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B2 Economia SEGUNDA-FEIRA, 13 DE ABRIL DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO
Primeira Pessoa
E-MAIL: [email protected]R
eza uma antiga máxima, atri-
buída ao ex-ministro Delfim
Netto, que os números po-
dem confessar qualquer coisa, se fo-
rem diligentemente torturados. Ja-
mie White (em Crimes Against Logic ,
2004) vai na mesma linha e diz que a
estatística é o arsenal de armas quí-
micas da persuasão. Com a covid-
19, todavia, parece ser diferente.
Aqui, os números são melindrosos,
escorregadios, e não se deixam levar
facilmente pelos estratagemas de
seus algozes.
O total de infectados, por exem-
plo, é desconhecido. A estatística
que explode todos os dias sobre nos-
sas cabeças se refere ao número de
pessoas testadas que registraram re-
sultado positivo. Se na testa de cada
contaminado surgisse um triângulo
isósceles verde, tudo seria mais sim-
ples. A doença, no entanto, pode ser
assintomática ou ter sintomas le-
ves. Isso significa que o número real
de infectados deve ser um múltiplo
dos quase 2 milhões de pessoas que
constam das estatísticas hoje. Nem
sequer podemos supor que essa su-
bestimação é constante ao longo
tempo, já que, com o número cres-
cente de testes, este viés tende a di-
minuir. Se aplicarmos o número de
mortos ao total de casos testados e
confirmados, teremos uma taxa de
fatalidade de aproximadamente 5%.
É menos que o sarampo – mas para a
covid-19 não temos vacina.
Também é preciso considerar o
período de incubação da doença, ou
seja, as mortes de hoje não podem
ser comparadas com os infectados
de hoje, já que, como o número de
infectados cresce na frente, essa ta-
xa acaba sendo subestimada. Mais
ainda, se a comparação for feita com
o número total de contaminados,
muito maior que o número reporta-
do, a conclusão seria de que a morta-
lidade é muito mais baixa que 5%.
Este problema poderia ser resolvi-
do com testes amostrais amplos
que pudessem estimar o porcentual
contaminado de toda a população.
Mas aqui temos dois problemas:
não só não há testes em número sufi-
ciente, como os testes disponíveis
não são precisos e dão um grande
número de falsos negativos.Tudo isso para dizer que estamos
diante de um enigma de rara opaci-
dade. Os números não se deixam
capturar e, portanto, torturá-los é
de pouca valia. Primoroso estudo de
P. Surico e A. Galeotti ( The Econo-
mics of Pandemics: the case of Covid-
19 , 2020) constata que “estamos de-
finindo políticas baseados em evi-
dências muito incompletas”. Qual é
a saída? A saída é confiar na ciência.
Até a segunda metade do século 19 a
expectativa de vida do homem era
similar à de um chimpanzé. Foi o
primado da metodologia científica
sobre o obscurantismo que fez com
que a população mundial aumentas-
se de forma exponencial. Nos pri-
meiros 1.700 anos da era cristã, a po-
pulação mundial cresceu em 415 mi-
lhões de almas. Desde então, em 320
anos, o aumento foi de 7,2 bilhões de
pessoas. Como assinala D. Wooton
em obra seminal ( The Invention of
Science , 2015), uma pessoa formal-
mente educada que vivesse na Euro-
pa no início do século 17 acreditava
em astrologia, geração espontânea,unicórnios, bruxaria, na transforma-
ção de metal em ouro e no geocen-
trismo. Pouco mais de um século de-
pois, o mesmo europeu educado ti-
nha varrido essas bizarrices de seu
arsenal de conhecimento – o que
não significa que em 2020 não exis-
tam pessoas com ideias encravadas
no passado distante.
Questionar a ciência e o método
científico, como faz o inquilino do
Palácio da Alvorada, equivale a nos
condenar à idade das trevas. Os nú-
meros da covid-19 são impenetrá-
veis e confusos, mas confrontar o
consenso entre os especialistas a fa-
vor do isolamento social é cultivar o
mais lúgubre obscurantismo. O que
os números revelam voluntariamen-
te, sem serem torturados, é que igno-
rar a ciência é desprezar a vida.]
ECONOMISTA, FOI DIRETOR DE POLÍTICA
MONETÁRIA DO BANCO CENTRAL E PRO-
FESSOR DE ECONOMIA DA PUC-SP E DA
FGV-SP. E-MAIL: LUISEDUARDOAS-
[email protected]No caso da epidemia de
covid-19 que enfrentamos,
estamos diante de um
enigma de rara opacidadeA
Cocamar, sétima maior cooperativa agropecuária do Brasil, espera
elevar em 23% seu faturamento este ano, para R$ 5,7 bilhões, mesmo
com a crise gerada pelo coronavírus. A projeção se sustenta no bom
desempenho da safra de verão 2019/20, diz o vice-presidente, José Cícero
Aderaldo. Só de soja, o volume recebido pela cooperativa deve crescer de
850 mil toneladas em 2019 para 1,5 milhão de toneladas. Segundo ele, algu-
mas operações serão prejudicadas pela pandemia, “mas não as principais”.
