Introdução à História da Filosofia 2 Marilena Chauí

(Zelinux#) #1

A ideologia romana


Na introdução à parte I, mencionamos a ideologia dos historiadores da filo­
sofia sobre a filosofia helenística e a interpretação de Hegel sobre sua conformida­
de ao mundo romano. Neste, escreve Hegel, tudo quanto havia de 'belo e nobre
na individualidade espiritual fo i brutalmente varrido" pelo espírito prático roma­
no, que estendeu sua regra abstrata ao mundo inteiro. Diante desse poder univer­
sal e abstrato, exterior e sem sentido concreto, o indivíduo não encontrava mais a
referência de sua nação, de sua pátria e de seu Estado, fo rçando-se a se recolher

numa individualidade interiorizada e a encontrar nela o refúgio da liberdade. À


regra universal e abstrata do césar romano, que governa o universo civilizado,
corresponde, filosoficamente, o elogio do sábio como indivíduo cuja vontade
domina o mundo exterior e a si mesmo e que por isso considera-se livre mesmo
sob grilhões.

o mundo romano é o mundo da abstração, no qual uma única regra fria estendeu-se
por todo o mundo civilizado. As individualidades dos espíritos nacionais vivos fo ram
sufocadas e mortas; um poder estrangeiro, como um universal abstrato, pressionou
pesadamente os indivíduos. Sob tais condições era preciso refugiar-se na liberdade
interior do sujeito enquanto tal. E como o que era levado em consideração era ape­
nas a vontade abstrata do governante individual do mundo, também o princípio in­
terior do pensamento tinha que ser uma abstração capaz de trazer apenas uma re­
conciliação fo rmal e subjetiva. Somente um dogmatismo erigido como princípio e
efetivado sob a fo rma do intelecto poderia satisfazer a mentalidade romana. Essas
filosofias são, pois, conformes ao espírito do mundo romano, visto que a filosofia em
geral sempre se encontra em estreita conexão com o mundo em seu aparecer ordi­
nário (Hegel, 1968, t. 11, p. 235).

As filosofias helenísticas, portanto, "estavam conformes ao espírito do mun­
do romano", que produziu um patriotismo fo rmal e um sistema do Direito, mas
fo i incapaz de produzir uma filosofia especulativa, oferecendo ao mundo apenas
bons moralistas e advogados.
Podemos, porém, indagar se esta é a visão que os romanos têm de si mes­
mos. E temos que responder negativamente. Para tanto, examinemos brevemen­
te a ideologia romana.9 Para sua construção, quatro grandes temas se articulam:


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