Introdução à História da Filosofia 2 Marilena Chauí

(Zelinux#) #1

nela, diferentemente do que aconteceu na Hélade, a aristocracia hereditária ja­
mais perdeu o poder político e econômico, encontrando meios para conservar-se
ampliando-se com os "homens novos" e os "amigos de Roma". Concedeu pode­
res à plebe, mas jamais perdeu a hegemonia política e o poderio econômico, ainda
que nem sempre as mesmas famílias estivessem na direção do Estado e das rique­
zas. Controlava a plebe por meio de uma instituição que existira na Grécia, mas
que, em Roma ganhara novo sentido, o evergetismo.
Com efeito, havia na Grécia, como mostram os historiadores Moses Finley e
Paul Veyne, uma instituição denominada liturgia, por intermédio da qual os mui­
to ricos eram levados a devolver parte de sua riqueza à cidade, construindo tem­
plos, teatros, monumentos, estátuas, patrocinando festivais e competições. No
caso de Roma, porém, o evergetismo, mesmo que inicialmente tivesse tido o mes­
mo sentido que a liturgia grega, logo ganhou nova significação, tornando-se o
meio para os patrícios conseguirem os favores da plebe em suas assembleias, ou
dos exércitos para que estes forçassem a aprovação de leis ou de nomes para o
senado, o consulado ou as magistraturas. Mais tarde, com Augusto, converteu-se
numa prática necessária aos imperadores seja como distribuição de terras e cargos
à nobreza, seja com o "pão e circo" para a plebe. A chamada liberalidade, converti­
da pelos pensadores romanos em virtude política e moral, era a prática do everge­
tismo tanto com recursos privados quanto com recursos públicos, garantindo a
hegemonia aristocrática.
Outra peculiaridade romana, que distingue Roma da Grécia, foi a capacidade
para estender a dominação imperialista integrando os conquistados em seu siste­
ma socioeconômico. Assim, ao conquistar a Itália, Roma não exigiu tributos, mas
soldados, honrando os conquistados por considerá-los aliados e deixá-los arma­
dos; ao conquistar toda a área do Meditarrâneo e do Atlântico, outorgou cidada­
nia romana aos conquistados, na qualidade de "amigos de Roma"; enfim, ao
conquistar a Ásia Menor, não destituiu os dirigentes locais, mas os integrou ao
sistema político e à burocracia romanos.7 Essa peculiaridade decorria do sistema
de ordens e estamentos que, como vimos, permitia juridicamente alargar um es­
tamento sem tocar na divisão fundamental entre patrícios e plebeus. Mas a causa
da peculiaridade romana encontrava-se em sua economia, isto é, num sistema
econômico fundado no grande latifúndio, obtido pelas guerras de conquista e
cultivado pelos pobres das regiões conquistadas, escravizados e dirigidos por uma
aristocracia urbana. O grande latifúndio escravista criou, de um lado, interminá-


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