MATIAS AIRES RAMOS DA SILVA DE EÇA
a defende; de sorte que a ciência não consiste em saber
conhecer, mas em saber responder e arguir; por isso
quem mais disse, é quem mais soube: as letras não se
costumam tomar pelo pêso, mas pelo volume; fazem-
se recomendáveis pela extensão; o ponto é que
cresçam na quantidade; a qualidade é matéria
indiferente: elas não avultam pelo que são, mas pelo
que soam; regulam-se pelo aparato, e não pela
sustância; estimam-se pelo que parecem, e não pelo
que valem; o que importa nelas, ter no exterior
brilhante falso, cujo resplendor furtado escandalize os
olhos de quem o quiser ver de perto; basta que a
atenção fique assombrada com o aspecto de uma
imagem nova, e ainda que na verdade não seja mais
que um fantasma; a superfície deve estar coberta de
uma claridade intensa e forte; o fundo seja embora
confusão, cegueira, caos. Só o que é preciso, é todo o
mesmo em si, e o mesmo em tôdas as suas dimensões:
o diamante não tem parte em que não seja diamante; a
roda que o pule, por mais que lhe multiplique as faces,
em tôdas o acha igualmente duro; não é mais sólido em
um lugar que em outro; a porção, que o engaste cobre,
não é inferior àquela que se mostra; a luz por tôda a
parte encontra nêle a mesma resistência, por isso
retrocede refletida, como em vibrações de várias côres.
Não são assim comumente as letras; o que há nelas de
agradável, é o que fica exposto à vista, e por isso
ornado de emblemas, de proporções, de correspon-
dências e figuras; o mais é um labirinto informe, rude e
indigesto; o metal brunido aplicado fora, não deixa ver
por dentro o pau sem lustro, nem valor.