É o caso da produção de fios de algodão, parada devido ao fechamento de
lojas e shoppings, e cujo resultado deve ser compensado pelo complexo so-
ja. “O preço da oleaginosa está mais alto do que o inicialmente orçado”, con-
ta. Além disso, a Cocamar inaugurou em fevereiro fábrica de ração no seu
complexo industrial em Maringá (PR), que deve atingir já em 2020 produ-
ção de 50 mil toneladas. Neste ano, o plano é construir três armazéns no
Vale do Paranapanema (SP) e uma indústria de biodiesel em Maringá. Pa-
ra tanto, porém, a oferta de crédito de longo prazo é imprescindível. “Só
vamos fazer se tivermos linha de crédito com prazo e juros adequados”,
afirma Aderaldo. A decisão será tomada até o fim deste mês.
Quando os números
torturam
»Mais restrito. Embora a principal
demanda seja por financiamentos
mais longos, a cooperativa notou aper-
to na oferta de capital de giro. Ela tem
limite aprovado em vários bancos,
mas há 15 dias não recebe oferta de
recurso novo. “Nosso caixa está bem,
mas o crédito, restrito”, diz. A Coca-
mar ainda paga à vista pelos grãos –
outras empresas ampliaram prazos.
Com o real desvalorizado, o preço da
soja ficou atrativo para o agricultor, e
75% da safra foi vendida, ante 50% na
média para o atual período.
»No lar. No segmento de alimentos
industrializados, que representam
cerca de 15% da receita da cooperati-
va, o consumo cresceu. “Com o isola-
mento social e as pessoas ficando em
casa, aumentou a demanda por pro-
dutos básicos, sobretudo óleo, bebi-
da, farinha, maionese”, destaca.
»Juntas. O braço brasileiro da fran-
cesa Vetoquinol, de medicamentos
veterinários, vai incorporar nesta
quarta-feira a marca e os direitos le-
gais da Clarion Biociências, de Goiás,
adquirida em 2019. Conforme Jorge
Espanha, presidente da empresa no
Brasil, o grupo fortalece a presença
aqui, onde tem duas fábricas: em São
Paulo e Goiânia.»No horizonte. A previsão da Veto-
quinol é crescer mais de 22% este
ano no País – em 2019 o avanço foi
de 11% –, mas o coronavírus pode
limitar essa alta para 14%, na avalia-
ção de Espanha. É que a crise provo-
cada pela doença elevou o custo de
produção por causa das limitações
logísticas para trazer os insumos da
China, cujos preços subiram de
25% a 30%.»Avante. O volume de soja, milho
e farelo exportado pelo Terminal
Integrador Portuário Luiz Antonio
Mesquita (Tiplam), operado pela
VLI no Porto de Santos, cresceu
26% em março ante igual período
de 2019. Em abril, o ritmo segue ace-
lerado, diz a empresa, que não infor-
ma a quantidade. Segundo Igor Fi-gueiredo, gerente-geral de Agricultu-
ra, o crescimento vem do ganho de
eficiência do Tiplam e da integração
entre terminais, ferrovia e porto.»Passo atrás. A União Nacional do
Etanol de Milho (Unem) já conside-
ra queda no esmagamento de milho
para produção de etanol em
2020/21. Com a quarentena para
conter a covid-19, o consumo de
combustíveis caiu e usinas reveem
planos, diz Guilherme Nolasco, pre-
sidente da Unem. A maioria conta
com altos estoques e, mesmo que a
demanda seja retomada no curto
prazo, o que deixou de ser consumi-
do não será recuperado, avalia.»Devolve. A Unem esperava proces-
sar, na safra 2020/21, 7 milhões de
toneladas de milho e produzir 2,
bilhões de litros de etanol. Na tem-
porada passada, foram 6 milhões de
toneladas do cereal. Nolasco diz
que, se os preços do grão continua-
rem altos, as empresas poderão “di-
minuir a produção e colocar milho
no mercado”. Na prática, elas já
vêm vendendo o cereal, segundo
corretores de diversos Estados.»Na frente. A ministra da Agricultu-
ra, Tereza Cristina, prometeu acelerar
a discussão do Plano Safra 2020/
para anunciá-lo o quanto antes, mas
técnicos da pasta dizem que as conver-
sas mal começaram. A equipe estava
às voltas com medidas para socorrer
produtores gaúchos prejudicados pela
estiagem e com normas para prorro-
gar dívidas de segmentos afetados pe-
la quarentena, como os de flores, fru-
tas, hortaliças e lácteos. “Não deve
adiantar muito em relação a 2019”, diz
uma fonte. O Plano Safra 2019/20 foi
lançado em junho do ano passado.»De olho. Além da Ásia e do Orien-
te Médio, a África é o novo foco do
Brasil na abertura de mercados. “Já
temos discussões com Nigéria e Áfri-
ca do Sul, especialmente para carne
de frango, material genético e maqui-
nário, além de parcerias de coopera-
ção agrícola”, diz Flávio Bettarello,
secretário adjunto de Comércio e
Relações Internacionais do Ministé-
rio da Agricultura.LETICIA PAKULSKI, CLARICE COUTO,
ISADORA DUARTE e JULLIANA MARTINSU
ma das maiores corretoras do
País, a XP tem planos de au-
mentar o seu time de funcio-
nários em meio à crise do coronaví-
rus. “Temos um projeto de longo pra-
zo que é transformar o mercado fi-
nanceiro para melhorar a vida das
pessoas. Há muitos planos que per-
passam a pandemia”, diz Guilherme
Sant’Anna, sócio responsável pela
área de Gente e Gestão da XP Inc..
