buquê
flores
O buquê
de flores
exalava o perfume do triunfo. Contava mais de uma dezena,
como os anos em que já vivia na América. Cruzou um
oceano em busca de oportunidades, determinada a saber
mais sobre aquele ponto luminoso que se moveu no céu
num dia de infância. Era agora aplaudida. Finalmente aceita.
Quando nasceu, seu país curvava-se ao reinado de uma
mulher. Mesmo assim, exercer o poder feminino não era
algo estimulado naquelas terras. O diploma não foi entregue
ao fim do curso de graduação, ao contrário do que ocorria
com os colegas do sexo oposto. Não havia possibilidades
de trabalho para quem tinha a cabeça nas estrelas, como
desvelou no continente que a recebeu e a fez cidadã.
No vidro das grandes janelas da universidade via a imagem
da mulher de olhos brilhantes, segurando a constelação de
flores. Aquele lugar lhe permitiu a conquista de ser quem
quisesse. Estava orgulhosa.
Reconhecia a oportunidade de um projeto que lhe
incentivou a estar ali, junto de outras mulheres, fazendo
História. Era uma espécie de bolsa de estudos para moças
que aspiravam à Ciência. Queria ela também ser força
de impulsão, provocar os sonhos de meninas, falar dos
obstáculos e das viabilidades.
Abriu a porta da sua sala. O sol lançava raios sobre a pilha
de papéis na mesa. Tudo estava luminoso. Estudando os
astros, na instituição foi a primeira pessoa a obter o título
de doutora, que exibia emoldurado naquela parede. Sua
tese virou história entre os corredores, pois era inovadora,
contrariava a sabedoria da época e, por isso, foi abafada por
uma voz masculina. O professor que afirmou que seria tudo
um absurdo, comprovou anos depois a validade do trabalho
e, com sua publicação, levou o mérito da descoberta.
A mulher não se deixava nublar. Nem por isso, nem por
tudo mais. Havia sempre luz para comemorar, como o agora
que, com flores e aplausos, após vários anos de trabalho e
pesquisa, ainda que tardiamente, lhe legitimava a profissão.
Como o astro-rei, ela renascia todos os dias para iluminar.
Inspirado na história de Cecilia Payne-
Gaposchkin (Inglaterra, 1900 – Estados Unidos,
1979), astrônoma e astrofísica, primeira pessoa
a mostrar que o sol é composto primariamente
de hidrogênio, em 1925.
Inspiração 197