matias

(Zelinux#) #1
REFLEXÕES SÔBRE A VAIDADE DOS HOMENS

a vastidão do mar. Aquela vaidosa infelicidade de que
se lamentavam, consistia em não haver mais mundos
que pudessem invadir, devastar, vencer; era desgraça
nêles o não poderem fazer mais desgraçados. Uma
conquista injusta sempre começa pela opressão dos
homens conquistados, e pelo destrôço de uma terra
alheia, por isso façanhas que só têm por princípio a
vaidade do valor, reputam-se grandes à proporção da
impiedade, com que o mesmo valor as executa; fazem-
se famosas pela mesma impiedade: daqui vem que nos
anais da História, a parte que se admira mais, e que
mais se imprime na lembrança, é aquela em que a
naração se compõe de sucessos mais cruéis; e em que
os campos, que foram de batalha, cobertos ainda hoje
de esqueletos informes, e partidos, conservam certo
horror; êsses campos fatais, em que se observam
espectros, debaixo da visão de umas luzes voláteis, e
em que se ouvem ainda hoje, entre o rouco som de
caixas, e trombetas, vozes mal articuladas, alaridos
confusos, e lamentos tristes; êsses campos, que depois
de muitos séculos, ainda trazem à memória repre-
sentações funestas, e em que as plantas, parece nas-
cerem com mêdo, e que o humor, que recebem da
terra, é sensitivo; êsses campos finalmente foram os
mesmos, em que a vaidade vencedora, arrancou os
louros para coroar as suas empresas. Que monstro
inspiraria a regra de medir-se a glória dos combates,
menos pela consequência dêles, que pelo estragos ;
menos pela utilidade, que pela ruína; menos pela
fortuna de uns, que desgraça de outros? Quanto
maiores são os ais, os gemidos, e os clamores, tanto
maior é a ação, e a vaidade de quem os move. Que
imaginação bárbara, e feroz, seria a que ideou no
vencimento o ser superior aquêle, de que resulta uma
desolação universal? O ser causa de que o

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