao afirmar que não estava
“flexibilizando nada”, o gover-
nador mostrou insatisfação
com a presença de pessoas na
rua durante o fim de semana.
Afirmou que vai conversar com
a Assembleia Legislativa (Alerj)
sobre uma proposta para apli-
car multas a cidadãos que este-
jam fora de casa sem ser para
cumprir funções essenciais. O
Estado confirmou nesta terça
mais 18 mortes. Agora são, ao
todo, 89 óbitos, em meio a 1.
casos confirmados.
Pablo Pereira
A operação de guerra montada
no Hospital das Clínicas de São
Paulo para enfrentar a crise da
covid-19 será intensificada a
partir amanhã. Uma parceria
do HC com a iniciativa privada
deve garantir o funcionamento
do esquema emergencial mon-
tado no Instituto Central do
HC, com reforço de 900 leitos,
para atendimento a pacientes
com a covid-19. Um grupo de
empresas, reunidas pelo banco
BTG Pactual num projeto de in-
vestimento social, vai pagar o
serviço de 140 anestesistas para
viabilizar o funcionamento do
novo complexo preparado na
semana passada contra o novo
coronavírus. O investimento
no projeto social emergencial
do banco para o HC já está na
casa dos R$ 7 milhões.
“A previsão é de que o pico da
crise seja atingido nos próxi-
mos dias”, disse o superinten-
dente do HC, Antônio José Ro-
drigues Pereira ontem. “Monta-
mos um comitê para fazer a ges-
tão das doações”, explicou. Ele
contou que a operação com o
BTG Pactual vai permitir o fun-
cionamento de mil plantões ex-
tras por mês, quase 12 mil horas
de serviço dos profissionais.
“O valor desse investimento
social do banco já chega a R$ 55
milhões, R$ 50 milhões do ban-
co, mais R$ 5 milhões que já cap-
tamos com parceiros”, disse o
CEO do BTG Pactual, Roberto
Sallouti. “Mas queremos que
mais clientes nossos liguem pa-
ra podermos ajudar mais gen-
te”, adiantou Sallouti, que coor-
dena o esforço de ajuda ao siste-
ma emergencial de combate à
covid-19. Segundo ele, as empre-
sas que já estão no projeto são
Alupar, Cosan, HDI Seguros,
Advent, Aegea e Perfin.
“Contratamos uma empresa
de mão de obra qualificada de
anestesistas, que podem atuar
com a gente porque foram can-
celadas as cirurgias eletivas nos
hospitais privados onde eles
atendem normalmente”, expli-
cou Sallouti. O projeto de ações
contra a expansão da covid-
prevê quatro pontos: doação de
materiais, ampliação de leitos
de hospital, apoio à população
carente e testagem em massa.
Com o auxílio dos anestesis-
tas que hoje atendem nos hospi-
tais Sírio-Libanês, Oswaldo
Cruz e Samaritano, o HC espera
colocar o serviço em funciona-
mento no hospital montado na
semana passada, quando o Insti-
tuto Central do HC foi prepara-
do para atender 900 pacientes.
Segundo o médico anestesis-
ta André Luís Ottoboni, diretor
da São Paulo Serviços Médicos,
a prestadora de serviços contra-
tada para atender à demanda ex-
tra hospitalar, 141 dos 250 pro-
fissionais do empresa estarão
divididos em 2.880 plantões
por três meses no HC. “Nossa
empresa tem 77 anos nesse ser-
viço e estamos no esforço con-
tra a pandemia.”
Tulio Kruse
Fernanda Boldrin
Apesar das recomendações
de isolamento social como
forma de reduzir a contami-
nação pelo novo coronavírus,
já é possível ver fluxo maior
de veículos e pedestres nas
ruas de São Paulo. A capital
paulista registrou aumento
da circulação de passageiros
no transporte público. On-
tem, as linhas de ônibus da ca-
pital tiveram 810 mil passa-
geiros a mais do que o regis-
trado há dez dias, em 27 de
março, quando a quarentena
ainda não havia completado
uma semana. Em relação aos
trens e ao Metrô, também
houve crescimento.
Diante da maior procura, a
Prefeitura aumentou a frota e
colocará, a partir de hoje, 424
ônibus a mais nas ruas. É a pri-
meira vez, desde que a circula-
ção de pessoas caiu, que a SP-
Trans voltará a empregar mais
da metade da frota. Até sexta,
havia aumento de 360 mil pes-
soas nos ônibus, em relação à
sexta anterior. Os veículos adi-
cionais serão distribuídos em
196 linhas, de todas as regiões. A
companhia disse, em nota, que
as linhas foram definidas “após
análise de oferta e demanda rea-
lizada pelos técnicos”, verifi-
cando índices de ocupação.
O aumento no número de pas-
sageiros também foi identifica-
do em outros tipos de transpor-
te, como metrô e trem, embora
a variação seja pequena. Segun-
do a Secretaria Estadual de
Transportes Metropolitanos
(STM), o Metrô operou ontem
com cerca de 20% da demanda
de passageiros.
Já a Companhia Paulista de
Trens Metropolitanos (CPTM)
teve 27% dos passageiros e as
linhas de ônibus intermunici-
pais tiveram 28%, ante perío-
dos de atividade normal, sem
restrições. Houve uma variação
de 1% a 2% no número de passa-
geiros em uma semana. Isso sig-
nifica que Metrô, CPTM e li-
nhas intermunicipais tiveram
um aumento de 83 mil a 166 mil
passageiros no período.