Com um contingente de 2,5 mil traba-
lhadores, a companhia pretende nos
próximos meses chegar a 3,1 mil fun-
cionários, entre substituições e novas
vagas. Ao todos, são cerca de 600 no-
vas vagas para diversas áreas de negó-
cio. A XP foi uma das companhias
que se comprometeu a não demitir –
a corretora está revendo alguns proje-tos, mas manterá boa parte de expan-
são de seus negócios.lA XP foi uma das primeiras compa-
nhias do mercado financeiro a dizer que
não demitiria na crise e está anunciando
a contratação de pessoas. Para quê?
Quais são os planos de expansão?
É para um plano de expansão que já
tínhamos em curso. Temos muitos
projetos digitais e de novos negócios
que irão melhorar a experiência dos
nossos clientes.lQuais vagas estão abertas?
Temos vagas para todas as áreas denegócio. Desde suporte, atendimento
ao cliente, áreas de produto, tecnolo-
gia e dados. Nosso time tem cerca de
2,5 mil funcionários e podemos atin-
gir 3,1 mil nos próximos meses. Esta-
mos em busca de pessoas com espíri-
to empreendedor, mente aberta e so-
nho grande. Não paramos de contra-
tar durante essa crise.lComo serão feitas essas contratações,
uma vez que a XP está em home office?
Nós adaptamos nosso on boarding
que agora é feito 100% online. Faze-
mos entrevistas via ferramentas onli-
ne. Nas duas últimas semanas esta-
mos fazendo assim.lQual a média de salários para essas
novas vagas?
Os salários variam de R$ 5 mil a R$
20 mil, dependendo da vaga, com um
adicional de remuneração variável.lComo será a vida após a pandemia?
As videoconferências vão continuar sen-
do a principal ferramenta da XP?
A XP já fazia muita reunião com par-
ceiros via videoconferência. Nós con-
seguíamos ter esse engajamento an-
tes e vamos continuar depois tam-
bém. A empresa é muita rápida em
se adaptar aos novos desafios.
/MÔNICA SCARAMUZZOOpinião
l]
LUÍS EDUARDO
ASSISComplexo em Maringá. Com coronavírus, oferta de recursos diminuiu
l Em expansão2,
bilhões de litros de etanol de milho
é a produção das usinas instaladas
no Brasil, segundo a UnemCocamar espera crédito
para manter investimento
coluna do
‘Temos vagas em
aberto e estamos
contratando para
crescer’
ALESSANDRO COUTO -XPCOCAMARO Mapa da Bolsa
Suzano ONJBS ONRumo ONCarrefour BR ONKlabin Unit-12,52%2,61%-33,59%-10,98%8,29%● As ações que mais subiram e as que mais caíram
na semana passadaFONTE: BROADCAST INFOGRÁFICO/ESTADÃOOBS.: EMPRESAS QUE FAZEM PARTE DO ÍNDICE IBOVESPAMelhoresBR Distribuidora ONNotre Dame Intermédica ONCVC ONEcorodovias ONHapvida ONPioresNa semana Em 1 mês
0-6,72%5,56%12,22%-1,19%-18,33%40,22%39,63%30,81%29,70%29,43%-11,06%-6,86%-5,67%-5,57%-3,67%Guilherme Sant’Anna,
sócio responsável por RH da XP