As companhias informam
que tomaram medidas para re-
duzir as chances de contágio do
coronavírus. “Os terminais de
ônibus com grande movimenta-
ção de pessoas contam com
marcações no chão para delimi-
tar o espaço das filas e evitar
aglomerações”, diz a SPTrans.
“A operação é monitorada a ca-
da hora, sobretudo em horários
de pico, e quando constatada a
necessidade de mais trens na li-
nha, eles são imediatamente in-
jetados para não ocorrer aglo-
merações”, informa a STM.
Preocupações. A quantidade
de pessoas que circulam na cida-
de está diretamente relaciona-
da com a probabilidade de no-
vos casos de coronavírus. Se-
gundo o governo estadual, o Es-
tado pode precisar de novos lei-
tos caso o número de pessoas
em isolamento se mantenha na
média atual. “Se nós conseguir-
mos aumentar o distanciamen-
to social, que estava em média
de 54%, para 70%, o número de
leitos disponíveis no Estado de
São Paulo será suficiente para
essa primeira onda epidêmica”,
explicou ontem o coordenador
do Centro de Contingência pa-
ra a Covid-19 no Estado de São
Paulo, David Uip.
Como mostrou ontem o Esta-
do , dados de geolocalização de
celulares também mostram
que mais pessoas passaram a cir-
cular em São Paulo na última
semana. De 23 de março a 2 de
abril, o isolamento na capital
foi de 66% dos paulistas a
52,4%, segundo a projeção feita
por um estudo do Instituto Bu-
tantã e da Universidade de Bra-
sília (UnB). O estudo mostra
que, desde o início da quarente-
na, o isolamento atingiu o nível
mais baixo na última sexta. Foi
a primeira vez que mais da meta-
de dos paulistas foram às ruas –
só 47% ficaram em casa.
Movimento. Ontem, por volta
das 18 horas, era possível ver
gente pelas ruas de bairros da
zona oeste, como Vila Romana
e Vila Madalena, e também do
centro. O fluxo mais intenso
era de carros, mas pelas ruas an-
davam também pessoas com sa-
colas de supermercado, gente
passeando com cachorro e pra-
ticando atividade física. As
maiores aglomerações estavam
nos pontos de ônibus, que che-
gavam a reunir até 13 pessoas.
Duas mulheres que aguarda-
vam um ônibus no terminal Vi-
la Madalena, afirmaram ter vol-
tado ao trabalho após 15 dias –
sua empregadora decidiu reto-
mar o trabalho. Elas, que pedi-
ram anonimato, são funcioná-
rias da recepção e da limpeza de
um consultório de psiquiatria,
e dizem que tiveram de assinar
um termo afirmando que irão
trabalhar dia sim, dia não, rece-
bendo metade do salário.
Na Avenida Doutor Arnaldo,
o florista Denilson Domingues,
que trabalha lá há 15 anos, não
tem aberto seu comércio, mas
também não deixou de ir ao lo-
cal. “Venho para dar uma geral
na banca, cuidar das flores. Por-
que senão, a perda seria total.”
Já o advogado Arthur Costa,
que pegava o metrô por volta
das 18 horas, não hesitou quan-
do questionado sobre o motivo
que o levava às ruas: “Porque eu
quero”. Ele diz que tem respeita-
do o isolamento social, mas ad-
mite que deu uma “escapadi-
nha” para cortar o cabelo. E
comprou uma latinha de cerve-
ja, que tomou andando pela rua.
PANDEMIA DO CORONAVÍRUS
l Exceção
l Atuação
l Denúncias
No DF, lojas abrem e banco tem fila de até três horas. Pág. A11}
ELLAN LUSTOSA/CÓDIGO
Há mais pessoas nas
ruas; governador permite
a prefeitos flexibilizar
isolamento em cidades
sem relato de covid-
28
municípios poderão reduzir as
regras de isolamento social.
Comércio poderá ser aberto, se
houver aval do Executivo local.
Rio também tem mais
movimento; Witzel
libera 28 municípios
Capital. Houve mudança de horário em comércio e indústria
“Contratamos empresa de
mão de obra qualificada de
anestesistas. As cirurgias
eletivas nos hospitais
privados foram canceladas”
Roberto Sallouti
CEO DO BTG PACTUAL
HC terá 140 anestesistas de reforço a partir de amanhã
Parceria com a iniciativa
privada vai garantir o
funcionamento do
esquema montado para
combater a covid-
ALEX SILVA/ESTADÃO
Apesar de restrição,
cresce movimento
em ônibus de SP
10.
Denúncias de desrespeito à qua-
rentena chegaram à Prefeitura
de São Paulo pelo serviço da Cen-
tral 156, de atendimento ao cida-
dão, entre o dia 20 e ontem. Se-
gundo o Município, 57 estabeleci-
mentos não essenciais já foram
interditados, a maioria na região
central.
Coletivos transportaram ontem 810 mil passageiros a mais do que
no dia 27; fluxo de veículos e pedestres tem aumentado nas ruas
Aperto. Ônibus lotado em São Paulo oferece risco de contaminação para os passageiros